São Paulo, terça-feira, 21 de outubro de 2008

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Itália se mobiliza por escritor que a Camorra quer matar

Roberto Saviano publicou livro sobre a Máfia

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A MADRI

Aos 29 anos, Roberto Saviano se tornou uma espécie de Salman Rushdie italiano. Se o escritor indiano está ameaçado de morte por uma sentença religiosa, a ameaça a Saviano vem de poderes mais terrenais -e muito mais eficazes no cumprimento de suas determinações, a Camorra napolitana.
Tanto se teme a eficácia dessa ala regional da Máfia que o "La Repubblica" publicou ontem uma carta de apoio a Saviano, que, até o meio da tarde, já havia recebido 69 mil assinaturas, entre elas a de três prêmios Nobel de Literatura, o turco Orhan Pamuk, o alemão Günter Grass e o italiano Dario Fo. Assinaram ainda dois Nobel da Paz, Mikhail Gorbatchev, o homem que começou a desmontar o comunismo, e o sul-africano Desmond Tutu, figura crucial para o fim do "apartheid".
Assina igualmente Rita Levi Montalcini, italiana que ganhou o Nobel de Medicina.
O texto descreve sem exageros a situação do escritor: "Estão ameaçadas sua liberdade, sua autonomia de escritor, a possibilidade de encontrar-se com a família, de ter vida social, de tomar parte na vida pública, de mover-se em seu país".
Saviano é o autor de "Gomorra", livro-reportagem (transformado em obra de teatro e em filme, em exibição na 32ª Mostra Internacional de Cinema de SP), que conta o funcionamento do clã dos Casalesi, considerado o mais poderoso e também o mais violento da Campanha, no Sul italiano.
Desde a publicação, há dois anos, Saviano vive protegido as 24 horas do dia por uma equipe de cinco "carabinieri", a polícia italiana, pois Carmine Schiavone, parente próximo do chefe do clã Casalesi, Francesco Schiavone, contou aos policiais que os Casalesi acham que o "livro fez demasiado ruído" e, por isso, decidiu eliminá-lo.
Carmine deu até detalhes: antes do Natal, uma explosão mataria o escritor e seus guarda-costas na rodovia A-1, que liga Roma ao Sul. O crime organizado italiano já matou dois juizes em atentados parecidos, além de uma fieira de mortos em outros tipos de violência.
O texto no "La Repubblica" pede que o Estado "faça todos os esforços para protegê-lo", mas acrescenta que não se trata só de um problema policial. "É um problema da democracia. A liberdade em segurança de Saviano diz respeito a todos nós, como cidadãos", afirma. Termina dizendo que "é intolerável que tudo isso possa acontecer na Europa e em 2008".
A mobilização do jornal, do qual Saviano é articulista, se deve ao fato de que ele disse, em entrevista na semana passada, que estava pensando em abandonar a Itália. "Não vejo nenhuma razão para obstinar-me a viver desta maneira, como prisioneiro de mim mesmo, de meu livro e de meu êxito. Quero uma vida. Quero uma casa."


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