São Paulo, quarta-feira, 21 de outubro de 2009

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ANÁLISE

EUA colhem frutos de corrida às urnas

IGOR GIELOW
SECRETÁRIO DE REDAÇÃO DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O afã do governo Barack Obama em mostrar resultados naquela que chamou de "sua guerra" acabou por voltar-se contra os EUA. Foi Washington que pressionou pelo pleito, de olho no seu próprio calendário eleitoral: em 2010 haverá importantes eleições parlamentares, o primeiro teste nas urnas do desempenho pirotécnico do presidente.
Uma vez que colocou a região entre Afeganistão e Paquistão como sua prioridade estratégica e tem preconizado o diálogo político como condição primária para a resolução de conflitos, nada mais natural que Obama tentar unir ambas as pontas na eleição afegã.
A previsão constitucional era que a eleição deste ano ocorreria no máximo dois meses antes do fim do mandato de Hamid Karzai, em julho. A própria Comissão Eleitoral Independente, um órgão afegão coalhado de estrangeiros, já havia alertado que seria mais viável transferir o pleito para 2010. No ano que vem haverá eleições parlamentares no país, o que facilitaria a logística do trabalho, e haveria tempo para tentar melhorar as condições de segurança.
Mas os EUA bateram o pé, prevendo que a extensão artificial do mandato do aliado poderia ser lida em casa como um fracasso político. O resultado foi uma lambança. Karzai ganhou mais tempo na cadeira, permitindo estruturar uma rede de alianças que acabou por organizar a fraude maciça de agosto. E a imagem de um processo democrático tocado por um governo estável em Cabul foi exposta como ilusão que é.
O que acontece agora? O prazo para o pleito é curto, e há poucas evidências de que não irão ocorrer fraudes. Mas, se houver algum tipo de controle maior por parte dos observadores da ONU e considerando a deteriorada situação nas áreas pashtuns influenciadas pelo Taleban, Karzai pode enfrentar dificuldades. Pashtun, ele contaria com votos da etnia majoritária no país contra o tadjique Abdullah Abdullah.
O opositor pode ser favorecido nas áreas dominadas pela etnia à qual é associado (a rigor, ele é meio tadjique, meio pashtun, mas sempre esteve entre os primeiros), que estão menos conflagradas. Mas a rede de apoios de Karzai, que inclui uzbeques e vários senhores da guerra locais, torna isso imprevisível. E há o fator Taleban, que tende a repetir a onda de terror que afastou tantos eleitores no primeiro turno.
Os EUA, seus aliados e a ONU passaram atestado de incompetência e terão de lidar com um segundo turno caótico do ponto de vista logístico -poucos países não torciam para que Karzai liquidasse a fatura na primeira rodada. Mas o grande perdedor é o povo afegão, que será submetido a mais violência por conta dos desmandos de seus líderes e das conveniências políticas de estrangeiros.


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