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VENEZUELA
Chávez consegue evitar que megamarcha chegue ao palácio; motorista só pode comprar 30 litros de combustível
Oposição toma Caracas; gasolina é racionada
Estaben Felix/Associated Press
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Manifestantes da oposição fazem protesto pelas avenidas de Caracas, no qual pediram eleições |
CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A CARACAS
A oposição ao presidente Hugo
Chávez fez o que anunciou: "tomou" Caracas a partir do início da
tarde de ontem, em uma megamanifestação que partiu de cinco
pontos diferentes e foi até a praça
Venezuela, no centro da capital.
Mas o presidente Chávez também fez o que anunciara, na madrugada, a dois jornalistas brasileiros: não deixou que a marcha se
aproximasse do Palácio de Miraflores, a sede governamental.
"Não se pode permitir que uma
marcha, violando todas as leis, se
dirija ao Palácio de Miraflores
pregando a saída do presidente.
Nenhuma marcha, nessas condições, vai chegar a Miraflores",
afirmou o presidente.
Chávez já tinha, àquela altura, a
informação de que os oposicionistas haviam desistido de chegar
ao palácio, preferindo concentrar-se na praça Venezuela, "a vários quilômetros daqui".
Mas, acrescentou, "se algum
grupo exaltado, golpista ou fascista da oposição pretende seguir até
o palácio, não vai chegar".
Em tese, portanto, deu empate
no início de um período que o
próprio Chávez considera crítico
para superar a crise venezuelana
ou levá-la ao ponto de ebulição.
Empate reforçado pelo fato de
que houve também uma grande
marcha a favor do presidente, que
partiu de três pontos diferentes
para se concentrar em frente à sede principal da PDVSA (a estatal
petrolífera).
"Vete ya"
Mas, visualmente, ganhou a
oposição: Caracas vestiu-se de
vermelho-amarelo-azul, as cores
da bandeira, usadas como símbolo dos antichavistas, dançou ao
som da salsa típica caribenha, gritou "vete ya" (vá embora já). Ao
final, ainda ficou a ameaça de Antonio Ledezma, um dos integrantes da Coordenadora Democrática, a multifacetada coalizão oposicionista, de dirigir-se, sim, a Miraflores no futuro.
O fato de a marcha não ter chegado ao palácio e, portanto, ter sido evitado um confronto que poderia ser sangrento retira de cena
apenas um dos dois grandes fatores potenciais de agravamento da
crise. O outro, no entanto, continua do mesmo tamanho e é o
mais sério, na verdade: a greve,
iniciada no dia 2, e o boicote promovido pelos quadros gerenciais
da PDVSA, que mina o abastecimento de combustíveis, a ponto
de levar ao racionamento: o governo determinou ontem que cada veículo terá direito a apenas 30
litros de gasolina até que se supere
a escassez.
Ao anunciar a medida, o general
Jorge García Carneiro, chefe da
guarnição de Caracas, disse esperar a normalização em 72 horas.
É improvável que o general
acerte: embora a Justiça tenha determinado a volta ao trabalho do
pessoal da PDVSA, os funcionários resolveram desafiar a Justiça
e manter a greve, em assembléia
realizada ontem.
O líder grevista Juan Fernández,
ex-gerente de planejamento da
empresa, usou o curioso argumento de que "um tribunal não
pode obrigar uma pessoa a trabalhar se ela não quer. Independentemente de qualquer consideração de ordem trabalhista está a
defesa da democracia", afirmou.
Não ficou claro como se defende a democracia desobedecendo
uma decisão judicial.
Crise aguda
A greve petrolífera é justamente
o principal temor de César Gaviria, o secretário-geral da OEA
(Organização dos Estados Americanos), que funciona como "facilitador" de um até agora infrutífero diálogo oposição-governo.
Gaviria trabalha com a hipótese
de que a greve petrolífera levará a
uma crise aguda de abastecimento, do que derivariam saques ao
comércio e confrontos.
A hipótese de que surjam mais
adiante os confrontos ontem evitados está na cabeça também de
Willian Lara, presidente da Assembléia Nacional (o Congresso
unicameral), conforme expôs ontem a Marco Aurélio Garcia, o enviado especial do presidente eleito
do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva. Dos dois lados, há grupos ultra-radicais e fora de controle que
podem incendiar o país, avalia o
deputado governista.
Tem razão: do lado oposicionista, a colunista do jornal "El Nacional", Ibéyse Pacheco, informou
ontem sobre manifesto de um
certo Comando 6 de Dezembro,
que considera "alvos militares"
oito funcionários do governo, entre eles o ministro do Interior,
Diosdado Cabello, e o irmão de
Chávez, Adán Chávez.
Parece próximo de uma sentença de morte.
Do lado chavista, grupos de blusões negros e rosto coberto picharam nos muros do canal de TV
RCTV a frase: "Se derrubarem
Chávez, queimaremos os canais".
E assinaram Tupamaros, nome
de grupo guerrilheiro uruguaio.
O impasse, o risco de violência,
a perspectiva de que, pela força,
nem um lado nem o outro conseguirá eliminar o adversário, parecem, no entanto, estar conduzindo a um cansaço de parte a parte.
Cansaço refletido em colunas de
opinião de antichavistas, como a
do advogado Eduardo Arroyo Talavera, que escreve para o "El Nacional": "Não me sinto à vontade
em uma greve recheada do design
e dos símbolos dos que podem
pegar o avião e se mandar para
Miami".
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