São Paulo, quarta-feira, 21 de dezembro de 2005

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AMÉRICA DO SUL

Ajuda dos EUA para combate ao tráfico na Bolívia diminui; analistas vêem influência da vitória de Morales

Cresce fluxo de droga boliviana ao Brasil

DO ENVIADO ESPECIAL A LA PAZ

Relatório divulgado na semana passada pela agência antidrogas boliviana revela que o Brasil -e não os EUA- é, cada vez mais, o principal destino e corredor de entorpecentes bolivianos, com tendência de aumento para o ano que vem.
O balanço das apreensões realizadas de 1º de janeiro a 17 de dezembro deste ano mostra que elas já aumentaram 476% com relação ao ano de 2004 no departamento de Santa Cruz, principal corredor para o Brasil, contra 24% em toda a Bolívia no mesmo período. Esse departamento foi aquele em que mais se apreenderam drogas neste ano. Cerca de 90% desse total tinha o Brasil como destino, segundo a Felcn (Força Especial de Luta contra o Narcotráfico), cujo orçamento é composto em 98% por ajuda financeira americana, reduzida de atuais US$ 100 milhões para US$ 92 milhões em 2006.
A maior parte desse salto se deve a apreensões de maconha (1.295%), seguidas pela pasta de coca, que subiu de 2,3 toneladas para 3,7 toneladas - aumento de 60%. Já o cloridrato, a cocaína mais pura, manteve-se praticamente estável.
Nos outros dois departamentos fronteiriços, as apreensões de pasta de coca duplicaram em Beni (de 102 kg para 208 kg) e triplicaram em Pando (de 66 kg para 181 kg). No departamento de Beni, o maior aumento ocorreu na apreensão de cloridrato de cocaína, pulando de apenas 3,8 kg, em 2004, para 338 kg neste ano. Esse departamento é usado principalmente como corredor da produção peruana em direção ao Brasil. Por outro lado, a apreensão de maconha caiu de 10,3 toneladas para apenas 6 kg em 2005.

Problema brasileiro
Procurada pela Folha, a Embaixada dos EUA na Bolívia afirmou concordar com a avaliação da Felcn de que o Brasil é o principal mercado da droga e também a rota preferida para chegar aos mercados europeus. "A cocaína boliviana praticamente deixou de chegar aos EUA", afirmou um funcionário da embaixada.
O governo americano diz que a redução da ajuda à Bolívia se deve estritamente a cortes no Orçamento, mas muitos analistas viram o corte sob a perspectiva da vitória do líder cocaleiro Evo Morales nas eleições presidenciais.
Em entrevista à Folha no domingo, em La Paz, o assessor internacional da Presidência do Brasil, Marco Aurélio Garcia, discordou da avaliação de que a cocaína boliviana é um problema mais brasileiro que americano. "A política dos EUA em relação à droga não é só ligada ao mercado americano. Além disso, nada indica que a cocaína daqui que vai para o Brasil não seja para o país ou outros mercados, que funcionam de forma articulada. Portanto, o interesse dos EUA é global."
Garcia, que concedeu a entrevista horas antes da vitória de Morales, disse que o Brasil não está preocupado com um governo liderado por ele em relação à cocaína: "Está claro que a posição do Evo é de um combate firme à produção de cocaína".
A avaliação de Garcia difere da da Polícia Federal, que anteontem previu um aumento das plantações e, assim, da produção de pasta de coca no governo Morales. (FABIANO MAISONNAVE)


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