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NO TOPO DO MUNDO
Certa vez, Gyanendra viajou porque Marte estava muito perto da Terra
Monarca é escravo da astrologia
BRUNO PHILIP
DO "LE MONDE", EM KATMANDU
Sua Majestade Gyanendra Bir
Bikram Shah Dev pode ter tomado gosto pelas funções reais desde uma tenra idade. Isso porque
o soberano foi rei duas vezes. Em
6 de novembro de 1950, quando
tinha três anos, ele foi colocado
sobre o trono pelo último primeiro-ministro dos aristocratas
Ranas, que durante mais de um
século haviam usurpado o poder
das mãos da família real.
Gyanendra não era o príncipe
herdeiro, mas foi coroado porque seu irmão, Birendra, seu pai,
Mahendra, e seu avô, Tribhuvan,
estavam na Índia, procurando o
apoio de Nova Déli para reinstaurar a família Shah no trono.
Isso foi feito em fevereiro de
1951, quando Tribhuvan foi recoroado no palácio de Katmandu, de modo que Gyanendra
"reinou" por três meses.
Uma outra virada da história
lhe permitiria reascender ao trono 51 anos mais tarde. No dia 1º
de junho de 2001, num gesto provocado pela recusa da rainha em
deixá-lo casar-se com a mulher
que amava, o jovem príncipe
herdeiro Dipendra matou o rei, a
rainha, um irmão e duas irmãs e
quatro outros parentes. Tresloucado, em seguida suicidou-se.
Gyanendra, o irmão mais jovem de Birendra e único sobrevivente do massacre que pertencia
à linhagem real, se tornou rei.
Era sabido que Gyanendra não
aprovava a posição "branda" de
seu irmão com relação à guerrilha maoísta. Ele optou por enviar
seu Exército para atacar um dos
redutos da insurreição. Em pouco tempo, Gyanendra mergulhou no autoritarismo e isolou-se da população nepalesa.
Em 2002, dissolveu o Parlamento e indicou primeiros-ministros saídos dos partidos democráticos. Em fevereiro de
2005, assumiu plenos poderes,
passando por cima da Constituição, que prevê a monarquia
constitucional.
Apesar disso, é possível que
Gyanendra, que já foi empresário, não tivesse ambições reais.
Para muitos nepaleses, porém,
não há dúvida em relação ao que
aconteceu: foi Gyanendra quem
teria fomentado o massacre de
seu irmão, para assumir seu lugar. O soberano é obcecado pela
astrologia, as ciências ocultas e o
tantra hindu.
Recentemente viajou à África
do Sul e Tanzânia porque seus
astrólogos o aconselharam a não
permanecer no Nepal quando o
planeta Marte estivesse muito
perto da Terra. Há rumores de
que ele ouve os conselhos de um
místico de inspiração sufi, residente em Gauhati, no Estado indiano de Assam.
Apesar de supostamente ser
reencarnação de Vishnu, o soberano desacreditado já deixou de
ser reverenciado como "rei-deus". Após a eliminação da família real, todo o sistema monárquico baseado nas leis celestes
passou a ser questionado.
Tradução de Clara Allain
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