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Iraque atrai terror, dizem analistas
MÁRCIO SENNE DE MORAES
DA REDAÇÃO
O terrorismo é a "maior ameaça" aos esforços americanos de
reconstrução do Iraque, de acordo com o general John Abizaid,
chefe do Comando Central dos
EUA. Ele disse que membros do
grupo terrorista Ansar al Islam, ligado à Al Qaeda, são ativos na região de Bagdá e que "extremistas
estrangeiros" também participam
da resistência armada iraquiana.
Como o Afeganistão se tornou
um ímã para extremistas islâmicos na década de 80, que lutavam
para expulsar os invasores soviéticos, o Iraque vem atraindo, nos
últimos dois meses, um número
considerável de jovens muçulmanos dispostos a perder a vida para
combater os "infiéis", segundo especialistas ouvidos pela Folha.
"O Iraque transformou-se em
um ímã para os radicais que querem resistir aos valores ocidentais
a qualquer custo e o ponto de convergência das teorias extremistas
que preconizam um confronto
entre o islã e a democracia", avaliou Davis Bobrow, do Centro
Ridgway para Estudos sobre Segurança Internacional (EUA).
"Existindo esse sentimento generalizado contrário ao Ocidente
em uma parte significativa da
oposição armada iraquiana, um
ataque como o que devastou a sede da ONU em Bagdá passa a ser
legítimo, visto que a ela apóia os
esforços liderados pelos EUA. Todavia também há iraquianos que,
simplesmente, são contrários à
ocupação e simpatizantes de Saddam Hussein que fazem parte da
resistência", acrescentou.
Os fatos corroboram a preocupação de Abizaid. Há duas semanas, um grupo de combatentes do
Ansar al Islam foi detido na região
curda do Iraque, perto do Irã. Entre eles havia cinco iraquianos,
um palestino e um tunisiano. Segundo Dana Ahmed Majid, chefe
de segurança da região, eles tinham cinco passaportes italianos
entre seus pertences, que deveriam ser entregues a extremistas
que já estavam no Iraque.
"O Ansar al Islam sempre tirou
vantagem das péssimas relações
entre o Irã e o Iraque, recebendo
ajuda dos radicais iranianos, como o aiatolá Ali Khamenei [líder
supremo do país]. Eles não querem que uma dinâmica positiva
se instale no Iraque, pois ela poderia atravessar a fronteira e ameaçar seu controle sobre a população iraniana", analisou Antoine
Basbous, diretor do Observatório
dos Países Árabes (França).
"Contudo há radicais islâmicos
de outros países que também
atuam no Iraque. Há sauditas, iemenitas, sírios etc. Para os jordanianos, a situação é mais complexa, já que seu governo é mais estrito no controle das fronteiras."
Antes da Guerra do Iraque, o
Ansar al Islam contava, de acordo
com especialistas, com cerca de
850 membros. Por volta de 200 foram mortos em combates com os
EUA, cerca de 300 foram presos, e
o restante fugiu para o Irã. Crê-se
que mais de 150 já tenham voltado
ao Iraque pela fronteira iraniana.
Outro aspecto que preocupa a
coalizão anglo-americana é o fato
de a resistência armada iraquiana
combinar radicais islâmicos com
terroristas. "Eles se misturam
com a população", disse Bobrow.
Para Christophe Jaffrelot, diretor do Centro de Estudos e de Pesquisas Internacionais (França), isso reflete o que ocorre no norte do
Paquistão em maior escala. "Nas
Províncias paquistanesas da
Fronteira Noroeste e do Baluquistão, as mesmas pessoas que frequentam as madrassas [escolas
religiosas muçulmanas] são bombardeadas com idéias anti-Ocidente nas ruas e têm contato com
terroristas ligados à Al Qaeda. Ficou difícil separar as coisas."
Contudo a veleidade dos radicais islâmicos de transformar o
Iraque no Afeganistão dos anos
80 encontrará um obstáculo vital:
a inexistência da confrontação bipolar da Guerra Fria. "Havia duas
grandes potências, sendo que
uma [os EUA] estava alinhada aos
mujahidin para combater a outra
[a URSS]", indicou Basbous.
De fato, durante a Guerra do
Afeganistão (1979-1989), os EUA
chegaram a dar bilhões de dólares
aos muçulmanos que enfrentavam os soviéticos. Desta vez, os
extremistas terão muito mais dificuldade em obter fundos.
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