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COMENTÁRIO
Pyongyang mostra suas cartas
JAIME SPITZCOVSKY
FREE-LANCE PARA A FOLHA
A Coréia do Norte, um dos
regimes diplomaticamente
mais isolados do planeta, celebrizou nos anos 90 um roteiro de negociações nas poucas vezes em
que entabulou diálogo com países
como EUA, Japão ou Coréia do
Sul. Às vésperas das conversações,
costumava promover demonstrações de força, como teste de mísseis ou aventuras navais, na esperança de se vender como uma
"ameaça real" e arrancar maiores
concessões, geralmente econômicas.
Ao revelar a enviados de Washington seu projeto secreto nuclear, a Coréia do Norte estaria repetindo o surrado plano de vôo:
apresentar-se como detentor de
significativo poder militar e oferecer recuos na área atômica como
moeda de troca em uma negociação com Washington. Segundo
editorial do jornal sul-coreano
"The Korea Herald", o regime
norte-coreano busca, além de ajuda econômica, garantias em relação à sobrevivência do regime, último reduto do stalinismo.
Kim Jong-il, o ditador norte-coreano, se assustou ao ver seu país
incluído, ao lado de Iraque e Irã,
no "eixo do mal", formulação criada em janeiro pelo presidente
George W. Bush para descrever os
regimes acusados pela Casa Branca de apoiar terroristas ou de desenvolver armas de destruição em
massa. Kim avaliou que, depois de
uma eventual queda de Saddam
Hussein, Washington poderia voltar suas baterias para pressionar
por uma mudança de regime na
Coréia do Norte.
Nos últimos meses, Kim Jong-il
iniciou ofensiva por uma aproximação com países vizinhos e que
possam auxiliá-lo a conter a mão
pesada de Washington. China, Japão e Coréia do Sul temem efeitos
colaterais, principalmente em
suas economias, se os tentáculos
da guerra antiterror norte-americana se voltarem com intensidade
para o nordeste asiático.
Há pouco mais de um mês, o
premiê japonês, Junichiro Koizumi, protagonizou uma visita histórica a Pyongyang, capital norte-coreana. A Coréia do Sul também
reagiu com otimismo aos sinais de
fumaça produzidos pelo regime
comunista, o que levou ao anúncio da retomada de diálogo.
O ditador Kim Jong-il, em seu
flerte com a abertura, chegou a
anunciar o plano de criação de um
encrave capitalista no museu do
stalinismo que é a Coréia do Norte. O território, próximo à fronteira com a China, tentaria espelhar a
experiência de Hong Kong, dínamo de capitalismo no sul da Ásia, e
seria o primeiro passo importante
norte-coreano para repetir a alquimia do vizinho chinês: Partido
Comunista no poder implementando reformas capitalistas.
Mas, ainda apegada aos dogmas
comunistas e ao isolamento (apenas dois meios de comunicação
estrangeiros têm presença permanente no país: as agências de notícias russa Itar-Tass e a chinesa Xinhua), a Coréia do Norte caminha
lentamente na hora de adotar de
mudanças na economia e assim
ceder às pressões de seu principal
parceiro diplomático, a China, que
teme o colapso de um regime
montado sobre um país em aguda
crise econômica. Segundo a ONU,
um terço da população norte-coreana se alimenta graças a ajuda
internacional.
Pressionada pela crise econômica que se agrava desde 1995 e pela
ação norte-americana na guerra
antiterror, a Coréia do Norte ensaia sair do isolamento e parece
disposta a repetir a tática usada em
outros momentos de negociação:
agita o seu poderio militar na tentativa de arrancar concessões, agora dos EUA. Essa tática, no entanto, nem sempre obtém sucesso.
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