São Paulo, segunda-feira, 22 de novembro de 2004

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MISSÃO NO CARIBE

Após um mês no país, Seitenfus vê "aceitação tácita" do Brasil

Haiti votará em 2005, diz enviado

FABIANO MAISONNAVE
DA REDAÇÃO

As últimas semanas foram intensas para Ricardo Seitenfus, o enviado ao Haiti pelo governo brasileiro para desempenhar a delicada condição de mediador político. Depois de mais de 120 reuniões, de uma visita à devastada Gonaives, de escapar de um tiroteio e de perder cinco quilos, concluiu: "Um dos grandes problemas do Haiti é saber por onde começar, tamanho o descalabro".
Especialista em relações internacionais da Universidade Federal de Santa Maria, Seitenfus chegou no final de outubro a Porto Príncipe, em meio a um violento levante supostamente promovido por partidários do ex-presidente Jean-Bertrand Aristide e logo depois da passagem do furacão Jeanne, que matou mais de 3.000 pessoas na região de Gonaives.
Seitenfus deixou o Haiti na última sexta-feira, após entregar, junto com outros consultores, um relatório contendo várias recomendações à missão da ONU.
O documento propõe, entre outros pontos, que seja assinado por todas as facções políticas um "pacto de garantias democráticas" para a realização das eleições gerais, no final do ano que vem, época em que as tropas de paz da ONU, comandadas pelo Brasil, devem deixar o país.
"É certo que as eleições ocorrerão. O que está acontecendo é uma pequena agitação de partidos políticos que sabem que vão perder. Mas 95% dos haitianos querem a eleição", disse à Folha.
O brasileiro defende que o resultado eleitoral tenha o aval do Conselho de Segurança. "Em contrapartida, quem ganhar terá de respeitar os direitos da oposição, algo que nunca ocorreu no Haiti."
Até as eleições, porém, a presença internacional terá de ser visível também fora da área de segurança. Seitenfus repete a crítica sobre o atraso na liberação dos mais de US$ 1 bilhão de ajuda internacional. "Precisamos de mecanismos urgentes para melhorar os dados sociais. É um desafio contra a burocracia e a insensatez."
Mesmo com as eleições, o envolvimento internacional ainda está longe do fim, prevê Seitenfus. Ele acredita que o Haiti ainda precise de 10 a 15 anos de ajuda. "É trabalho para uma geração."
Observador da última missão da ONU no Haiti, em 1994, o professor universitário é otimista com relação ao papel do Brasil.
"Pela primeira vez na história haitiana, há uma aceitação tácita da presença estrangeira. O Brasil veicula uma empatia extraordinária. Somos países parecidos, unidos pelos laços africanos. Já nas vezes anteriores, tentaram fazer do Haiti um protetorado", disse, em alusão aos Estados Unidos.
Sobre o tiroteio que resultou em duas mortes e o deixou encurralado por cerca de 30 minutos dentro de uma agência bancária, disse: "A grande questão é: trata-se de bandidos atrás de dinheiro comum ou de atos de natureza política? Essa pergunta não tem resposta, ao menos hoje".


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