São Paulo, domingo, 22 de novembro de 2009

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Peru cobra do Chile punição para espiões

Chanceler peruano afirma à Folha que ações de militar do país em favor do vizinho estão comprovadas e revela detalhes do caso

Ministro estima em US$ 2,5 bilhões as compras de armas por Santiago nos últimos quatro anos e diz que isso incita corrida armamentista

Martin Mejia/Associated Press
O presidente do Peru, Alan García (à dir.), e seu ministro de Relações Exteriores, José García Belaúnde, em solenidade em Lima

THIAGO GUIMARÃES
DA REPORTAGEM LOCAL

O caldeirão de divergências históricas entre Peru e Chile ganhou um ingrediente de alta voltagem na última semana, com a revelação de um suposto caso de espionagem de um militar peruano em favor do Chile.
Exposto em detalhes após a confissão do técnico de inteligência da FAP (Força Aérea Peruana) Víctor Mendoza, o episódio elevou a tensão entre os países e turvou a relação marcada hoje por uma disputa marítima internacional e pelo incômodo peruano diante dos gastos militares do Chile.
Em entrevista à Folha, o ministro das Relações Exteriores do Peru, José Antonio García Belaúnde, diz que a espionagem foi comprovada e que o Chile deve punir os responsáveis. Para ele, as compras militares chilenas incitam uma "corrida armamentista" na região, na contramão da proposta peruana de um compromisso de redução de gastos.

 

FOLHA - O que foi comprovado até agora na investigação?
JOSÉ GARCÍA BELAÚNDE -
Este senhor [Víctor Mendoza] foi cooptado no final de 2004. Em uma espécie de contrato não escrito, recebia uma soma mensal fixa de US$ 3.100, e o compromisso era enviar informação que eles requeriam. Fez várias viagens para se encontrar em Montevidéu com seus contatos e enviou material secreto por e-mail criptografado.

FOLHA - Mas está claro quem eram os compradores? O Chile negou que os dois nomes citados por Mendoza sejam de militares ou de chilenos.
BELAÚNDE -
Se os nomes são verdadeiros ou falsos, não posso saber. Definitivamente podem ter sido nomes falsos. Há registros de dinheiro enviado, temos IPs de dois computadores em Santiago que remeteram pedidos e aos quais se remeteu informação. Estão claras as viagens que ele fez a Montevidéu e há a confissão, isso tudo coincide. Que não coincidam os nomes não nos surpreende. Era uma hipótese com a qual já trabalhávamos.

FOLHA - O que o Peru espera agora do governo chileno?
BELAÚNDE -
Que façam uma investigação profunda a partir da informação que fornecemos. Que estabeleçam as autorias e punam os responsáveis.

FOLHA - Como avalia a hipótese de que a espionagem tenha sido promovida por setores interessados em promover a venda de armas?
BELAÚNDE -
É difícil imaginar que tudo isso seja montagem de gente que queira vender armas. Foram cinco anos [de espionagem], e o caso foi descoberto pelos próprios serviços peruanos. [Talvez] se houvesse um processo muito curto e rápido [de compra de armas], mas isso [espionagem] é muito antigo, parece muito estabelecido.

FOLHA - Críticos classificaram a reação do presidente Alan García como desproporcional, em tentativa de obter ganho político.
BELAÚNDE -
O tema é da mais alta sensibilidade, mais ainda quando vem de um país que gastou o que gastou nos últimos anos. O tema armamentista chileno já causava muitas suspeitas e temores no Peru. A reação do presidente é a reação de um país muito sensibilizado e que sente que sua soberania foi vulnerada. E o presidente García não está em nenhum processo eleitoral no curto prazo, as próximas eleições são municipais e regionais, em novembro de 2010.

FOLHA - Como o Peru avalia a política de defesa do Chile?
BELAÚNDE -
O Chile gastou e está gastando um dinheiro que, em proporção a seu PIB, é um dos mais altos da região. Acredito que o Chile deva ter gasto nos últimos quatro anos uns US$ 2,5 bilhões em novas armas. Isso cria uma desconfiança e um clima que incitam a uma corrida armamentista.


Colaborou FLÁVIA MARREIRO, da Redação

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