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SOB NOVA DIREÇÃO / HERANÇA MALDITA
Obama desmantela rede de exceção de Bush
Novo presidente ordena fechamento de Guantánamo e determina fim de prisões secretas da CIA e do uso da tortura
Medidas deixam em aberto destino dos presos em base militar em Cuba; assessores dão a entender permissão para tortura caso a caso
Matthew Cavanaugh/Efe
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Cercado de oficiais militares da reserva e ao lado do vice-presidente Joe Biden, Obama assina ordens executivas com dose de simbolismo; fechamento da prisão em Guantánamo demora um ano
SÉRGIO DÁVILA
DE WASHINGTON
Dando continuidade a sua
política de reverter as medidas
de exceção da era Bush, o presidente Barack Obama confirmou o fechamento da prisão da
base naval de Guantánamo, em
Cuba, e assinou outras duas ordens que na prática proíbem a
tortura em interrogatórios de
suspeitos de terrorismo e eliminam as prisões secretas
mantidas pela CIA, a agência de
inteligência dos EUA.
Em seu terceiro dia no cargo,
o novo ocupante da Casa Branca assinou três ordens executivas e expediu um memorando
que, ao menos no papel, desmantelam a rede montada por
seu antecessor, George W.
Bush, no tratamento de suspeitos e prisioneiros do que chamou de "guerra ao terror". O de
maior efeito dá um ano para fechamento do centro criado
após o 11 de Setembro.
Fica cancelado também o
programa da CIA de manter
suspeitos de terrorismo presos
por meses ou anos em locações
secretas espalhadas pelo mundo e a prática de "métodos
coercitivos de interrogatório",
um eufemismo bushista para
ações de tortura como o afogamento simulado.
A começar de ontem, a agência de inteligência terá de seguir as 19 regras de interrogatório constantes do Manual de
Campo do Exército, que por
sua vez seguem as leis internacionais. Os três programas
eram o pôster a alimentar o
sentimento antiamericano no
mundo durante os oito anos do
mandato de Bush e seu vice-presidente, Dick Cheney.
Luta contra terror
"Eu posso dizer sem hesitação ou equívoco que os Estados
Unidos não vão torturar", afirmou Obama numa cerimônia
no Departamento de Estado,
ontem à tarde. A frase "Os EUA
não torturam" era o mantra de
Bush e seus assessores nos últimos meses. A mudança do tempo verbal pelo sucessor democrata não foi acidental.
"Os EUA pretendem continuar a atual luta contra a violência e o terrorismo", havia dito o presidente antes. "E vamos
fazer isso de maneira vigilante,
efetiva e coerente com nossos
valores e ideais. Pretendemos
vencer essa luta, mas vamos
vencer em nossos termos."
Se as ações de ontem têm um
efeito positivo inegável na opinião pública mundial, criam vários problemas domésticos para seu autor. O primeiro é o que
fazer com os 245 detentos hoje
sob guarda de Guantánamo,
entre eles cinco acusados de
planejar o ataque do 11 de Setembro. Em sua ordem, Obama
determina que, se em um ano
eles não tiverem saído de
Guantánamo, serão soltos.
Muitos estão lá há anos sem
ter sido acusados formalmente.
Outros já tiveram a soltura autorizada, mas não podem voltar
a seus países de origem, onde
correm risco de morte -21 passam por julgamento, por comitês de exceção.
Mesmo os que estão sendo
julgados nessa instância podem ter seus casos anulados, se
for comprovado que evidências
contra eles foram obtidas de
forma ilegal -como resultado
de tortura, por exemplo. Na ordem, Obama exige que todos os
processos sejam revisados.
"24 Horas"
O outro problema é que, ao
desmontar o arcabouço de exceção de Bush, Obama abre
mão do que defensores das práticas classificam de instrumentos valiosos na luta contra o terrorismo. Escrevendo no "Washington Post" de ontem, Marc
Thiessen, autor de discursos de
Bush, advertiu: "O que ele vai
fazer quando o próximo líder
sênior da Al Qaeda for capturado e se recusar a falar?"
"Vai permitir que a CIA use
as técnicas reforçadas de interrogatório?", pergunta-se. "Se se
recusar e o país for atacado,
Obama vai ser responsabilizado." É a chamada "cláusula 24
horas", uma referência ao seriado de TV homônimo, segundo a qual, se um ataque terrorista iminente puder ser evitado por confissão de suspeito via
tortura, essa deve ser usada.
Especialistas civis e militares
que aconselharam Obama durante a campanha, no entanto,
alertaram para a histórica falta
de qualidade da informação obtida sob coerção. Além disso,
assessores obamistas ontem
deram a entender que, se tal situação acontecer -na captura
de Osama bin Laden, por exemplo-, o presidente pode assinar
ordem executiva que permita o
uso de "técnicas de exceção"
caso a caso.
O senador republicano John
McCain soltou declaração
apoiando a medida. "Nós apoiamos a decisão do presidente
Obama de fechar a prisão de
Guantánamo e reafirmar a adesão dos EUA às Convenções de
Genebra", afirmou. Rival de
Obama na disputa presidencial
de 2008, McCain foi preso e
torturado nos anos 60, quando
o avião da Marinha que pilotava caiu no Vietnã.
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