São Paulo, sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

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SOB NOVA DIREÇÃO / O NÓ DO ORIENTE MÉDIO

Questão palestina impõe escolhas difíceis

Governo Obama terá que decidir se apoia governo de união nacional ou se mantém política de isolamento total do Hamas

Divisão da liderança dos palestinos é empecilho para negociações com Israel e dificulta iniciativas para ajudar reconstrução de Gaza

STEVEN ERLANGER
DO "NEW YORK TIMES", EM JERUSALÉM

Com o domínio do Hamas em Gaza aparentemente incontestado, e sua popularidade crescendo na Cisjordânia, o governo Obama terá que fazer uma escolha: apoiar um governo palestino de união, como querem o Egito e o presidente da Autoridade Nacional Palestina (ANP), Mahmoud Abbas, ou continuar a isolar o Hamas e a concentrar-se em reforçar a Cisjordânia como alternativa política ao islã radical.
A questão é urgente devido ao esforço internacional para reconstruir Gaza e ao mesmo tempo tentar evitar que o Hamas fique com o crédito pela reconstrução, como fez o Hizbollah no sul do Líbano após a guerra de 2006. Mas a escolha é mais fundamental que isso. Ela vai ao cerne do que o presidente Barack Obama poderá realizar num processo de paz israelo-palestino quando o lado palestino continua dividido.
Em telefonemas a líderes do Oriente Médio, na quarta, Obama não revelou para qual lado pende. [No pronunciamento de ontem à tarde, ele pareceu mais inclinado a prosseguir no isolamento do Hamas, como quer Israel, embora tenha pedido que o país aliado abra as fronteiras de Gaza à ajuda humanitária e ao comércio].
Mas especialistas no Oriente Médio estão ansiosos para ouvir se o governo Obama vai tentar criar um governo palestino unificado e digno de crédito que possa negociar e implementar um relacionamento de Estado para Estado com Israel, a essência da chamada solução de dois Estados que vem dominando as negociações de paz.
"Este é um momento de escolhas difíceis, em que nenhuma das abordagem dominantes apresenta vantagens evidentes", disse Gidi Grinstein, do Instituto Reut, em Tel Aviv. "Obama está sendo pressionado a optar por um governo palestino de união nacional e um acordo abrangente. Mas seria um erro empurrar a solução de dois Estados a um momento da verdade quando, do lado palestino, estão ocorrendo tanto uma guerra civil quanto uma crise constitucional profunda."

Realidade
O Egito, a Arábia Saudita e até mesmo alguns setores em Israel são a favor de um governo de união nacional que possibilite que a ANP seja vista como encarregada, pelo menos teoricamente, da reconstrução de Gaza. Mas, mesmo que seja possível superar as rivalidades entre Hamas e o grupo secular Fatah, de Abbas, que controla a Cisjordânia, um acordo quase certamente implicaria em eleições antecipadas, que o Fatah muito possivelmente perderia.
A questão essencial, e não pela primeira vez, é se Israel e o Ocidente devem encarar o Hamas como uma realidade, na esperança de que o poderio militar e a realidade política de Israel superem a convicção religiosa do grupo de que Israel precisa ser destruído, ou se devem continuar a isolar o Hamas, na esperança de que o Fatah possa ser reativado.
O presidente francês Nicolas Sarkozy sugeriu que a França trataria com o Hamas como parte de um governo de unidade nacional que rejeitaria o uso da violência. Mas montar tal governo não será fácil, e o Hamas já declarou que suas exigências vão incluir a soltura dos prisioneiros políticos do Hamas na Cisjordânia. "O Hamas sente que emergiu invicto e popular entre palestinos e árabes", disse Khalil Shikaki, analista palestino. "As declarações da França o encorajam."
O Hamas não mais reconhece a autoridade de Abbas, cujo mandato de quatro anos terminou em 9 de janeiro, mas que ele insiste que foi estendido sob procedimentos de emergência.
Abbas já propôs a realização de eleições conjuntas para seu cargo e para o Legislativo, que o Hamas conquistou em eleições livres em 2006. Mas ele quer mudar as regras eleitorais para beneficiar o Fatah, transformando o voto distrital em voto proporcional.
O Hamas rejeita eleições para deputados antes do término dos atuais mandatos, daqui a um ano. Mas, se aceitasse eleições antecipadas como parte de um acordo, poderia conquistar a Presidência, disse Zakariya al Qaq, cientista político da Universidade Al Quds, em Jerusalém, que vê Abbas como força que já se exauriu.


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