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Papa ataca "tribalismo" ao fim de visita
Na viagem à África, Bento 16 contrapôs "universalismo" católico, para ele positivo, a "etnocentrismo" local
DA REPORTAGEM LOCAL
O papa Bento 16, numa missa
para cerca de um milhão de angolanos na capital do país,
Luanda, responsabilizou ontem o "tribalismo", a guerra e as
rivalidades entre diferentes etnias pela pobreza e pela injustiça social na África.
Segundo ele, essas "nuvens
do mal" privaram "gerações futuras dos recursos necessários
para criar uma sociedade mais
sólida e justa".
O ataque ao "tribalismo" reforça uma das ideias repetidas
pelo pontífice nessa viagem de
uma semana por dois países
africanos, Camarões e Angola,
que se encerra hoje: a da oposição entre o "universalismo" católico -visto como valor positivo- e o que ele chamou de "etnocentrismo" local.
Ainda no segundo dia de sua
viagem, Bento 16 criticou "todo
o etnocentrismo e particularismo excessivos", afirmando que
os sacerdotes africanos devem
evitar que as missas "festivas e
animadas" com elementos sincréticos locais se tornem obstáculo para o "diálogo e comunhão com Deus".
A incorporação de elementos
da cultura local em celebrações
católicas foi uma das grandes
mudanças promovidas na igreja pelo Concílio Vaticano 2º
(1962-1965), reforma que buscou aproximar o catolicismo da
modernidade, além de valorizar o poder e a cultura local das
igrejas em cada país.
O papa Bento 16, no entanto,
discorda dessa interpretação
do concílio como um movimento de "aggiornamento", e
prefere enfatizar a continuidade, a "centralidade" cultural
europeia e a tradição da Igreja
Católica.
A crítica ao "etnocentrismo"
africano traz algo de paradoxal,
afirmou na semana passada o
antropólogo Otávio Velho, do
Museu Nacional. "A Igreja Católica Romana é absolutamente etnocêntrica, em termos europeus, e não faz a crítica disso", disse ele à Folha.
Já em Angola, o papa criticou
práticas de "feitiçaria" locais,
que estariam presentes tanto
em religiões tradicionais africanas quanto em cultos de igrejas neopentecostais, muitas delas oriundas do Brasil.
Há registros de casos de
crianças e idosos abandonados
ou mortos naquele país, depois
de terem sido acusados de serem "feiticeiros". A própria
igreja, por outro lado, fomentou por séculos a crença em
"bruxas". Se agora a heresia,
para a instituição, é acreditar
em feiticeiros, por muito tempo ela estava em ser feiticeiro.
Camisinha
A "relativização" que o papa
fez do conceito de "etnocentrismo", geralmente associado
à cultura hegemônica, europeia, não foi a única em seu giro
africano. Ele também desafiou
o senso comum ao afirmar que
o uso da camisinha não só não é
parte da solução do problema
da disseminação da Aids no
mundo, como pode representar parte do problema, ao incentivar práticas vistas pela
igreja como irresponsáveis.
Os governos da França e da
Alemanha reagiram à ideia. O
Ministério das Relações Exteriores francês disse que "declarações desse tipo dificultam
políticas de saúde pública e
[vão contra] o imperativo de
proteger a vida humana".
Ontem, enquanto o papa criticava os "tribalismos" africanos, um grupo de extrema direita e outro de esquerda se enfrentaram diante da Catedral
de Notre Dame, em Paris. Integrantes do Partido Comunista
e ambientalistas distribuíam
preservativos após a missa de
domingo quando o conflito começou com os jovens direitistas, que exigiam que eles "deixassem o papa em paz".
(RAFAEL CARIELLO)
Com agências internacionais
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