São Paulo, sexta-feira, 23 de abril de 2004

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IRAQUE OCUPADO

Casa Branca diz que vai buscar "equilíbrio entre justiça e necessidade de experiência" para montar governo

EUA agora recorrem ao partido de Saddam

DA REDAÇÃO

A administração americana em Bagdá deve recorrer a membros do extinto partido Baath, que, durante 35 anos, manteve o Iraque sob uma ditadura, para montar o novo governo. A mudança de estratégia, confirmada por Washington ontem, é forçosa no país que emergiu da guerra carecendo de tradição democrática e de instituições políticas sólidas desvinculadas do regime deposto.
No início deste ano, analistas consultados pela Folha já previam o movimento, ainda que a Casa Branca insistisse na política de erradicar do poder o Baath, ao qual pertencia o ex-ditador Saddam Hussein.
Na Casa Branca, o porta-voz Scott McClellan confirmou a revisão da estratégia. "Estamos estudando como ter um equilíbrio melhor entre a necessidade de justiça e a necessidade de contarmos com a experiência de alguns iraquianos", afirmou.
"Por um lado, você tem de se certificar de que as pessoas sejam responsabilizadas e punidas. Por outro, há de se considerar que é necessário ter gente experiente em alguns setores do Iraque", acrescentou.
"Esse é um dilema para a Autoridade Provisória da Coalizão desde o início, porque você tem apenas duas fontes reais de poder no Iraque hoje -os elementos mais fundamentalistas, xiitas em sua maioria, e as estruturas políticas vigentes sob o regime de Saddam, ligadas ao Baath", disse o professor Patrick Basham, do Instituto Cato, um reputado centro de pesquisas econômicas em Washington, de orientação conservadora.
Na época da declaração de Basham (janeiro), os EUA ainda buscavam um plano para democratizar o país (hoje concluído, ainda que de forma precária), e a Folha o indagou se a APC se veria obrigada a recorrer a membros do partido de Saddam para evitar o fortalecimento fundamentalismo islâmico, sobretudo o xiita. O Baath, ainda que composto de sunitas, operava sobre uma estrutura essencialmente laica.
É exatamente isso o que ocorre agora. As autoridades americanas esperam atrair o apoio de membros da poderosa minoria sunita e, ao mesmo tempo, reduzir sua suposta colaboração com a insurgência na tensa região do Triângulo Sunita, que se estende ao norte e a oeste de Bagdá e inclui a problemática cidade de Fallujah.
Logo após a queda de Bagdá, em abril de 2003, os EUA vetaram a participação de todo membro do extinto Baath das negociações políticas e das instituições governamentais -até então, totalmente dominadas pelo partido.
A idéia, segundo o Departamento de Estado, era "evitar que criminosos desempenhassem um papel no Iraque pós-guerra".
Mas, ontem, o porta-voz do Departamento de Estado, Richard Boucher, afirmou que pessoas com histórico positivo e que eram filiadas ao partido somente porque isso era necessário para manter seus empregos "não devem ser punidas".
A decisão foi defendida também pela frente americana no Iraque. O porta-voz da APC, Dan Senor, disse que "não há lugar no Iraque para baathistas envolvidos em crimes e brutalidades", masque "gente bem capacitada que era filiada ao Baath apenas para constar" é bem-vinda.

Sem Legislativo
O governo americano anunciou ontem que a estrutura institucional que planeja montar no Iraque no segundo semestre deste ano contará com um governo provisório, que "representará a diversidade do país", mas não terá um Legislativo.
"Não acreditamos que o período entre 1º de julho e o fim de dezembro deva ser um tempo de se fazer novas leis", disse o subsecretário de Estado para Assuntos Políticos, Marc Grossman, em depoimento na Comissão de Relações Exteriores do Senado. "A estrutura do governo deve ser eficaz, simples e, para evitar impasses, não muito grande", afirmou Grossman.


Com Luciana Coelho, da Redação, e agências internacionais

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