São Paulo, quinta-feira, 23 de julho de 2009

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Visita de chanceler expõe divergências entre Brasil e Israel

Liberman pede a governo Lula que atue para conter programa nuclear iraniano; Itamaraty mantém convite a Ahmadinejad

Celso Amorim expõe ainda diferença de opiniões quanto ao fim de assentamentos judaicos na Cisjordânia e em Jerusalém Oriental


SAMY ADGHIRNI
ENVIADO ESPECIAL A BRASÍLIA

A visita do chanceler de Israel, Avigdor Liberman, a Brasília escancarou ontem as divergências diplomáticas que opõem os governos israelense e brasileiro, evidenciando os limites do diálogo entre países com agendas tão opostas.
Liberman encerrou a primeira e mais importante etapa de seu giro sul-americano -que o levará ainda a Argentina, Peru e Colômbia- sem conseguir a almejada aproximação política com o Brasil, que Israel vê como país-chave para tentar frear a atuação do Irã na região.
A intensificação das relações entre Irã e América do Sul dominou a pauta dos encontros de Liberman com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e com o chanceler Celso Amorim.
O israelense disse que "o Brasil, mais do que qualquer outro país", pode ajudar a pôr fim ao programa nuclear iraniano, que Israel, mesmo como única potência atômica do Oriente Médio, vê como ameaça existencial. Teerã diz que quer produzir energia, não bombas.
Em entrevista ao lado de Liberman, Amorim respondeu com uma alfinetada, dizendo que o Brasil assinou o Tratado de Não Proliferação Nuclear e "gostaria que todos os países fizessem o mesmo". Israel não é signatário do acordo.
A delegação israelense também não gostou de ouvir Lula e Amorim reafirmarem planos de receber o presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, que nega o Holocausto e defende que Israel seja riscado do mapa.
O iraniano planeja fazer a Brasília a sua primeira viagem após a posse para o segundo mandato, no mês que vem -antes, portanto, do presidente israelense, Shimon Peres, que tem viagem ao Brasil marcada para novembro. "O Brasil tem uma política de diálogo. Você não dialoga só com os países com os quais você está de acordo sobre tudo, senão não há conversa", disse Amorim.
O brasileiro defendeu ainda a legitimidade da reeleição de Ahmadinejad, que a oposição iraniana diz ter sido fraudulenta, afirmando que o Brasil "tem de lidar com os governantes que foram eleitos e escolhidos".
Num aceno a Lula, Liberman rompeu com o tradicional e polido mutismo de Israel sobre as pretensões de o Itamaraty mediar a paz no Oriente Médio.
"O Brasil tem ótima relação com a Síria e com os palestinos e acredito que possa contribuir para o diálogo direto entre Israel e seus vizinhos", disse o chanceler israelense.
A declaração agradou ao Itamaraty, mas há discordâncias frontais. A maior delas é sobre o fim dos assentamentos judaicos na Cisjordânia, condição estipulada em acordos de paz que o governo de Binyamin Netanyahu se nega a cumprir.
"[Liberman] disse que não tem havido aumento dos assentamentos, isso é discutível. Acho que cresceram, e isso é um fator que dificulta [a paz]", disse Amorim após despedir-se do colega -que antes admitira "desacordos e mal-entendidos" e fizera votos de que o diálogo "traga mais compreensão".
Na coletiva, os ministros disseram ter mantido "diálogo franco e cordial", eufemismo diplomático geralmente usado para descrever conversas marcadas por divergências.
Apesar do descompasso político, Brasil e Israel têm relações comerciais em plena ascensão. O intercâmbio, com a balança favorável aos israelenses, é alavancado pelas importações brasileiras de equipamentos de segurança e fertilizantes.
Amorim e Liberman também buscaram impulsionar politicamente o acordo de livre comércio Mercosul-Israel, que está emperrado nos Parlamentos dos países envolvidos.


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