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Brasil substitui EUA em acordo com Bolívia
Durante visita a região do Chapare, Lula usa colar de folhas de coca e discursa em apoio a reeleição do colega Evo Morales
O entendimento fechado entre os líderes implica na compra de artigos têxteis bolivianos a tarifa zero no valor de US$ 21 milhões
FABIANO MAISONNAVE
ENVIADO ESPECIAL A VILLA TUNARI (BOLÍVIA)
Em visita à região do Chapare, centro produtor de cocaína
e berço político de Evo Morales, o presidente Luiz Inácio
Lula da Silva vestiu um colar
feito de folhas de coca, fez um
discurso de apoio à reeleição do
colega e anunciou que o Brasil
substituirá os EUA num acordo
de preferência tarifária para a
compra de têxteis suspenso por
Washington sob a alegação de
falta de colaboração no combate ao narcotráfico.
"O Brasil vai comprar os produtos têxteis da Bolívia com tarifa zero, para a importação de
US$ 21 milhões. São exatamente as preferências perdidas nos
Estados Unidos", afirmou Lula,
em discurso a milhares de simpatizantes de Morales, na
maioria cocaleiros, que lotaram
o pequeno estádio de futebol da
cidade de Villa Tunari.
"Saúdo, companheiro Lula, o
seu grande esforço de nos conceder o mercado de têxteis para
o Brasil", discursou Morales. "É
um ATPDEA Brasil sem nenhum condicionamento."
Morales encerrou a sua fala
chamando Lula de "índio contemporâneo" e gritando, na língua quéchua: "Viva a coca, morte aos ianques."
Em 2008, o ex-presidente
dos EUA, George W. Bush, tirou a Bolívia do ATPDEA (Lei
de Preferências Tarifárias Andinas e Erradicação de Drogas,
na sigla em inglês), que condiciona incentivos à exportação
ao combate ao narcotráfico. Foi
uma represália à expulsão, por
Morales, do embaixador americano e de funcionários da DEA
(agência antidrogas dos EUA),
acusados de conspirar para
derrubá-lo. Em julho, a decisão
foi ratificada pela Casa Branca
de Barack Obama, que diz que
que o "alto escalão do governo"
incentiva a produção de coca,
matéria-prima da cocaína.
Atualmente, a Bolívia é o
principal fornecedor de cocaína ao Brasil, que recebe cerca
de 70% da produção, segundo
estimativa da FELCN (Força
Especial de Luta Contra o Narcotráfico da Bolívia).
Números do Escritório da
ONU contra a Droga e o Crime
(UNODC) mostram que, no
ano passado, houve um aumento de 6% na área de cultivo e de
9% no potencial de produção
de cocaína. É o maior índice dos
três países produtores, que incluem ainda Colômbia e Peru.
Clima de campanha
Toda a visita de cerca de quatro horas foi feita em clima de
campanha eleitoral -Morales
é o favorito nas eleições presidenciais de dezembro.
Nos 30 km que separam o aeroporto de Chimoré a Villa Tunari e no estádio, milhares de
simpatizantes esperavam com
bandeiras whipala (indígena),
do MAS (Movimento ao Socialismo, partido de Morales) e
dos dois países. No estádio,
uma faixa atrás do palco dizia:
"Evo cumpre. Para viver bem,
Evo presidente 2010-2015".
"Enfrentamos a ira dos poderosos, que não se conformaram
em perder o poder. Eles ficam
muito incomodados porque sabem que, na Bolívia, um índio,
um sindicalista, um cocaleiro,
e, no Brasil, um metalúrgico,
um sindicalista, estão fazendo
mais do que eles fizeram em todo o século 20", disse Lula.
O principal motivo da visita
de Lula foi a assinatura de um
empréstimo de US$ 332 milhões do BNDES para a construção de uma estrada entre Villa Tunari e o departamento de
Beni, ao norte. O projeto é acusado de superfaturamento e de
favorecimento à empreiteira
OAS (única participante da licitação) pela oposição e por engenheiros, mas não há investigações conclusivas.
Os presidentes também discutiram a venda de aviões Tucano para o combate ao narcotráfico, mas não houve acordo.
Lula viajou com apenas dois
ministros -o chanceler Celso
Amorim e Franklin Martins
(Comunicação Social).
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