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Chávez esquenta o inverno no Bronx
Com população endividada por hipotecas, bairro mais pobre de Nova York recebe óleo para calefação da Venezuela
Programa mantido pela companhia estatal PDVSA dá 45 milhões de galões de combustível a população pobre de 23 Estados dos EUA
DANIEL BERGAMASCO
DE NOVA YORK
O Terceiro Mundo é logo ali.
Fica a três quadras de uma linha de metrô que leva a Wall
Street, o coração financeiro dos
EUA, e a cinco de uma casa de
compra e venda de diamantes.
É o apartamento quarto-e-sala
de Hector Zejada, 54, Paola
Sánchez, 20, e Samel Sánchez,
cinco meses, no Bronx, o distrito da cidade de Nova York com
maior índice de pessoas que vivem abaixo da linha de pobreza. São mais de 383 mil, 29,1%
do total de moradores.
Zejada, que trabalha como
porteiro em um prédio residencial, se diz "feliz". Ele conseguiu
escapar de um inverno que, em
termos sociais, será mais frio
no Bronx, já que boa parte da
população comprometeu seu
salário com o pagamento de
prestações de hipotecas de juros altos e não tem dinheiro para comprar roupas apropriadas
nem óleo para calefação.
Esse seria também o caso do
porteiro, não fosse uma doação
vinda daquele que já chamou o
presidente americano George
W. Bush de "diabo" e é tido como uma pedra no sapato do governo dos EUA: o presidente
venezuelano, Hugo Chávez.
A estatal de petróleo da Venezuela, PDVSA, está distribuindo neste inverno, por meio
de sua subsidiária nos EUA, a
Citgo, 45 milhões de galões de
óleo a famílias pobres de 23 Estados americanos, incluindo
parte do Bronx. "Este é um programa que vem do coração da
Venezuela para as casas das famílias americanas que simplesmente não podem pagar suas
contas de energia", diz o texto
de divulgação do projeto -na
imprensa americana, uma provocação de Caracas.
Bem-vinda
Com a temperatrura média
neste mês em 1 C, "a ajuda é do
Terceiro Mundo, mas é bem-vinda", diz Zejada, nova-iorquino de ascendência latina. "O
Bush põe bilhões de dólares no
Iraque, mas aqui nos EUA há
pobres. É claro que a Venezuela
faz isso por política, mas pelo
menos faz. O inverno chegou, e
Bush não está fazendo nada",
diz Angela Carrasquillo, duas
filhas, moradora de outro prédio que teve ajuda.
A ONG Mount Hope Housing Corporation, que aluga
1.250 apartamentos a preços
abaixo de mercado para famílias carentes, é uma das beneficiadas. Gasta 8.200 galões por
inverno, e esse custo é diluído
no aluguel ao longo do ano.
Com a ajuda do óleo de calefação de Chávez no inverno passado, devolveu US$ 150 a cada
morador. "Dê uma olhada nas
cartas", diz a vice-presidente da
ONG, Pamela Pabb, mostrando
à Folha questionários preenchidos pelos moradores sobre
o programa. "Nós conseguimos
comprar mais comida para a
nossa família", diz uma delas.
Zejada convida a reportagem
a visitar sua casa e mostrar a
falta que a calefação faz. Naquele dia, o sistema estava desligado, em reparos. Dentro do
apartamento, as pessoas usavam blusas de frio.
Se de um lado a vida é difícil,
de outro há o assistencialismo
disseminado. Há uma distribuição de sopa por católicos
em uma esquina e, no meio do
mesmo quarteirão, há fila em
frente a uma igreja protestante
que distribuirá agasalhos usados. Peruana de Lima, Norma,
38 anos, está desempregada e
diz que precisa de roupas de
frio porque, em seu prédio, "a
calefação só funciona às vezes"
-nem a assistência de Bush
nem a de Chávez chegou até lá.
Dentro de casa, conta Norma, ela e a filha usam cobertores, cachecol, gorro e ligam o
forno. "Mas ligo só um pouco,
antes de dormir, porque pode
causar incêndio", diz ela.
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