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Violência cai, mas divisões ameaçam Iraque
Embora ataques tenham diminuído drasticamente desde janeiro, estabilização ainda depende de pacto amplo entre facções
Aumento de contingente
americano e acordos com
grupos sunitas são maiores
razões para a melhora, cuja
durabilidade ainda é incerta
ANDREA MURTA
DA REDAÇÃO
Mercados cheios. Um novo
florescer, ainda tímido, dos pequenos negócios. Refugiados
que começam a voltar. A crer
nos relatos da mídia e dos Exércitos local e estrangeiros, esse
novo cenário é o resultado da
queda da violência no Iraque,
que, segundo o Pentágono, voltou a níveis vistos pela última
vez em meados de 2005. Mas a
boa notícia vem recheada de temores: não se sabe quanto tempo a relativa calmaria vai durar.
"De 150 ataques por semana
em janeiro e fevereiro deste
ano, caímos para dez atualmente", festejou na última semana
o coronel Paul E. Funk, citado
pelo Departamento de Defesa
dos EUA. Seu grupo atua nas
áreas a norte e oeste de Bagdá.
Os números da violência divulgados pelo Pentágono em
relatório neste mês refletem a
bonança: ataques elaborados
caíram mais de 50% nos últimos nove meses. As mortes de
civis em episódios de violência
sectária foram de mais de mil
em março para cerca de 200 em
novembro; carros-bomba foram cerca de 70 por mês para
menos de 30 no período.
Os principais motivos para a
melhoria, segundo analistas,
são o "surge", ou aumento no
número de soldados americanos, e a aliança de grupos sunitas contra a Al Qaeda. "Os dois
se complementam; isolados,
nenhum teria um resultado tão
bom", disse à Folha Michael
O'Hanlon, especialista em Iraque do Instituto Brookings.
Com o "surge", anunciado
pelo presidente dos EUA,
George W. Bush, em janeiro,
foram enviados mais de 21 mil
soldados extras, levando o total
atualmente a cerca de 150 mil
-32 mil só em Bagdá, que possui 6 milhões de habitantes.
Já a aliança dos sunitas contra o braço da Al Qaeda no Iraque nasceu, em grande parte,
da rejeição contra os excessos
do grupo terrorista, além da
ameaça que ele oferecia ao poder de tribos locais.
O Pentágono destaca ainda o
crescente apoio de voluntários
a colaborar na estabilização do
país, o que permitiu a formação
de células de Cidadãos Locais
Preocupados (em inglês, Concerned Local Citizens, ou
CLC). Os CLCs são considerados pelo Exército americano
"cruciais" para a derrocada da
insurgência. Alguns grupos
exercem vigilância em bairros,
outros foram contratados para
vigiar infra-estruturas. Há cerca de 69 mil pessoas nos CLCs,
80% sunitas e 20% xiitas.
Daniel Serwer, do Instituto
para a Paz dos Estados Unidos,
grupo independente e apartidário criado e financiado pelo
Congresso americano, vê ainda
outras duas razões fundamentais para a queda na violência
no Iraque: a trégua do Exército
de Mehdi, milícia leal ao clérigo
radical xiita Moqtada al Sadr, e
a crescente separação entre as
populações xiita e sunita.
Contagem regressiva
Alheio ao otimismo, Andrew
Bacevich, ex-coronel do Exército dos EUA e especialista em
relações internacionais da Universidade de Boston, afirma
que o progresso é apenas temporário. "As tropas adicionais
enviadas no "surge" estão começando a voltar. A aliança sunita
só deve durar enquanto os líderes tribais a considerarem vantajosa. E não há quase nenhuma evidência sugerindo que os
sunitas estejam interessados
na reconciliação política necessária para estabilizar o Iraque",
afirmou à Folha.
Já Serwer, que foi diretor-executivo do bipartidário Grupo de Estudos do Iraque no
Congresso, é mais otimista.
"Uma queda desse porte deve
ser vista como oportunidade
para elaborar uma solução
mais permanente. Ela só será
temporária se permitirmos."
É consenso entre os especialistas que a "solução permanente" envolve um acordo político amplo, que estabeleça divisões mais equitativas do poder
e dos dividendos do petróleo
entre xiitas, sunitas e curdos.
A importância do acordo já
foi percebida há muito pelos
próprios americanos -os mesmos que expurgaram, após a
guerra em 2003, os sunitas do
poder. O movimento nessa direção, porém, tem sido lento.
"Há sinais de esperança nas
Províncias, mas muito mais
ainda tem que acontecer, sobretudo em Bagdá", diz O'Hanlon. "O governo central xiita
tem que permitir um papel
maior aos sunitas, ou o Iraque
não terá a menor chance."
É por isso, destaca Serwer,
que "o maior desafio militar futuro é o conflito sectário". Separar fisicamente as populações xiita e sunita, como vem
fazendo o Exército local e americano, é um paliativo. Muros e
postos de checagem na entrada
de bairros das maiores cidades
iraquianas podem dificultar
ataques, mas nem sequer começam a lidar com o que está
por trás da ira dos radicais.
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