São Paulo, quarta-feira, 24 de janeiro de 2007

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Protesto contra o governo pára o Líbano

Paralisação liderada pelo Hizbollah termina em confronto, com três mortos, e aumenta pressão sobre o premiê Siniora

Oposição suspende a greve, mas promete escalada nos protestos; chefe do governo rejeita "intimidação" e diz que não deixará o cargo

Ramzi Haidar/France Presse
Soldados libaneses em blindados diante de opositores em estrada de acesso a Beirute; confrontos pelo país deixaram 130 feridos


MARCELO NINIO
DA REDAÇÃO

Cinco meses após o fim da guerra com Israel, grossas colunas de fumaça negra cobriram ontem os céus de Beirute, em meio a uma greve geral convocada pela oposição para forçar a queda do governo do premiê sunita Fouad Siniora. O protesto, que paralisou o país, provocou distúrbios entre facções rivais que deixaram três mortos e mais de 130 feridos.
Foi o dia mais violento no Líbano desde que a oposição liderada pelo grupo xiita Hizbollah começou a protestar nas ruas, há dois meses, para pedir a dissolução do governo e a antecipação das eleições. Os opositores, entre os quais também há cristãos e drusos, alegam que o atual gabinete deixou de ser representativo após a renúncia de cinco ministros xiitas e um cristão, no fim de novembro.
No fim da noite, após um dia de confrontos violentos, marcados pela queima de pneus que espalhou fumaça pelos céus do país, a oposição anunciou a suspensão da paralisação. Um porta-voz do movimento disse à agência Associated Press, pedindo anonimato, que a greve "alcançou seus objetivos", e advertiu que novos protestos virão.

Componente social
A manifestação de ontem ocorre, não por acaso, na véspera da viagem de Siniora a Paris, onde apresentará suas propostas para a recuperação econômica do Líbano a uma conferência de doadores, na quinta-feira. O plano, que prevê uma série de medidas destinadas a atrair o investimento estrangeiro e aumentar a arrecadação, deu mais combustível aos protestos, principalmente dos xiitas, que compõem a camada mais pobre da população.
"O protesto passou a ter um componente claramente social, já que o pacote que Siniora apresentará em Paris privilegia os banqueiros e prejudica os mais pobres, principalmente com o aumento do IVA [Imposto sobre Valor Agregado]", disse à Folha a analista política Roula Talj, ex-assessora do premiê Rafik Hariri, assassinado em Beirute em 2005.
O que foi planejado para ser uma manifestação pacífica acabou expondo as tensões que ameaçam mergulhar o país de volta no ciclo de violência que produziu uma sangrenta guerra civil (1975-1990) e há meses mantêm governo e oposição em confronto.
Além de queimar pneus e bloquear estradas, fechando o acesso à capital e outras importantes cidades, os manifestantes enfrentaram partidários do governo em batalhas de rua que envolveram pedradas, briga corporal e, em alguns casos, tiroteios.
Soldados e policiais libaneses tentaram separar as facções rivais, mas várias manifestações terminaram em confrontos. Duas pessoas foram mortas a tiros na cidade portuária de Trípoli, no norte do país, cuja população é de predominância sunita. Segundo a polícia, ao menos 45 pessoas ficaram feridas em tiroteios, principalmente nas cidades cristãs de Byblos e Halba.

"Intimidação"
Cada vez mais pressionado, Siniora prometeu, em pronunciamento na TV, resistir ao que chamou de "intimidação". "A greve geral de hoje [ontem] se transformou em ações e agressões que ultrapassaram todos os limites e trouxeram de volta à memória tempos de confronto e guerra", disse o premiê.
Apesar de insistir que não deixará o cargo, Siniora se mostrou disposto a dialogar com a oposição e pediu uma sessão de emergência no Parlamento para debater a crise. Ao mesmo tempo, sugeriu que poderá tomar medidas mais duras para reprimir protestos no futuro.
Para o analista político Paul Khalifeh a crise é conseqüência direta da guerra do ano passado. "O Hizbollah diz ter provas de que a coalizão que apóia Siniora se aliou aos EUA e a Israel para derrotar o Hizbollah", disse Khalifeh à Folha. "Isso esgotou qualquer possibilidade de colaboração. Diante da recusa de Siniora em negociar um governo de união, a tendência é o confronto piorar."


Texto Anterior: Acuado por Estados, empresas e pela UE, Bush tem de responder à questão do clima
Próximo Texto: Artigo: A volta do pesadelo
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.