São Paulo, quarta-feira, 24 de março de 2010

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Amorim e diretor da AIEA divergem sobre negociação com Irã

Japonês diz que plano de troca de urânio "segue na mesa", mas deixa claro não pretender explorar agora formato sugerido por chanceler

Chefe da agência atômica da ONU afirma não ter acusado Teerã de buscar a bomba, mas diz que país deve sanar dúvidas listadas em relatório


CLAUDIA ANTUNES
DA SUCURSAL DO RIO

O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, e o diretor-geral da AIEA (Agência Internacional de Energia Atômica), Yukiya Amano, demonstraram divergências quanto ao rumo das negociações sobre o programa nuclear do Irã, em entrevista conjunta no Rio.
O japonês Amano, que assumiu o cargo há quatro meses e é considerado mais alinhado aos EUA que seu antecessor, o egípcio Mohammed El Baradei, também fez pressão discreta para que o Brasil assine um protocolo adicional ao TNP (Tratado de Não Proliferação), ampliando o alcance das inspeções da AIEA nas instalações nucleares brasileiras.
O diretor da agência atômica da ONU disse que "continua na mesa" a proposta para que o Irã troque seu estoque de urânio com baixo enriquecimento por combustível enriquecido a 20%, destinado a abastecer seu reator para uso médico -o plano evitaria que os iranianos usem o estoque para construir uma bomba.
Mas Amano deixou claro que não pretende ou não tem apoio no momento para atualizar a proposta no sentido sugerido por Amorim, de que a troca simultânea, como quer Teerã, seja feita por intermédio de um terceiro país, como a Turquia, que tenha a confiança do Ocidente e dos iranianos.
Mesmo com um "convite em aberto", ele disse não ter "plano ou data particulares" para visitar o Irã -iniciativa que, segundo disse Amorim à Folha anteontem, daria novo impulso à negociação. "Não posso ir a Teerã para dizer oi, preciso ter algo político para discutir. Negociamos discretamente, por vários canais, e outros países, como Brasil e Turquia, estão falando com os interessados."
O diretor da AIEA indicou ainda que sua prioridade é que o Irã "esclareça" as suspeitas levantadas no relatório divulgado por ele no mês passado. Embora, afirmou, o texto não acuse o país de ter um programa militar secreto, é preciso que os iranianos se disponham a "conversar" sobre o tema, o que não fazem desde 2008.
O chanceler brasileiro, no entanto, tem posição inversa. Para ele, um acordo para a troca de combustível é que poderia melhorar a relação entre o Irã e a AIEA. "Achamos que é preciso haver cooperação. Para que haja cooperação, seria positivo que o acordo avançasse. Haveria mais clima para a discussão de outras questões."
Mesmo admitindo que a AIEA tem de sanar as dúvidas sobre o Irã, a diplomacia brasileira avalia que o relatório de Amano recicla suspeitas velhas, citando "estudos alegados" feitos por agências de espionagem não nomeadas.
"A questão é ser cuidadoso, porque você pode ser ingênuo por acreditar muito no Irã ou por acreditar muito nas agências de informação de outros países", afirmou Amorim. Ele voltou a citar o Iraque, "quando foi preciso pelo menos 200 mil pessoas mortas" para se concluir que não havia armas de destruição em massa.
Amano, que visitou a fábrica de urânio enriquecido da INB (Indústrias Nucleares do Brasil), falou do protocolo adicional no início da entrevista. "O protocolo reforça a capacidade de verificação da agência, e eu gostaria de ver um número máximo de países aderindo."
A posição brasileira é a de só negociar um protocolo do tipo numa barganha em que as potências nucleares se comprometam com o desarmamento, como prevê o TNP. O país afirma ainda que suas instalações estão sob escrutínio suficiente, da AIEA e da Abacc (Agência Brasileiro-Argentina de Controle e Contabilidade).


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