São Paulo, quinta-feira, 24 de maio de 2007

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Líbano dá ultimato a radicais islâmicos

Ministro promete mais ataques, mas militantes entrincheirados desde domingo dizem que têm armas para resistir nove meses

Cruz Vermelha calcula que metade dos residentes em campo cercado pelo Exército já fugiram; número total de mortos pode passar de cem

TARIQ SALEH
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, DE TRÍPOLI

O ministro da Defesa libanês, Elias Murr, disse ontem aos militantes radicais do grupo Fatah al Islam, entrincheirados desde domingo num campo de refugiados palestinos, que se rendam ou enfrentarão mais bombardeios do Exército. O grupo divulgou comunicado prometendo lutar até o fim e afirmando que possui armas para combater por mais nove meses.
"Seu destino é a prisão e, se resistirem ao Exército, a morte", disse Murr em entrevista ao canal de TV Al Arabiya.
Porém, o comandante do grupo, Shaheen al Shami, falou à TV Al Jazeera que seus homens poderiam levar a batalha para fora do campo: "Vamos lutar até a morte contra eles."
Alheio aos discursos, militares libaneses continuaram o cerco ao campo palestino de Nahr al Bared, onde os radicais encontram-se posicionados. Só ambulâncias e ajuda humanitária podiam entrar.
Em Beddawi, a dez quilômetros de Nahr al Bared, jovens das facções palestinas carregando fuzis faziam a "segurança", enquanto a Cruz Vermelha descarregava alimentos numa escola da ONU que abriga refugiados do campo.
No prédio de três andares, crianças brincavam pelos corredores. A inocência dos pequenos contrastava com as preocupações dos adultos. Numa das salas, Fatwa Ahmad, 31, e seu marido, Mohamed Abdel Rahim, 36, lamentavam, com lágrimas nos olhos, a perda de sua casa. Os tanques libaneses a destruíram depois que fugiram, na terça-feira.
"Não trouxemos nada. Viemos com as roupas do corpo e sem dinheiro", disse Fatwa, rodeada por seus cinco filhos.
Não longe dali, Abir Shade Abdel Rahim, 39, esperava sentada num colchão com seus dois filhos pequenos Rawad, 2, e Yasmin, 5 meses. "Tudo que posso fazer é esperar. O bebê precisa de remédio para febre, mas me deram um para crianças maiores", disse. Ela, como muitos palestinos, fugiu aproveitando o cessar-fogo de terça-feira. Seu marido continua no campo. Não há notícias.
Segundo a Cruz Vermelha, no fim do dia de ontem, o quarto seguido de confrontos, metade dos cerca de 30 mil refugiados do campo de Nahr al Bared tinha deixado o local. Não há ainda uma contagem oficial de vítimas, mas a estimativa é de que pelo menos 86 pessoas tenham morrido até a noite de terça -entre elas 27 civis.
Ontem o Ministério da Defesa libanês falava em até 60 militantes mortos, contando os últimos confrontos.
Tentando organizar o cadastro dos que chegavam, o diretor da escola pertencente à ONU, Ali Issa, 54, explicava que 17 mil palestinos chegaram ao campo de Beddawi desde segunda-feira. "As aulas estão canceladas indefinidamente. Não há salas para as aulas". Enquanto isso, nos corredores quentes e sujos refugiados brigavam por água e pacotes de comida.
Do alto de sua sacada, ao lado da escola, o militante do partido da Frente Popular para a Libertação da Palestina (FPLP) Nasser Sarhan, 43, observava o desespero dos refugiados balançando a cabeça negativamente. "Esse povo está agora na sua segunda diáspora", sentenciou, se referindo à fuga dos palestinos depois da criação de Israel, em 1948. "É difícil para estas pessoas deixarem suas casas. Eles vivem agora sua segunda tragédia".
No início da noite de ontem, mais um atentado sacudiu o Líbano. Desta vez a explosão aconteceu na cidade de Aley, de maioria drusa, nas montanhas ao redor de Beirute. Ao menos cinco pessoas ficaram feridas.
O Conselho de Segurança da ONU condenou os ataques do Fatah al Islam ao Exército libanês "nos termos mais fortes possíveis", afirmando que eles constituem um desafio "inaceitável" à soberania do país.
Hoje o recém-nomeado chanceler da França, Bernard Kouchner, chega a Beirute, onde se reunirá com o premiê, Fuad Siniora.


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