São Paulo, quarta-feira, 24 de junho de 2009

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ANÁLISE

Ninguém sabe o que acontece no Irã -nem Obama

DE WASHINGTON

Seis especialistas em Irã do centro de estudos independente Brookings, de Washington, se reuniram na tarde de ontem para lançar o relatório "Qual o Caminho para a Pérsia -Opções para Uma Nova Estratégia Americana para o Irã".
Ao final da sessão, conversaram com a plateia. Entre os autores, há três ex-analistas do Irã da CIA, a agência de inteligência norte-americana, como Kenneth Pollack e Bruce Riedel. Uma das primeiras perguntas foi: qual a qualidade da inteligência que a Casa Branca está recebendo sobre o país? A resposta unânime: ninguém sabe o que acontece no Irã.
Em sua fala de ontem, Barack Obama disse três vezes que seu governo "não sabia" qual seria a resposta do Irã nem como a situação naquele país se desenvolveria. Ninguém sabe. Os EUA não têm relação diplomática com o Irã desde 1979.
O país depende dos relatos de inteligência de segunda mão de aliados como o Reino Unido (que teve diplomatas expulsos de Teerã ontem), a Alemanha e a França. Neste momento, Washington quebra a cabeça para entender, por exemplo, o sumiço do ex-presidente Akbar Hashemi Rafsanjani. Estaria preso? Trabalhando nos bastidores por uma união dos clérigos moderados?
Outro dilema dos EUA: apoiar abertamente os manifestantes seria macular o movimento de uma maneira que o isolaria junto ao iraniano médio. E se a decisão for de apoio, como garantir a continuidade? Para Pollack, os obamistas temem repetir o que George Bush pai fez em 1991, na Guerra do Golfo.
O então presidente republicano deu declarações públicas de apoio aos revoltosos xiitas, mas logo retirou as tropas americanas daquela região. O resultado foi o massacre de, segundo relatos, mais de 100 mil iraquianos pelo governo do sunita Saddam Hussein.
Nesse cenário de incerteza, concordaram os experts do Brookings, a alternativa menos pior é mesmo insistir na "doutrina Obama", segundo a qual a maneira de abrir o regime dos aiatolás é inserir o país na comunidade internacional.
A ignorância sobre a realidade iraniana não é prerrogativa dos democratas. Em 2006, passei dez dias em reportagens no Irã. Era o meio do primeiro mandato de Mahmoud Ahmadinejad, quando o presidente ultraconservador começava a assustar o mundo ocidental.
Era também o renascimento do movimento dos moderados que explodiu agora. Depois de entrevistas com o grão-aiatolá progressista Hussein Ali Montazeri e o dissidente Ebrahim Yazdi, entre outros, ficou claro como a classe média e os jovens começavam a se divorciar da ala mais dura dos religiosos.
A maioria da população iraniana nasceu depois da Revolução Islâmica de 1979. São jovens como Neda Agha-Soltan, que se comunicam e se mobilizam via torpedos (que eles chamam de "êssémés", de SMS), escritos em "fingilish", gíria que mistura persa e inglês.
Na volta, relatei o que vira a um republicano, com acesso aos neocons de Bush. Ele se espantou com a existência de classe média no Irã. (SD)


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