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ANÁLISE
Ninguém sabe o que acontece no Irã -nem Obama
DE WASHINGTON
Seis especialistas em Irã do
centro de estudos independente Brookings, de Washington,
se reuniram na tarde de ontem
para lançar o relatório "Qual o
Caminho para a Pérsia -Opções
para Uma Nova Estratégia
Americana para o Irã".
Ao final da sessão, conversaram com a plateia. Entre os autores, há três ex-analistas do
Irã da CIA, a agência de inteligência norte-americana, como
Kenneth Pollack e Bruce Riedel. Uma das primeiras perguntas foi: qual a qualidade da inteligência que a Casa Branca está
recebendo sobre o país? A resposta unânime: ninguém sabe o
que acontece no Irã.
Em sua fala de ontem, Barack
Obama disse três vezes que seu
governo "não sabia" qual seria a
resposta do Irã nem como a situação naquele país se desenvolveria. Ninguém sabe. Os
EUA não têm relação diplomática com o Irã desde 1979.
O país depende dos relatos de
inteligência de segunda mão de
aliados como o Reino Unido
(que teve diplomatas expulsos
de Teerã ontem), a Alemanha e
a França. Neste momento,
Washington quebra a cabeça
para entender, por exemplo, o
sumiço do ex-presidente Akbar
Hashemi Rafsanjani. Estaria
preso? Trabalhando nos bastidores por uma união dos clérigos moderados?
Outro dilema dos EUA:
apoiar abertamente os manifestantes seria macular o movimento de uma maneira que o
isolaria junto ao iraniano médio. E se a decisão for de apoio,
como garantir a continuidade?
Para Pollack, os obamistas temem repetir o que George
Bush pai fez em 1991, na Guerra
do Golfo.
O então presidente republicano deu declarações públicas
de apoio aos revoltosos xiitas,
mas logo retirou as tropas americanas daquela região. O resultado foi o massacre de, segundo
relatos, mais de 100 mil iraquianos pelo governo do sunita
Saddam Hussein.
Nesse cenário de incerteza,
concordaram os experts do
Brookings, a alternativa menos
pior é mesmo insistir na "doutrina Obama", segundo a qual a
maneira de abrir o regime dos
aiatolás é inserir o país na comunidade internacional.
A ignorância sobre a realidade iraniana não é prerrogativa
dos democratas. Em 2006, passei dez dias em reportagens no
Irã. Era o meio do primeiro
mandato de Mahmoud Ahmadinejad, quando o presidente
ultraconservador começava a
assustar o mundo ocidental.
Era também o renascimento
do movimento dos moderados
que explodiu agora. Depois de
entrevistas com o grão-aiatolá
progressista Hussein Ali Montazeri e o dissidente Ebrahim
Yazdi, entre outros, ficou claro
como a classe média e os jovens
começavam a se divorciar da
ala mais dura dos religiosos.
A maioria da população iraniana nasceu depois da Revolução Islâmica de 1979. São jovens como Neda Agha-Soltan,
que se comunicam e se mobilizam via torpedos (que eles chamam de "êssémés", de SMS),
escritos em "fingilish", gíria
que mistura persa e inglês.
Na volta, relatei o que vira a
um republicano, com acesso
aos neocons de Bush. Ele se espantou com a existência de
classe média no Irã.
(SD)
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