São Paulo, segunda-feira, 24 de julho de 2006

Próximo Texto | Índice

GUERRA NO ORIENTE MÉDIO

Israel se abre a força da Otan no Líbano

Para enviado da ONU, ação israelense viola direito humanitário internacional; Condoleezza Rice chega hoje à região

Em dia de troca intensa de fogo entre israelenses e o Hizbollah, diplomacia caminha sem que haja a garantia de um cessar-fogo

MARCELO NINIO
ENVIADO ESPECIAL A BEIRUTE

MICHEL GAWENDO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, DE HAIFA

O premiê de Israel, Ehud Olmert, disse ontem que pode aceitar a presença de uma força armada internacional no sul do Líbano como parte de um plano para encerrar o conflito com o Hizbollah, que já dura 13 dias e matou mais de 400 pessoas -cerca de 90% do lado libanês.
Mas a intensa movimentação diplomática de ontem não arrefeceu a ação militar, iniciada no último dia 12 em retaliação ao seqüestro de dois soldados israelenses pelo Hizbollah. Além de voltar a atingir o sul de Beirute, Israel continuou a bombardear o que diz serem alvos do grupo islâmico em Tiro e Sidon, no sul do país. Ao menos oito pessoas morreram, incluindo quatro em um comboio de refugiados. Já o Hizbollah disparou 93 foguetes Katyusha contra Israel, matando duas pessoas em Haifa. Os feridos tanto de um lado como de outro chegaram a mais de cem.
Israel vê com desconfiança a atuação de tropas internacionais, por considerar que estas não podem garantir que o Hizbollah pare de ameaçar o país. Por isso, Olmert aceita apenas uma força militar ativa, e não só tropas de manutenção da paz.
O Exército de Israel, que convocou reservistas e concentrou tropas na fronteira, admitiu que começou a preparar sua unidade de administração civil para atuar em partes capturadas do território libanês, mesmo afirmando que as operações terrestres serão limitadas.
Os militares israelenses, que estão recebendo munição americana, avançaram em direção à aldeia de Bint Jibeil, considerada a "capital" do Hizbollah no sul do Líbano.
Os moradores de mais sete aldeias, além das 13 de anteontem, receberam advertências para deixar suas casas sob risco de novos ataques. Israel já tomou Maroun al Ras.
O coordenador de operações de emergência da ONU, Jan Egeland, chegou ontem a Beirute horas depois de mais uma noite de bombardeios israelenses à capital.

Devastação
Em visita ao distrito xiita da cidade, praticamente pulverizado pelos ataques, Egeland condenou a devastação causada pela ofensiva israelense contra o reduto do Hizbollah e indicou que a ação pode ser considerada uma "violação do direito humanitário internacional". Visivelmente perturbado pelo cenário, enquanto tentava caminhar por entre os destroços, Egeland se manifestou chocado com a "resposta desproporcional" de Israel e apelou aos dois lados que suspendam os ataques. Egeland disse que pediria US$ 100 milhões em ajuda e que suprimentos humanitários da organização começariam a chegar dentro de alguns dias. Mas fez uma ressalva: "Precisamos de acesso seguro. Até agora Israel não está dando esse acesso".
Olmert anunciou há poucos dias a abertura de um "corredor humanitário" no acesso marítimo a Beirute, o que tem permitido a retirada pelo porto da capital de cidadãos estrangeiros. Mas com os acessos por terra bombardeados, o transporte de mercadorias tornou-se uma missão perigosa. Em estradas próximas à capital a reportagem da Folha cruzou com dezenas de caminhões que usavam panos brancos para indicar que eram civis.

Abertura diplomática
O formato das próximas negociações começará a ser debatido hoje, com a chegada da secretária de Estado dos EUA, Condoleezza Rice, a Jerusalém. Ela já afirmou que não pressionará por um cessar-fogo, e a avaliação atual em Israel é que o país terá até o próximo domingo, quando Rice volta ao Oriente Médio, para continuar atacando o Hizbollah.
Olmert disse cogitar o envio de uma força militar ativa, liderada por países europeus, que criaria uma zona-tampão no Líbano entre Israel e o Hizbollah. Os EUA rejeitaram de imediato enviar soldados. Em caso de presença de tropas, é provável que países árabes, como o Egito, participem.
O ministro da Defesa de Israel, Amir Peretz, afirmou que o país também pode aceitar tropas da Otan -idéia que tem apoio do embaixador dos EUA na ONU, John Bolton.
Apesar de o premiê israelense ter afirmado que considera o governo libanês um parceiro para um futuro diálogo, Israel diz que a ofensiva militar continuará durante as negociações.
O Hizbollah também deu sinais de abertura diplomática. O presidente do Parlamento libanês, Nabih Beri, disse ontem que o grupo concordou, pela primeira vez, que o governo de Beirute lidere as negociações sobre uma troca de prisioneiros com Israel. "O governo do Líbano, por meio de uma terceira parte, vai assumir as negociações. Isso é aceito por nossos irmãos do Hizbollah e por nós", disse Beri à CNN.
Segundo o chanceler libanês, Fauzi Saluj, os dois soldados israelenses seqüestrados "gozam de boa saúde e se encontram em um lugar seguro".

Síria
A Síria -acusada de, ao lado do Irã, patrocinar o Hizbollah- disse estar disposta a dialogar com os EUA para ajudar a encerrar o conflito, desde que a iniciativa envolva negociações para a devolução das colinas de Golã, que os israelenses capturaram em 1967.
Mas, ao mesmo tempo, Damasco advertiu que vai responder militarmente se tropas israelenses aproximarem-se de suas fronteiras. É improvável que Israel aceite dialogar com a Síria, a qual acusa de envolvimento direto no conflito, e envolver Golã, que foi anexado.
Os EUA também rejeitam negociar com Damasco.


Próximo Texto: Meta dos EUA é afastar Damasco de Teerã
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.