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São Paulo, domingo, 24 de agosto de 2003

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"Árabes só pensam em vingança", afirma israelense

MICHEL GAWENDO
FREE-LANCE PARA A FOLHA, EM JERUSALÉM

A volta da ameaça de terrorismo em Jerusalém levou muitos moradores a mudarem os hábitos para evitar aglomerações e locais considerados alvos potenciais de atentados -como restaurantes conhecidos, calçadões no centro da cidade e mercados abertos.
Segundo moradores ouvidos durante esta semana, a vida estava voltando ao normal desde o início da trégua anunciada por grupos terroristas, em 29 de junho. Mas o sentimento de medo voltou desde terça-feira, quando um imã radical de Hebron explodiu-se num ônibus lotado com judeus religiosos e matou 20 pessoas.
No dia seguinte, Israel revidou, matando com disparos de mísseis um dos fundadores do Hamas, Ismail Abu Chanab, o que levou os grupos militantes a prometerem mais atentados. Na quinta-feira, foi declarado pelos grupos terroristas o fim formal da trégua.
A secretária Tal Golan, 23, deixou de ir ao mercado aberto de Machané Yehuda na sexta-feira -"onde os preços são mais baixos e tem mais variedade"- e fez as compras para o fim de semana em um supermercado comum.
"Não foi fácil ouvir as notícias sobre o atentado desta semana. Minha primeira reação é evitar lugares com muita gente. O shuk [mercado] já sofreu ataques graves e é muito visado", afirmou.
No mercado, a segurança não parecia ter sido reforçada na sexta-feira. Na entrada principal, dois soldados armados com metralhadoras revistavam algumas bolsas. Um deles disse que não que tinha permissão para ser entrevistado, mas afirmou que o movimento parecia o mesmo de todas as manhãs de sexta.
Dentro, porém, a não ser no corredor principal, caótico como sempre, pouca gente circulava e muita lojas estavam vazias. "Sei que pode acontecer um atentado. Não dá para eliminar todo o risco, mas me sinto mais seguro aqui do que nos EUA", disse, enquanto comprava caixas de cereal matinal, o americano John Little, 36, católico que se mudou para Jerusalém há oito anos para trabalhar numa empresa de softwares.
Na saída do mercado, um homem carregando sacolas com frutas e pães contou que, nesta semana, fez as compras com pressa. "Em épocas assim, não é bom ficar escolhendo muito ou ficar batendo papo no mercado. Comprei o que precisava e saí", disse. "É claro que tenho medo. Atentados podem ocorrer em todo lugar. Nem vou sair no fim de semana."
A cerca de dez minutos de caminhada do mercado, o local do ataque da última terça-feira estava agitado. No lugar exato da explosão, num cruzamento, foram colocados alguns ramos de flores, um pequeno altar com velas e uma pilha de livros de orações.
O estudante de seminário rabínico Shai Cohen, 30, que mora perto dali, acha que o fim da trégua resultará em novos atentados em breve, mas que isso depende mais do comportamento dos judeus, e menos das promessas de vingança dos grupos terroristas.
"Somos um povo que acredita em Deus e que tudo o que Ele faz é para o bem. Quando acontece um ataque, temos de lembrar que precisamos ajudar uns aos outros. Se nos comportarmos bem, de acordo com a vontade de Deus, não acontecerão atentados."
Enquanto Shai falava, um grupo de estudantes de outro seminário rabínico passou e, aos poucos, alguns deles se interessaram em conversar com a reportagem.
"Meu rabino falou que, quando deixamos de fazer boas ações, Deus dá medo aos judeus e coragem para os árabes, e eles fazem atrocidades. Israel se fortalece quando os judeus fazem boas ações", disse um deles. Outro acha que "o problema é que os árabes têm ódio no coração". "Eles só pensam em vingança e vão realizar outros ataques aqui".
Na cidade antiga de Jerusalém, ao leste da parte moderna, soldados da tropa de choque da polícia israelense vigiavam a entrada do local conhecido pelos judeus como Monte do Templo e por Esplanada das Mesquitas pelos muçulmanos. O acesso ao local foi reaberto para visitas de não-muçulmanos, mas, por causa do fim da trégua, voltou a ser fechado.
Alguns turistas acompanhavam as orações no Muro das Lamentações, considerado o local mais sagrado do judaísmo. "Logo que cheguei a Israel, ouvi sobre o atentado. Fiquei triste e ansioso. Antes de ir a algum lugar, pergunto a israelenses se é seguro", disse o indiano Ganesh Banglore, 30, que escolheu Jerusalém e Tel Aviv para passar as férias com amigos.
O dono de restaurante Yossef Sade, 43, disse que o movimento cai muito quando há ataques. "Este fim de semana vai ser muito fraco. Não aguento mais essa história de atentado-revide-atentado. As pessoas deixam de sair de casa ou só vão para o shopping."
No mesmo horário, milhares de palestinos enchiam as ruas da Cidade de Gaza no funeral do líder do Hamas morto na quinta-feira por um ataque com mísseis disparados por Israel. Gritavam que vingariam a morte do militante com outros ataques terroristas.
Para o mecânico palestino Mohammed, que não quis dizer seu sobrenome por temer "represálias" de Israel, os atentados suicidas "não vão terminar até que os palestinos tenham um Estado".


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