São Paulo, quarta-feira, 24 de agosto de 2011

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ANÁLISE

"Jornalismo heróico" na Líbia empurra correspondentes para a linha de tiro

NELSON DE SÁ
ARTICULISTA DA FOLHA

Durante 24 horas, a correspondente Alex Crawford, do canal de notícias britânico Sky News, viajou de Zawiyah até a praça Verde, centro de Trípoli, na caçamba de uma caminhonete em alta velocidade, acompanhada de um produtor e dois câmeras.
No caminho, feito boa parte dele à noite, de domingo para segunda, muita festa entre os líbios e "alguns tiros esparsos" contra o comboio dos rebeldes e jornalistas.
As imagens da Sky News foram reproduzidas pela americana Fox News, também de Rupert Murdoch, e acabaram recebendo elogios até da concorrência, com o âncora Piers Morgan, da americana CNN, saudando seu "jornalismo heróico" via Twitter.
Ontem, sem parar, Crawford acompanhou ao vivo o cerco ao complexo de Gaddafi e depois entrevistou, já dentro, rebeldes que brincavam, rindo muito, "Cadê você, Gaddafi?!". E descreveu um cenário de destruição, com os rebeldes orando no fim dos combates.
Talvez pelo impacto espetacular da cobertura da Sky News, a também britânica BBC seguiu o mesmo caminho e, na segunda, o correspondente Rupert Wingfield-Hayes apareceu na caçamba de uma caminhonete, correndo por Trípoli, num esforço que terminou em fuga do comboio, sob tiros das forças de Gaddafi.
A CNN entrou ontem com a correspondente Sara Sidner também do lado de fora do complexo de Gaddafi, sob o barulho constante de tiros, para desespero dos âncoras nos EUA, que rogavam ao vivo que a jornalista saísse de lá.

"POR FAVOR, NÃO ATIRE"
"Estamos bem", dizia ela, calmamente, pedindo para um rebelde, ao lado, não atrapalhar mais a transmissão: "Por favor, não atire". Mas a escalada de risco iniciada por Alex Crawford, ao que parece, terminou mal para um correspondente da Al Jazeera, segundo relato da própria CNN. Ele teria sido atingido por tiros dentro do mesmo complexo de Gaddafi -o que não foi confirmado pelo canal de notícias do Qatar, até o fechamento.
Enquanto isso, do hotel ainda cercado por soldados de Gaddafi, com quatro dezenas de correspondentes estrangeiros impedidos de ir às ruas, Matthew Chance, também da CNN, lamentava via Twitter: "Mesmo com o complexo caindo nas mãos do rebeldes, o Rixos ainda está sob controle de Gaddafi".
E no início da noite, como relatou o mesmo Chance pelo Twitter e depois ao vivo na CNN, já eram ouvidos tiros também dentro do Rixos. Na madrugada, postou ele depois, silêncio.
Ao fundo, Jon Lee Anderson, da "New Yorker", que passou semanas com os rebeldes no início da revolta, aconselhava ontem, aos que estão "aturdidos com as notícias que saem da Líbia": "Presuma que nada é o que parece" e "Deixe a teoria do caos ser sua guia", não só quanto à cobertura, mas quanto ao futuro do país.


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