São Paulo, sábado, 24 de outubro de 2009

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CLÓVIS ROSSI

Melhor falar que brigar


O engajamento diplomático que Barack Obama defende funciona mais que confronto na relação Ocidente-Teerã


TODAS AS análises que indicavam rota de colisão entre o Irã e o Ocidente começaram a murchar em apenas meia dúzia de dias, depois de 30 anos de estranhamento, que nem é a palavra mais forte que se poderia aplicar a esse contencioso.
Detalhes à parte, o que realmente importa é que as coisas estão se movendo -e para a frente.
Ajuda-memória: autoridades iranianas conversaram primeiro com representantes dos Estados Unidos (além dos demais países que têm poder de veto no Conselho de Segurança mais a Alemanha). Depois, conversaram também com representantes de Israel, o arqui-inimigo. Não havia conversas desse gênero desde a Revolução Islâmica de 1979, há 30 anos portanto.
Feita a introdução, é forçoso entrar nos detalhes, onde mora o Diabo, conforme diz um ditado popular inglês. Detalhe 1: a conversa entre um funcionário iraniano e uma embaixadora israelense se deu em um evento muito mais acadêmico que político, uma reunião da Comissão Internacional de Não Proliferação Nuclear e Desarmamento, uma iniciativa do primeiro-ministro australiano, Kevin Rudd.
Não há, portanto, uma conversa efetivamente política entre os dois grandes atores do Oriente Médio.
Detalhe 2 - A outra conversa, entre os grandes e o Irã, produziu só um pré-acordo, ainda que auspicioso, para resolver o contencioso entre o país e o Ocidente em torno do programa nuclear iraniano.
O pré-acordo prevê que o Irã entregue à Rússia a maior parte do urânio que armazena na fábrica de Natanz, para que seja enriquecido a 19,75%, o limite para uso em radioisótopos para a medicina.
Se aceito, o acordo no mínimo, no mínimo, retardaria consideravelmente a hipótese de o Irã enriquecer urânio no ponto necessário para fins militares.
Os detalhes que surgiram ontem, no entanto, desmentem o caráter diabólico que a sabedoria convencional a eles atribui: havia um prazo, a vencer exatamente ontem, para que o governo iraniano aceitasse o pré-acordo. Mas Ali Asghar Soltanieh, o representante iraniano junto à Agência Internacional de Energia Atômica, pediu mais tempo, até a semana que vem.
O suficiente para atiçar a desconfiança no Ocidente, tanto que a agência France Presse dá à sua informação a respeito o seguinte título: "O Irã esnoba prazo para acordo sobre urânio".
Mas o Departamento de Estado americano reagiu com menos acidez: "Acho que podemos esticar as coisas uns poucos dias", disse seu porta-voz Ian Kelly. Acrescentou, como é praxe: "Mas não vamos esperar para sempre".
Tudo somado, parece claro que o que o presidente Barack Obama chama de política de engajamento funciona.
Tanto que Juan Cole, presidente do Global Americana Institute, um centro de estudos obviamente norte-americano, observou logo no início do diálogo em Genebra: "Obama conseguiu mais do Irã em sete horas e meia do que Cheney [Dick Cheney, vice-presidente de George Walker Bush, duro entre os duros] em sete anos e meio".
Como é óbvio, nada está resolvido. Mas está melhor hoje do que há um mês.


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