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ENTREVISTA DA 2ª
BRUCE BUENO DE MESQUITA
Aiatolá cairá e Irã vai se tornar ditadura militar
Essa é apenas uma das várias previsões feitas pelo acadêmico americano, conhecido como "o próximo Nostradamus"
A DIFERENÇA é que o professor de política
na Universidade de Nova York e membro
do Hoover Institution de Stanford, na Califórnia, não lida com o sobrenatural nem
nada de outro mundo: usa um algoritmo para computador desenvolvido por ele mesmo a partir da teoria
dos jogos para antecipar ações de países, empresas e
líderes.
Seu índice de acerto varia entre 60% e 90%, segundo
relatório da CIA, maior do que os da própria agência
americana, e seus clientes são serviços de inteligência
de empresas e governos, entre outros.
Para o americano, Dilma Rousseff não será eleita
presidente do Brasil e Barack Obama ganhará seu segundo mandato nos EUA.
SÉRGIO DÁVILA
DE WASHINGTON
Bruce Bueno de Mesquita
usa seu modelo para antecipar
acontecimentos internacionais
desde os anos 1980. Relatório
de funcionário da CIA diz que o
acadêmico acerta mais e com
mais precisão do que a própria
agência, que utilizou seus serviços mais de mil vezes.
Nos últimos tempos, Mesquita -que deve o sobrenome a
um antepassado judeu português- voltou a ganhar evidência pelo lançamento do livro
"The Predictioneer's Game" (O
Jogo do Prognosticador, Random House, 2009) e por ir na
contramão da maioria das análises ao dizer o que antecipa
que acontecerá no Irã. A pedido
da Folha, o americano fez as
seguintes previsões:
FOLHA - O sr. prevê a reeleição de
Barack Obama?
BRUCE BUENO DE MESQUITA - Sim.
Eu votei nele, mas acho que ele
tem sido insuficientemente decisivo, o que me preocupa. Levou muito tempo para decidir
sobre uma política em relação
ao Afeganistão, e não gosto da
que escolheu. Gostei de seu discurso no Cairo (Egito), mas ele
não deu sequência ao que prometeu ali, o que foi frustrante.
Obama não tem força suficiente para fazer o Congresso
aumentar os impostos sobre
combustíveis fósseis; em vez
disso, apostou em Copenhague
e saiu de mãos vazias, exatamente como eu previra em meu
livro, escrito meses antes.
Ele vai conseguir passar algum tipo de reforma de saúde
pública pelo Congresso, embora não tenha mais poder para
dar a forma final à lei.
Mas ele tem a sorte de suceder uma gestão vista como uma
grande falha, então qualquer
coisa que conseguir fazer parecerá melhor do que é.
A economia vem dando sinais de melhora, embora o mérito aqui seja mais de Ben Bernanke, presidente do Fed [banco central americano], do que
dele. Só se ela voltar a cair fortemente ele sairá da Casa Branca em 2013.
Os eleitores não ligam para
política externa, a não ser em
situações catastróficas. No
campo doméstico, vale o chavão: é a economia, estúpido.
No ano da campanha de reeleição, 2012, ele já estará em
boas condições e ficarei chocado caso ele não seja reeleito.
FOLHA - Farei uma série de perguntas sobre política externa para sua
previsão, começando pelo Irã.
MESQUITA - Nos próximos dois
anos, o aiatolá Ali Khamenei se
aposentará, e o governo será cada vez mais dominado pelo comandante da Guarda Revolucionária, Mohammed Ali Jafari, assim como pelo grupo Bonyads, que controla todo o dinheiro do Irã, inclusive dos mulás, para quem investem.
Não são corruptos, são isentos de taxação, são o grupo mais
poderoso hoje. Ambos deverão
evoluir para uma política mais
pragmática, o que quer dizer
que a economia iraniana vai
melhorar e o país vai se tornar
uma ditadura militar, não mais
uma teocracia. Antecipo [o presidente] Mahmoud Ahmadinejad saindo com Khamenei.
FOLHA - Iraque.
MESQUITA - As relações entre
Irã e Iraque nos próximos anos
vão depender da decisão do
presidente Obama de deixar ou
não 50 mil tropas remanescentes no Iraque. Se as retirar, então haverá uma parceria estratégica entre os dois países vizinhos, com o Irã tentando fortalecer o governo xiita iraquiano.
Como Tariq Al Hashimi, vice-presidente iraquiano e líder
do bloco sunita, deve crescer e
começar a ameaçar o atual governo, isso levará a uma intervenção militar iraniana.
Se Obama deixar as tropas,
Hashimi vai ser contido e o governo xiita continuará forte.
FOLHA - O sr. vê novo ataque terrorista em solo americano?
MESQUITA - Da última vez que
analisei essa questão, em 2003,
previ que não haveria um nos
próximos três anos, e não houve. Olhando agora, acho que é
pouco provável.
Os EUA e seus aliados têm
tornado muito mais difícil para
o comando central da Al Qaeda
coordenar ataques. Hoje, o grupo terrorista está mais interessado em questões locais do que
na jihad global.
Um ataque em larga escala
como o 11 de Setembro é improvável, mas pequenas tentativas, mais difíceis de reprimir,
são mais prováveis.
FOLHA - Bin Laden será capturado?
MESQUITA - Ele não é mais tão
importante como pessoa como
era. Antes, era a fonte de dinheiro para a Al Qaeda, e isso
não é mais verdade: ele gastou
tudo o que tinha.
Hoje o dinheiro vem de drogas, sequestros e coisas assim.
Isso o torna menos relevante:
Bin Laden nunca foi um grande
estrategista ou organizador de
ações, era mais a fonte de dinheiro e o o líder carismático.
A Al Qaeda não acabará se ele
for capturado nem está mais
forte porque ele está vivo.
FOLHA - Indo à América Latina,
qual o futuro de Cuba?
MESQUITA - Nada muito dramático acontecerá até que haja
uma sucessão sem os Castros.
As concessões americanas
recentes não têm resultado em
nenhum ganho significativo do
outro lado, como liberdade de
imprensa. Raúl Castro ensaiou
uma certa liberalização econômica no começo, mas isso tem
um motivo.
Nos dois primeiros anos no
poder, ditadores têm uma probabilidade maior de serem derrubados do que líderes eleitos
democraticamente. Então, nesse período, eles têm incentivo e
uma tendência a se mostrar
mais progressistas do que realmente são, até conseguirem o
controle político.
No momento em que isso é
atingido, começam as sanções
mais severas. Esse é o caminho
que Raúl vem seguindo.
FOLHA - Hugo Chávez?
MESQUITA - Ele também segue a
trilha dos ditadores racionais:
aumentou o controle político,
diminuiu a liberdade de imprensa, cometeu erros importantes. Um deles foi convocar
um plebiscito para mudar a
Constituição, por arrogância.
Seu erro foi achar que poderia fazer o que quisesse porque
o povo o adora e o apoia, mas
descobriu que isso não é verdade. Então, agora faz as mudanças sem passar pelo povo.
Outro erro grave foi ter investido todas as fichas em Ahmadinejad. Como expliquei antes, está apostando na pessoa
errada, o que o deixará parecendo estúpido e um pouco
mais marginalizado na comunidade internacional.
FOLHA - Eleições no Brasil?
MESQUITA - Tenho conhecimento limitado da política brasileira, mas acho que Dilma
Rousseff não é a vencedora
mais provável. Não sei quem
será, mas sua posição em algumas questões políticas tendem
a marginalizá-la e complicar
sua candidatura.
Por exemplo, a forma de populismo nacionalista que ela
defende é muito custosa e potencialmente pode comprometer o crescimento da economia.
Os eleitores perceberão isso,
e ela cairá nas pesquisas. Pessoalmente, acho que isso será
bom para o Brasil. O vencedor
não será tão nacionalista e contra investimentos estrangeiros
como ela tem se mostrado.
É a minha visão pouco informada e ligeira sobre o Brasil.
FOLHA - O sr. vê o Brasil consolidando esse novo papel de protagonismo na arena global?
MESQUITA - Se não deixarem a
corrente que eu chamo de populista-nacionalista crescer como cresce com Chávez, Brasil e
México serão os dois países
mais vibrantes e importantes
do hemisfério Ocidental nos
próximos 10 a 15 anos e ambos
se tornarão potências globais
muito importantes.
Sou otimista quanto a isso.
Para provar, tenho investido
em ambos os países.
FOLHA - O que haverá com o Haiti?
MESQUITA - Eu não analisei a situação e odiaria especular num
momento como esse.
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