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"Novo" Paraguai tem mais atritos com Brasil
Com exportações agrícolas em alta, empresários criticam o Mercosul e dizem ter mais vantagens em outros mercados
Enfraquecimento de colorados, há 60 anos poder, abre espaço para novas demandas; agricultura
já supera o contrabando
RAUL JUSTE LORES
ENVIADO ESPECIAL A ASSUNÇÃO
"Preço justo para a energia
elétrica." Com esse lema, uma
campanha exige que se cobre
mais pela energia de Itaipu que
o Paraguai não usa e vende ao
Brasil. Haverá uma manifestação em abril, e o principal orador será o ex-bispo Fernando
Lugo, favorito para vencer as
eleições presidenciais de abril
de 2008. Em entrevista à Folha, o esquerdista Lugo sugeriu
que o preço da energia vendida
ao Brasil deveria subir sete vezes para se fazer justiça.
Até o jornal conservador
"ABC Color", o maior do país,
escreveu em editorial que sentia inveja do "patriotismo" do
presidente boliviano, Evo Morales, por ele cobrar mais do
Brasil pelo seu gás.
As cobranças não terminam
aí. Na semana passada, o presidente da principal associação
de pecuaristas recorreu à Guerra do Paraguai para dizer que a
Tríplice Aliança (de Brasil, Argentina e Uruguai) ainda existia e que o Mercosul não beneficiava o Paraguai.
Também em entrevista à Folha, o vice-presidente, Luis
Castiglioni, o provável candidato governista, defendeu abertamente um acordo comercial e
de investimentos com os Estados Unidos, como o que vem
sendo negociado pelo Uruguai.
Em ano eleitoral, os ataques
ao Brasil devem crescer, mas
não são só retórica de campanha. Para vários especialistas,
um novo Paraguai está tomando forma, na política e na economia. Um Paraguai menos dependente do "imperialismo
brasileiro".
Vendas extra-Mercosul
Até 1998, mais de 80% das
exportações paraguaias eram
compostas pelo contrabando
enviado ao Brasil e Argentina -
conhecido no país pelo eufemismo "reexportações".
As mercadorias eram importadas legalmente pelo Paraguai, principalmente do parceiro Taiwan, e reexportadas ilegalmente aos vizinhos maiores.
Mas, com a desvalorização do
real brasileiro e do peso argentino, a abertura das duas economias e a criação da alíquota comum do Mercosul, o negócio
deixou de ser tão vantajoso.
Apesar da recuperação da venda de eletrônicos, nunca voltou
aos níveis dos anos 90.
Já os produtos genuinamente nacionais, como soja, carne e
laticínios, vivem um inédito
boom. Desde 2002, os nacionais superam as reexportações.
As exportações de soja podem
chegar a US$ 1 bilhão neste ano,
e as de carne vão superar os
US$ 600 milhões.
"As economias não são complementares. O que nós produzimos, os vizinhos também
produzem. Acabamos competindo dentro do Mercosul. Temos a crescer fora, não dentro",
diz o produtor de soja, trigo e
milho Héctor Cristaldo, presidente da Coordenadora Agrícola do Paraguai, que reúne 25
mil produtores.
Apesar das exportações de
produtos nacionais terem praticamente dobrado de 2001 a
2006, as vendas para o Brasil
são as mesmas desde 2001.
Os novos mercados são Leste
Europeu, Rússia, Chile, Europa
e países do Oriente Médio.
"Enfrentamos dificuldades
burocráticas, excesso de impostos e barreiras extratarifárias. Nos últimos três anos, vale
mais a pena vender em outros
lugares", diz Cristaldo.
Free shop regional
Com o amplo know how de
triangulação dos tempos áureos do contrabando, o Paraguai consegue fazer até negócios com a China, com quem
não mantém relações diplomáticas, por conta de uma aliança
antiga com Taiwan, desafeto
dos comunistas.
O país exporta soja para o
Uruguai pelo rio Uruguai. Lá vira "produto uruguaio" e é reexportada para a China.
Para o economista Fernando
Masi, diretor do Centro de
Análise e Difusão da Economia
Paraguaia, apesar de 50% das
exportações "oficialmente" terem como destino o Mercosul,
na verdade apenas 25% do total
fica com o bloco.
"É irônico que aconteça isso
agora, porque o Paraguai era o
mais integrado ao Mercosul
quando o bloco ainda não existia", diz Masi.
Em tempos de economias fechadas e de substituição de importações no Brasil e na Argentina, o país era o distribuidor
free shop da região.
Economia aberta, importava
tudo que inexistia nos vizinhos
e os reexportava. Com a crise
desse modelo, só resta ao Paraguai mudar.
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