São Paulo, quarta-feira, 25 de abril de 2001

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AIDS

Relatórios de farmacêuticas mostram que publicidade pesa mais que pesquisas no gasto das empresas

Polêmica revela custo real dos remédios

MELODY PETERSEN
do "THE NEW YORK TIMES"

Uma dezena de pequenos laboratórios estrangeiros, trabalhando na sombra para fazer versões genéricas de remédios patenteados, está mostrando ao mundo como o custo de produção desses medicamentos é baixo.
Esses laboratórios de Índia, China e Coréia do Sul produzem tanto os ingredientes ativos para a fabricação de medicamentos contra a Aids como o produto final.
Os genéricos são vendidos por uma fração do preço dos remédios de marca a países como Brasil, Índia e Argentina, que estão ignorando as patentes das quais as grandes farmacêuticas dependem para manter o monopólio e determinar os preços no mercado internacional.
A GlaxoSmithKline, por exemplo, a maior fabricante do mundo de medicamentos contra a Aids, vende Combivir por cerca de US$ 7.000 por paciente ao ano nos EUA. Os ingredientes ativos para o remédio custam US$ 240 no mercado internacional de genéricos, e a Cipla, uma empresa da Índia, está oferecendo uma versão do Combivir por US$ 275.
Os pequenos laboratórios vêm, há vários anos, produzindo em silêncio genéricos para o tratamento de câncer, colesterol alto e outras doenças. Mas, com o acirramento da crise da Aids na África, alguns deles alardearam suas atividades ao oferecer remédios mais baratos contra a doença.
Na tentativa de defender o monopólio, as grandes farmacêuticas ofereceram descontos aos países em desenvolvimento, mas os preços continuaram altos em comparação aos genéricos.
A Bristol-Myers Squibb vende o Zerit nos EUA por US$ 3.400 por paciente ao ano. No mês passado, a empresa anunciou que venderia o remédio na África por US$ 55 por paciente ao ano, um preço, segundo ela, inferior ao custo. Mas a Cipla está oferecendo o mesmo medicamento por US$ 40.
As grandes farmacêuticas relutam em discutir seus gastos. Mas, em entrevistas, elas dizem que precisam cobrar mais por causa das pesquisas. A GlaxoSmithKline investiu US$ 4 bilhões em pesquisas no ano passado e, desde 1995, lançou cinco remédios contra a Aids.
As pesquisas representam, no entanto, apenas uma parte dos gastos das empresas. Num recente relatório para investidores, a GlaxoSmithKline disse ter gasto 37% de sua receita em marketing e administração e apenas 14% em pesquisa. O lucro foi de 29%.
A Bristol-Myers Squibb gastou no ano passado 30% de sua receita em publicidade, marketing e administração e 10% em pesquisa. O lucro foi de 26%.
As empresas acusam os pequenos laboratórios de copiarem ilegalmente remédios que consumiram vários anos e milhões de dólares para serem criados.
Segundo a Associação da Indústria Farmacêutica dos EUA, o desenvolvimento de um novo remédio custa cerca US$ 500 milhões. Mas os defensores dos pacientes contestam esse valor, dizendo que há medicamentos contra a Aids que foram desenvolvidos com ajuda do governo norte-americano.
A indústria diz, no entanto, que paga royalties a outras empresas e a várias universidades que ajudaram na pesquisa. Há, também, despesas administrativas como o salário dos executivos, custos legais e gastos com publicidade e lobby.
Analistas de Wall Street afirmam que os genéricos contra a Aids não terão impacto imediato no desemprenho das empresas, que ganham muito pouco nos países pobres, onde não há dinheiro para medicamentos. Segundo eles, mais de 90% dos US$ 3,8 bilhões obtidos com a venda de remédios contra a Aids no ano passado vieram de apenas cinco países: EUA, França, Itália, Alemanha e Reino Unido.
Além disso os remédios contra a Aids representam uma fração das vendas. Apenas 6% da receita da GlaxoSmithKline, a maior fabricante de remédios anti-HIV, vêm desses medicamentos.
A grande ameaça para a indústria é a possibilidade de os pequenos laboratório começarem a vender genéricos de outros medicamentos. Se o mercado para genéricos crescer, os laboratórios estrangeiros não hesitarão em expandir seus negócios.
"Patentes são para recompensar o inventor e não para lhe dar o monopólio", disse Luciano Calenti, da canadense ACIC Pharmaceuticals, que vende ao Brasil ingredientes ativos para a produção de remédios contra a Aids.
O Brasil deu um grande impulso à ACIC e a outros laboratórios estrangeiros quando começou a comprar ingredientes ativos, em 1998, para a produção de genéricos contra a Aids.
"As compras brasileiras têm sido tão grandes que derrubaram os preços no mercado global", disse James Love, diretor do Consumer Project on Technology, uma ONG de Washington que monitora os preços no mercado internacional.



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