São Paulo, sexta-feira, 25 de abril de 2008

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Morales congela repasses a Santa Cruz

La Paz acusa oposição, que governa departamento, de usar dinheiro público para organizar referendo sobre autonomia regional

Oposicionistas realizarão referendo sobre autonomia regional em nove dias; presidente pede a militares defesa da unidade do país

FABIANO MAISONNAVE
DE CARACAS

O governo boliviano anunciou ontem o congelamento do repasse de recursos ao departamento de Santa Cruz, alegando que os gastos deixaram de ser contabilizados pela administração regional há duas semanas. A decisão aumenta o confronto entre o presidente Evo Morales e a oposição a apenas nove dias da realização de um referendo regional não reconhecido por La Paz.
Segundo explicou o ministro boliviano da Fazenda, Luis Arce, a decisão foi tomada porque o departamento de Santa Cruz se desligou há duas semanas do Sigma, um sistema nacional computadorizado para registro de gastos públicos. Arce afirmou que, com a medida, Santa Cruz deixará de receber semanalmente 100 milhões de bolivianos (cerca de R$ 22,7 milhões), mas prometeu retomar os repasses caso o governo departamental volte ao Sigma e após uma auditoria.
"Os funcionários do governo departamental estão realizando operações manuais que não são registradas no sistema e que põem em perigo a transparência na administração dos recursos", disse Arce, em entrevista coletiva.
Morales acusa Santa Cruz de usar dinheiro público para preparar o referendo de 4 de maio sobre a adoção de um "estatuto autonômico" que amplia os poderes do governo departamental. A consulta é considerada ilegal pela Justiça e pelo governo federal, que acusa a oposição de fomentar o separatismo.
O estatuto autonômico, que dá ao governo departamental poderes até para legislar sobre política alfandegária, foi uma resposta da oposição à Constituição aprovada numa Assembléia Constituinte sem a presença da oposição. Para entrar em vigor, a Carta precisa ser ratificada num referendo nacional, ainda sem data marcada.
Logo após o anúncio, o secretário-geral de Santa Cruz, Roly Aguilera, negou qualquer irregularidade no envio de informações e disse que a medida é uma tentativa de "sabotar" o referendo regional. "Nada nem ninguém vai deter esse processo. Nenhum (...) processo totalitário vai paralisar toda uma população", disse Aguilera. O representante do governo de Santa Cruz não soube, porém, explicar se o departamento havia deixado de usar o Sigma.

Chamado
Já Morales aproveitou uma cerimônia com a Marinha para exortar os militares a defenderem a unidade do país. "Acima de qualquer reivindicação setorial, regional, pessoal, vem primeiro a unidade do país. Faço um chamado a todo o povo, inclusive às Forças Armadas, para defender a unidade do país."
Ontem à tarde, Morales esteve na cidade de Santa Cruz, onde visitou o Plan 3000, imensa zona pobre formada por migrantes do altiplano e reduto de simpatizantes do partido governista MAS (Movimento ao Socialismo).
Em La Paz, o ministro de Governo, Alfredo Rada, chamou de "farsa" um comunicado da Embaixada dos EUA na Bolívia no qual a representação diplomática nega que esteja apoiando o referendo autonômico. "É claro que [os EUA] têm uma posição, e seria bom que o embaixador [Philip Goldberg] fosse sincero", afirmou Rada, segundo a agência oficial ABI.
Anteontem, ao lado de Morales, o presidente venezuelano, Hugo Chávez, acusou Washington de querer transformar a Bolívia num novo Kosovo.

OEA
Em reunião extraordinária em Washington, o Conselho Permanente da OEA (Organização dos Estados Americanos) exortou ontem o governo e a oposição "a iniciarem imediatamente o diálogo na Bolívia, para evitar situações de risco que comprometam a vigência da democracia nessa nação sul-americana". O conselho se reúne novamente amanhã para ouvir o chanceler boliviano, David Choquehuanca.
Recém-chegado da Bolívia, o secretário de Assuntos Políticos da OEA, Dante Caputo, disse, em informe sobre a situação do país andino, que, à medida que se aproxima o 4 de maio, aumentam os riscos de que "a tensão e as diferenças possam se converter em enfrentamento e em violência".


Com agências internacionais


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