São Paulo, quarta, 25 de junho de 1997.



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"Não ganho nada com isso"

de Paris

Leia a seguir trechos da entrevista concedida ontem à Folha por Antonio Negri, também conhecido como Toni Negri, em Paris. (MA)

Folha - Por que voltar à Itália?
Antonio Negri -
É um ato político e pessoal. Minha intenção é resolver um problema pendente desde os anos 70. Há 200 pessoas que atuaram na luta armada que permanecem presas, sem contar as que estão no exílio.
Folha - De que maneira o sr. acredita que pode colaborar?
Negri -
Minha decisão é gratuita. Eu não ganho nada com isso. Mas voltando para lá eu vou chamar a atenção para um problema que andava meio esquecido. É preciso colocar um fim aos anos de chumbo. Eu sei que minha atitude vai provocar um escândalo.
Folha - E o lado pessoal?
Negri -
Eu poderia ficar em Paris, onde vivo bem e sou reconhecido. No ano que vem, completaria 15 anos na França e poderia obter a cidadania. Mas eu quero participar da vida política do meu país. A Itália está vivendo um momento muito interessante, de renovação profunda. Eu também quero pisar na terra escura do vale do (rio) Pó, voltar a passar por aquelas cidadezinhas que guardam histórias de civilizações muito antigas e incríveis.
Folha - O sr. sabe o que o aguarda quando desembarcar na Itália?
Negri -
Sei que vou ser preso assim que descer do avião. Vai ser sofrido, difícil, mas foi uma decisão pensada. Tenho vários advogados acompanhando o meu caso. Acredito que devo ficar preso uns dois anos e meio até conseguir resolver minha situação. Mas isso também vai depender da pressão exercida dentro da própria Itália e de organizações internacionais.
Folha - O sr. é acusado de quê?
Negri -
Minhas acusações foram mudadas duas vezes. Na primeira, fui condenado a 30 anos de prisão e depois a 12 anos. Eles me acusaram de insurreição armada. Depois, disseram que eu era o líder das Brigadas Vermelhas, da Autonomia Operária e de ter articulado atentados em Milão, Pádua e Turim no final dos anos 70.
Folha - Qual é verdadeira?
Negri -
Nenhuma. Eu era um professor universitário bem relacionado e fui um bode expiatório.
Folha - O sr. não acha que sua obra, radical, pode ter influenciado os grupos de esquerda?
Negri -
A intelectualidade tem de atuar como uma espécie de animadora, de militante. Não no sentido do "intelectual missionário" que existiu até os anos 60 e que transformava sua obra em uma visão do futuro. O intelectual tem de mostrar às pessoas seu lugar na sociedade e o que podem fazer.
Folha - O sr. escreverá na prisão?
Negri -
Não sei que condições vou encontrar, mas se puder, vou fazê-lo. Meu livro mais bonito (sobre o filósofo Espinoza) foi escrito enquanto eu estava preso.




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