São Paulo, sábado, 25 de setembro de 2004

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ELEIÇÃO NOS EUA

Pesquisas mostram que eleitorado feminino, tradicionalmente democrata, agora está mais disposto a votar Bush

Kerry luta para se recuperar entre eleitoras

Luke Frazza - 20.set.2004/Associated Press
ohn Kerry, entre a mulher, Teresa (esq.), e a atriz Uma Thurman



A questão apresentada por Bush, sobre qual candidato é melhor para proteger os EUA de terroristas, se tornou especialmente importante para as mulheres


KATHARINE Q. SEELYE
DO "NEW YORK TIMES"

Não foi por acaso que o senador John Kerry apareceu na terça-feira passada no programa "Live With Regis and Kelly" e recordou a época em que era promotor jovem e representou uma vítima de estupro. Nem foi por acaso que, em seguida, voou de Nova York a Jacksonville, Flórida, para falar de suas propostas para a saúde.
Essas ocasiões fazem parte de uma tentativa enérgica feita pela campanha Kerry de chamar de volta uma parte do eleitorado que o Partido Democrata considera ser seu por direito: o feminino.
Nas últimas semanas, a campanha de Kerry vem analisando nervosamente as pesquisas que indicam perda de intenção de voto para o senador entre as mulheres, uma das fatias do eleitorado em que o Partido Democrata mais confia. Na sondagem "New York Times"/CBS, da semana passada, 48% das mulheres registradas para votar disseram que votarão em Bush e 43%, em Kerry.
Em 2000, 54% das mulheres votaram no candidato democrata, Al Gore, e 43% em Bush.
Para analistas democratas e republicanos, a razão dessa mudança do eleitorado feminino é que uma questão que Bush a princípio apresentava como parte de uma mensagem maior -qual candidato teria melhores condições de proteger os EUA de terroristas- se tornou especialmente importante para as mulheres. Vários deles disseram que a confluência de dois acontecimentos -uma convenção carregada de cenas do 11 de Setembro e o ataque terrorista contra crianças na Rússia- modificou a dinâmica eleitoral neste grupo crítico de maneira a criar um novo desafio para Kerry.
Mark Mellman, um dos responsáveis pelas pesquisas da campanha Kerry, procurou minimizar o nervosismo da campanha do senador em relação ao eleitorado feminino, dizendo: "Não defino isto como problema, mas como oportunidade". Ele observou que, na semana passada, um grupo de viúvas do 11 de Setembro manifestou seu apoio a Kerry e disse que isso é prova de que as mulheres acham que o candidato democrata ""está mais bem capacitado para proteger o país".
Assim como Kerry está tentando reconquistar o apoio das mulheres, Bush está tentando fazer o que Karl Rove, seu principal assessor político, prometeu fazer este ano: desafiar os democratas no seu território. O presidente freqüentemente fala ao público sobre as novas liberdades desfrutadas pelas mulheres afegãs depois que os EUA derrubaram o Taleban. Seus comícios com freqüência ostentam cartazes dizendo "W representa mulheres [women]".
Na terça-feira, em discurso que proferiu nas Nações Unidas, George W. Bush pareceu antenado com essa preocupação quando mencionou o ataque terrorista na Rússia. Ele descreveu uma mulher que chorou o ataque em Beslan, dizendo que "as crianças russas nada fizeram para merecer tamanho sofrimento, susto e morte".
Também no mês passado, Kerry sofreu os efeitos, nas sondagens, dos ataques do grupo Swif Boat Veteranos pela Verdade, que contestou sua atuação no Vietnã e destacou seu ativismo contra a guerra nos anos 1970. Um estrategista democrata disse que o fato de Kerry não ter combatido o ataque alimentou a percepção, especialmente entre as mulheres casadas, de que ele não lutaria por elas nem por seus filhos. E, disse ele, essa é uma razão pela qual Kerry precisa reconstruir sua imagem, dando destaque à força.
Embora Kerry tenha de fato perdido apoio entre as mulheres, algumas pesquisas o indicam ainda ligeiramente à frente de Bush. Diane Feldman, da campanha de Kerry, disse não acreditar que o senador esteja perdendo espaço. Afirmou que as sondagens feitas pela campanha mostram Kerry na frente entre as eleitoras.
Ela não revelou os números da campanha, mas disse que eles indicam que, com relação ao eleitorado feminino, Kerry está ""abaixo do que esperamos no dia da eleição. Ainda temos lugar para crescer". Para ela, parte do problema é que, tradicionalmente, as mulheres demoram a decidir-se.
Kerry já ganhou o apoio oficial de meia dúzia de viúvas de 11 de Setembro e, em vários Estados onde a disputa está acirrada, sua campanha vem levando aos comícios um grupo de "mães militares" cujos filhos estão no Iraque.
Segundo Celinda Lake, uma pesquisadora democrata especializada em eleitoras, "as mulheres demonstram muito mais preocupação do que os homens com a possibilidade de um ataque ocorrer em sua cidade". Ela disse que esse sentimento de medo é decorrência natural do 11 de Setembro e foi reforçado, no início do mês, quando extremistas tomaram uma escola numa região distante da Rússia e mataram mais de 300 pessoas, metade das quais crianças. ""As imagens da Rússia foram especialmente fortes para as mães", disse Lake, para quem essas mulheres ficaram alarmadas em ver crianças sendo mortas numa escola, numa cidade pequena e desconhecida. "Isso é muito, muito assustador para mulheres."
Segundo a pesquisa "Times"/ CBS, as mulheres vêem tanto Kerry quanto Bush como sendo capazes de tomar as decisões corretas para proteger o país de outro ataque terrorista, mas elas expressaram mais confiança em Bush. Das entrevistadas, 48% disseram ter muita confiança em Bush e 25%, alguma confiança; 29% disseram ter muita confiança em Kerry, e 35%, alguma confiança.
Há uma desigualdade tradicional entre mulheres casadas e solteiras: as casadas votam mais nos candidatos republicanos, e as solteiras, nos democratas. Neste ano, segundo Lake, o desnível entre os votos prováveis de casados e solteiros está maior do que nunca, em grande medida devido ao surgimento de algo que os analistas batizaram de "mães segurança", que tendem a ser mulheres brancas e casadas, com filhos, que temem outro ataque nos EUA.
Ainda segundo a "Times"/CBS, 59% das casadas registradas para votar disseram que votarão em Bush e 32%, em Kerry.
Andrew Kohut, diretor do Pew Research Center, disse que neste ano as mulheres estão sofrendo pressões contrárias: elas sentem mais confiança em Bush no tocante ao terrorismo, mas estão céticas quanto a suas chances de lidar melhor com a economia.
Kohut disse que, em 2000, os homens votaram em Bush na mesma proporção em que as mulheres votaram em Gore. "Agora", disse ele, "Bush está com uma posição mais sólida entre os homens do que Kerry entre as mulheres, e, se Kerry não conseguir equiparar-se a essa margem entre as mulheres, ele vai perder."
Lake disse que as mulheres solteiras ainda preferem Kerry a Bush, em grande medida porque se preocupam mais com a economia do que com o terrorismo.
Ed Goeas, da campanha republicana, disse que, quando se perguntou aos eleitores "Você se preocupa com a possibilidade de virar alvo de um ataque terrorista?", os homens nas cidades grandes, de modo geral, disseram que sim, mas os homens de outras regiões falaram que não. Já as mulheres de todas as regiões responderam que se preocupam, sim.

Tradução de Clara Allain


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