São Paulo, sexta-feira, 25 de setembro de 2009

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Golpistas acusam Brasil de intromissão

Governo Micheletti afirma em nota que Brasília arquitetou volta de Zelaya e deve se responsabilizar por sua segurança

Presidente deposto anuncia que deu início a diálogo com governo golpista, até aqui sem sucesso; Ministério Público confirma 2 mortos


Henry Romero/Reuters
Apoiadores do governo golpista chefiado por Roberto Micheletti expõem cartaz comos dizeres: "De Honduras para o mundo: nós não queremos Zelaya de volta"

FABIANO MAISONNAVE
ENVIADO ESPECIAL A TEGUCIGALPA

Em duro comunicado, o governo golpista hondurenho acusou ontem o presidente Luiz Inácio Lula da Silva de intromissão em assuntos internos de Honduras e afirmou que o Brasil é o responsável pela segurança do mandatário deposto, Manuel Zelaya, abrigado desde segunda-feira na embaixada do país em Tegucigalpa.
A nota, emitida pela Chancelaria do governo golpista, acusou Lula e o chanceler Celso Amorim de mentirem ao dizerem que desconheciam o plano de Zelaya de ir à embaixada.
"Essas afirmações foram categoricamente desmentidas pelo seu principal beneficiário e protegido, o senhor José Manuel Zelaya Rosales, que ontem [anteontem] declarou desde as dependências do Brasil em Tegucigalpa que "foi decisão pessoal e que foi consultada com o presidente Lula e o chanceler Celso Amorim'", diz a nota.
O comunicado diz que, como a presença do presidente deposto "é um ato promovido e consentido pelo governo do Brasil, recai sobre este a responsabilidade pela vida e pela segurança do senhor Zelaya e pelos danos à integridade física das pessoas e das propriedades por permitir que essa representação se converta numa plataforma de propaganda política e concentração de pessoas armadas que ameaçam a paz e a ordem pública de Honduras".
Zelaya, em entrevista à TV CNN, negou que tenha recebido apoio de qualquer país para o seu regresso, "apenas de hondurenhos". Ele disse ter recebido ontem um representante do governo interino, mas não disse o nome e falou que não houve avanços no diálogo.
Como já ocorrera na véspera, o isolamento da embaixada brasileira foi aumentado ontem. O perímetro de segurança montado por dezenas de militares, antes restrito à quadra onde está a representação, foi ampliado em mais uma quadra. Até o início da tarde, só havia sido autorizada a entrada com uma camionete de alimentos e de uma equipe da TV CNN.
Segundo o encarregado de negócios da embaixada, Francisco Catunda, há comida suficiente, mas faltam itens como roupas, sabonete e toalhas para as cerca de 60 pessoas que dormem no prédio, entre os quais simpatizantes de Zelaya, funcionários da representação e fotógrafos. O diplomata disse que há três dias dorme no sofá.
A pedido do Brasil, o Conselho de Segurança da ONU realiza hoje uma reunião extraordinária para discutir o cerco à embaixada em Honduras.
À noite, o governo golpista decretou novamente o toque de recolher entre as 19h de ontem e as 5h de hoje, mas durante o dia o clima foi de normalidade. Nos supermercados, não foram registradas as filas das vésperas, e a maior parte dos produtos esgotados devido à alta procura podia ser encontrada.
Os aeroportos voltaram a operar normalmente e já recebem voos internacionais, depois de terem permanecido fechados desde segunda à tarde.
De acordo com um assessor de Micheletti, que falou sob anonimato, o objetivo é normalizar o país o mais rapidamente possível para viabilizar a campanha presidencial para a eleição de 29 de novembro. A aposta do governo interino, diz ele, é que um alto comparecimento nesse dia fará com que ao menos parte da comunidade internacional aceite o resultado.
A maior manifestação dos dias foi dos "camisas brancas", como são chamados os apoiadores de Micheletti. Várias centenas deles protestaram diante da representação da ONU contra Zelaya e o seu principal aliado internacional, o presidente venezuelano, Hugo Chávez. Ao presidente brasileiro gritavam: "Lula, Lula, leve embora essa mula [Zelaya]".
Apoiadores de Zelaya fizeram protestos em várias partes da capital. Em ao menos um local, houve queima de pneus para bloquear a rua, mas não houve choques com a polícia, diferentemente dos três dias anteriores -o Ministério Público hondurenho anunciou ontem que os conflitos pós-volta de Zelaya resultaram em duas mortes no país desde segunda.


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