São Paulo, sábado, 26 de abril de 2008

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China aceita abrir diálogo com enviados do dalai-lama

Medida atende a pressão internacional; analistas, porém, não esperam avanços

Até agora, chineses vinham se recusando a conversar com líder budista, em quem põem a culpa por protestos no Tibete no mês passado

Gopal Chitrakar/Reuters
Tibetanos em Katmandu (Nepal) comemoram aniversário do panchen-lama e exibem cartazes pedindo que o Tibete seja salvo

JIM YARDLEY
DO "NEW YORK TIMES", EM PEQUIM

O governo chinês anunciou ontem que receberia enviados do dalai-lama, numa virada inesperada que surge enquanto a inquietação dos tibetanos ameaça causar problemas durante a Olimpíada de Pequim.
O anúncio, feito por meio da agência oficial de notícias do país, oferece poucos detalhes sobre as conversações, mas informa que elas começariam "nos dias vindouros". A decisão surgiu depois que funcionários do governo chinês decidiram agir para reprimir a ira nacionalista deflagrada pela crise do Tibete e pelos protestos no percurso da tocha olímpica.
"Diante de repetidos pedidos, da parte do dalai-lama, por uma retomada das conversações, o departamento relevante do governo central fará contato e consultará o representante privado do dalai-lama nos próximos dias", teria dito um funcionário chinês não identificado à agência Xinhua.
O dalai-lama apelou repetidamente por uma retomada nas negociações com funcionários chineses e na semana passada enviou uma carta ao presidente da China, Hu Jintao. Ontem, seu porta-voz, Tenzin Taklha, disse que "Sua Santidade tem um compromisso com o diálogo, e por isso acolhemos positivamente essa notícia".
O porta-voz acrescentou que o dalai-lama ainda não havia recebido uma comunicação oficial da China. "Temos de observar quando a oferta chegará oficialmente", disse Taklha, de Dharamsala, Índia, a sede do governo tibetano no exílio. "Temos de estudar as condições que eles propõem."
Funcionários chineses vinham havia semanas criticando fortemente o dalai-lama, atribuindo a ele a culpa pelos violentos protestos tibetanos que irromperam em 14 de março em Lhasa e se espalharam pelas demais regiões tibetanas, no oeste da China. O dalai-lama nega qualquer envolvimento com as manifestações.
O momento do anúncio chinês sugere que os líderes do partido esperam atenuar as críticas internacionais que vêm crescendo intensamente desde que começaram os protestos tibetanos. Diversos líderes europeus anunciaram que não comparecerão à cerimônia de abertura da Olimpíada.

Avanço improvável
Shi Yinhong, professor de relações internacionais na Universidade Popular de Pequim, considera improvável que as conversações resultem em avanços. "Duvido que qualquer das partes deseje alterar sua posição fundamental. Se houver diálogo, será apenas conversa ociosa. Talvez as duas partes desejem apenas impressionar as audiências ocidentais", disse.
O dalai-lama tem falado em "autonomia genuína" no seio do Estado chinês para uma entidade que ele descreve como "Grande Tibete", que incluiria a atual Região Autônoma do Tibete bem como áreas tibetanas em Províncias chinesas vizinhas. No passado, o governo chinês sempre resistiu a discutir o status do Tibete e se limitou a negociar a possibilidade de retorno do dalai-lama.
"Não acredito que eles estejam dispostos a fazer grandes concessões sobre questões concretas. O governo chinês jamais admitiu que haja algo a negociar no que tange ao Tibete", afirma o acadêmico de Pequim Wang Lixiong.
A China há muito condena o dalai-lama como "promotor da cisão", interessado realmente na independência do Tibete.
"Espera-se que, por meio de contatos e consultas, o lado do dalai-lama tome medidas confiáveis para deter as atividades cujo objetivo é cindir a China, e que detenha os complôs e a incitação à violência, bem como deixe de prejudicar e sabotar os Jogos Olímpicos de Pequim, a fim de criar condições para as negociações", disse o funcionário chinês não identificado no anúncio oficial de ontem.
Samdhong Lobsang Tenzin Rinpoche, primeiro-ministro do governo tibetano no exílio, denunciou as condições como "absolutamente irrelevantes e desprovidas de qualquer base".
"Sua Santidade não é a pessoa que instigou ou incitou o levante", disse Rinpoche em entrevista por telefone, de Dharamsala. "Sua Santidade não quer a separação, e desde o começo apoiou os Jogos Olímpicos. O que quer que eles tenham dito é pura imaginação, e não merece comentário."


Tradução de PAULO MIGLIACCI

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