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100 DIAS DE OBAMA
Barulho opositor não se traduz em proposta
Desarticulado, Partido Republicano deixa críticas mais estridentes para mídia e fracassa em oferecer alternativa ao governo democrata
Orçamento é alvo maior, mas discurso não conquista independentes e indecisos; supermaioria e apelo pop do presidente dificultam tarefa
ANDREA MURTA
DE NOVA YORK
A atuação do Partido Republicano nos primeiros cem dias
do novo governo mostrou que
não será fácil fazer oposição à
azeitada máquina do presidente Barack Obama. Não houve
discurso forte com alternativas
às propostas oficiais: como resultado, ocuparam espaço vozes mais conservadoras que, se
fazem barulho na mídia, têm alcance político limitado.
Na hora da contrariedade,
não faltou energia. Os republicanos bateram pesadamente
no Orçamento inchado de cerca de US$ 3,6 trilhões que Obama apresentou; criticaram resgates de bancos (iniciados convenientemente no governo de
George W. Bush); acusaram
Obama de leniência com bônus
de executivos; despedaçaram
os planos do secretário do Tesouro, Timothy Geithner, para
o sistema financeiro; e chiaram
contra tudo mais que cheirasse
a "grande governo".
Mas, para Michael Barone,
historiador e analista do direitista American Enterprise Institute, a grita não disfarçou a
falta de propostas melhores.
"Os republicanos foram bons
em destacar partes pouco atrativas do pacote de estímulo
econômico [de Obama, de US$
787 bilhões] e mostraram que o
Orçamento vai aumentar terrivelmente o tamanho do governo e a dívida nacional", disse à
Folha. "Mas não puderam oferecer programas alternativos
nem uma direção para o país."
Nas poucas tentativas de traçar rotas novas, como na apresentação de um Orçamento alternativo, os republicanos não
tiveram poder suficiente para
forçar concessões. Logo foram
tachados de "o partido do não".
Um fator que atrapalha é a
falta de uma liderança clara da
oposição oficial. O presidente
do Comitê Nacional Republicano (líder da burocracia partidária), Michael Steele, tem pouca
influência na opinião pública.
John McCain, mais poderoso,
ainda é o "perdedor" da corrida
presidencial de 2008. Sua ex-colega de chapa, Sarah Palin,
tem uma base fiel, mas restrita.
E líderes no Congresso podem fazer pouco em um Legislativo dominado pelos democratas. Na Câmara, não é preciso nem sequer um republicano
para passar leis; no Senado,
com apenas três republicanos
centristas os governistas têm
maioria suficiente para aprovar
propostas rapidamente.
Além disso, os republicanos
hoje no Congresso são mais
conservadores do que no passado, o que tem apelo para uma
fatia menor do público.
"Até agora, ofereceram em
geral oposição ideologicamente rígida a Obama", disse à Folha Clyde Wilcox, professor de
governo da Universidade Georgetown. "No passado, partidos
conseguiram se recuperar rapidamente de derrotas eleitorais.
Mas isso acontece quando eles
se movem para o centro, não
quando abraçam tendências
ideológicas."
Para Alexander Keyssar, analista político da Universidade
Harvard, o excesso de conservadorismo fez com que cometessem um erro estratégico, o
de se opor totalmente ao aumento dos gastos. "Não era tão
difícil se opor a Obama, porque
os gastos realmente serão problemáticos para os Estados no
futuro. Mas deviam ter dito que
a solução era ter gastos diferentes. Agora só lhes resta fingir
que a crise não existe e que o
mercado funciona."
Novos líderes
Os próprios republicanos sabem do pântano em que se envolveram. Tim Pawlenty, governador de Minnesota e personagem em ascensão no partido, afirmou ao "New York Times" que "a estratégia não pode ser apenas a de encontrar
defeitos em Obama". "Precisamos ter ideias próprias. O partido tem sido OK, mas não ótimo, na tarefa de responder ao
presidente."
Isso não quer dizer que a direita tenha ficado órfã nesses
primeiros meses. Eleitores anti-Obama encontraram seus
pais adotivos em figuras como
o radialista Rush Limbaugh, os
apresentadores da Fox News
Sean Hannity e Glenn Beck e
até no ex-vice-presidente Dick
Cheney.
Este último se afastou da tradição washingtoniana que dizia
que presidentes e ex-presidentes basicamente saíam das vistas do público ao fim dos mandatos. Usou uma série de entrevistas para dar início a uma
campanha de proteção de seu
legado e, no processo, se tornou
sério crítico de Obama, principalmente nas áreas de política
externa e defesa.
Mas o mais estridente é Limbaugh, que chegou a afirmar a
sua audiência de cerca de 14 milhões de ouvintes semanais que
"espera que Obama fracasse".
Seu impacto cresceu tanto que
o próprio Michael Steele teve
de se desculpar em março por
dizer que o radialista "é do ramo do entretenimento".
"[Hannity e Limbaugh] articulam ideias conservadoras e
ajudam a motivar muitos republicanos convictos", diz Barone. "Mas não apelam a independentes nem a indecisos."
Por mérito próprio ou não,
uma coisa a oposição conseguiu. Segundo pesquisa deste
mês do Instituto Pew, Obama
tem aprovação bastante baixa
entre os republicanos -apenas
27%- contra 88% de aprovação entre democratas. Esse resultado o torna o presidente
mais polarizador das últimas
quatro décadas.
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