São Paulo, domingo, 26 de junho de 2011

Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

Vizinhos reagem a Brasil "expansionista"

Embora "consenso de Brasília" seja modelo, empresas brasileiras enfrentam desconfiança em países da América Latina

Argentina e Peru já suspenderam projetos; para analistas, investir em cooperação técnica amenizaria hostilidade


PATRÍCIA CAMPOS MELLO
DE SÃO PAULO
FLÁVIA MARREIRO
DE CARACAS
LUCAS FERRAZ DE BUENOS AIRES

A expansão da influência do Brasil começa a gerar, segundo analistas, um sentimento antibrasileiro na América do Sul. Ao mesmo tempo em que o "consenso de Brasília" é um modelo de sucesso econômico que a região quer emular, a crescente presença de empresas brasileiras nas nações vizinhas desperta desconfiança.
O governo da província argentina de Mendoza sustou um projeto de exploração de potássio da Vale (investimento de R$ 8 bilhões) e acusa a mineradora de não cumprir acordo para usar fornecedores e mão de obra local.
No Peru, foi cancelada a licença para a construção da hidrelétrica de Inambari, a maior do país, a ser tocada por OAS, Furnas e Eletrobras. A obra estava estimada em US$ 4,9 bilhões. A concessão será submetida a consulta popular, o que pode acontecer com outros investimentos brasileiros no país.
O presidente eleito do Peru, Ollanta Humala, disse à Folha em abril não querer "repetir com o Brasil o ditado que diz que a desgraça do México é estar tão longe de Deus e tão perto dos EUA".
Para Matias Spektor, coordenador do Centro de Relações Internacionais da FGV, "há uma percepção de que o Brasil em ascensão vai se comportar do mesmo modo que as potências coloniais tradicionais, como EUA e Espanha. Esses países querem, sim, receber investimentos do Brasil, mas coibindo abusos".
O especialista diz que o Brasil terá de ser mais cuidadoso para administrar as reações a sua expansão. Investir em cooperação técnica é essencial, acredita. Spektor cita programas de bolsas de estudos, cooperação em programas como Bolsa Família e combate ao crime.
O modelo é similar ao que a China usa em sua vizinhança, com o ensino de sua língua e cultura ""mas diferente da expansão na África e América Latina, baseada em trocar crédito e investimentos por matérias-primas.

COOPERAÇÃO SUL-SUL
O governo brasileiro quer convencer os vizinhos de que a cooperação "sul-sul" é para valer. Ou seja: as iniciativas de compartilhamento tecnológico não são medidas para vencer resistências, mas passos de uma política de "desenvolvimento comum".
Pedro Barros, titular da missão do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) na Venezuela, defende a unificação de cadeias produtivas, como Brasil e Argentina fizeram no setor automobilístico. Para o consultor Ricardo Sennes, apesar do discurso de cooperação, o país "transborda sua economia de forma não organizada".
Segundo ele, como muitas vezes as empresas se expandem com ajuda do BNDES, ou são investimentos da Eletrobras e Petrobras, braços do Estado, isso gera resistências. Como disse o presidente da União Industrial Argentina, Jose Inacio de Mendiguren, "vou parar de defender as empresas argentinas quando o país tiver seu BNDES".


Próximo Texto: Rubens Ricupero: Suicídio da agricultura
Índice | Comunicar Erros



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.