São Paulo, domingo, 26 de julho de 2009

Próximo Texto | Índice

Zelaya aliena sua frágil base em Washington

Tentativa de retorno a Honduras irrita Departamento de Estado, que já vinha oferecendo apoio restrito a presidente deposto

Ação, que foi definida pela secretária Hillary Clinton como "temerária", dá força aos críticos de Zelaya e a partidários dos golpistas


Esteban Felix/Associated Press
Zelaya posa com placa de "bem-vindos a Honduras" no pouco
tempo em que passou do outro lado da fronteira com a Nicarágua


SÉRGIO DÁVILA
DE WASHINGTON

Ao insistir na ação midiática que foi a tentativa de entrar por terra em Honduras na sexta, o presidente deposto Manuel Zelaya irritou tanto o secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), José Miguel Insulza, como o mediador da crise hondurenha, o presidente costa-riquenho Óscar Arias, e o Departamento de Estado norte-americano.
O último, no entanto, foi o único a vir a público denunciar o blefe de Zelaya. Tão logo ficou claro que o hondurenho levaria adiante seu plano, o porta-voz da Chancelaria americana disse que o líder deposto havia marcado reunião com diplomatas americanos em Washington para depois de amanhã -a declaração implicava que o ato de anteontem não era para valer.
Na sequência, Hillary Clinton soltou suas palavras mais duras até agora em relação ao presidente deposto. A secretária de Estado chamou a tentativa de volta de "temerária". Pois é a Chancelaria americana que tem mais poder de fogo, tanto contra o presidente deposto como contra os golpistas.
Por enquanto, tem mantido o diálogo com o primeiro e ameaçado engrossar as represálias aos segundos. Desde anteontem, porém, a alta diplomacia americana avalia o custo político de seguir fazendo isso. O ceticismo do Departamento de Estado pode contaminar a Casa Branca e a OEA.
Até agora, o presidente Barack Obama ampara mais firmemente a decisão de reinstalar Zelaya no poder do que Hillary e seu grupo. O presidente foi o primeiro a usar a expressão "golpe de Estado" para se referir ao ocorrido em Honduras e só recuou depois de alertado para as implicações jurídicas do termo.
De acordo com as leis americanas, se considerar que houve golpe de Estado o governo deve chamar seu embaixador, cancelar os vistos e congelar os bens dos golpistas nos EUA e bloquear ajuda econômica e militar ao país em questão -apenas as duas últimas ações foram tomadas por Obama, ainda assim parcialmente.
Desde então, a frase oficial passou a ser "restaurar a ordem democrática e constitucional em Honduras", repetida por todos os membros do governo quando o assunto é o país.

Pressão republicana
Contra um endurecimento maior em relação ao presidente interino Roberto Micheletti e seu grupo pesam ainda a ligação de Zelaya com o venezuelano Hugo Chávez e o nicaraguense Daniel Ortega e a ameaça de um grupo de republicanos conservadores de atrapalhar ainda mais a agenda do democrata no Congresso.
Na semana passada, o senador Jim DeMint pediu o adiamento da confirmação de Arturo Valenzuela para o posto de número um do Estado para a América Latina e do atual titular do cargo, Thomas Shannon, para a Embaixada no Brasil.
Na quinta, apresentou emenda que exige um relatório do diretor de Inteligência dos Estados Unidos sobre as ligações entre Zelaya e Chávez, Ortega e os irmãos Fidel e Raúl Castro.
Já a OEA chegou ao limite do que pode fazer institucionalmente por Zelaya; politicamente, a entidade tem as mãos parcialmente atadas pelo país que paga 60% de suas contas.
De resto, o clima em Washington parece virar contra o deposto. Na sexta, no momento em que a CNN exibia ao vivo a tentativa de Zelaya de atravessar a fronteira entre Nicarágua e Honduras, um dos ouvidos pela emissora era Lanny Davis, contratado pelo regime dos golpistas para fazer seu lobby na capital. Ele era identificado só como "ex-assessor de Bill Clinton". E criticava Zelaya.


Próximo Texto: Opinião: Divisão partidária sobre Honduras custa caro aos EUA
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.