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OCDE quer ajuda maior à América
Para economista do grupo de países industrializados, é preciso contra-atacar investimentos e doações da Venezuela e da China
Javier Santiso crê que "possibilismo econômico" de países como o Brasil deve fazer frente ao "bom revolucionário" Chávez
FLÁVIA MARREIRO
DA REDAÇÃO
Hoje "obcecada" pelo avanço
da China como "doadora emergente" em países na África e na
Ásia, a comunidade internacional também deve se preocupar
com a generosidade crescente
da Venezuela a seus aliados na
América Latina.
A opinião é de Javier Santiso,
economista-chefe do Centro de
Desenvolvimento da OCDE
(Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico, o grupo dos 30 países
mais ricos do mundo).
Santiso defende que a OCDE
aumente seu aporte a programas de cooperação internacional na região, em contrapeso às
ajudas milionárias distribuídas
por Hugo Chávez.
Nesse cenário, também é essencial, diz o economista espanhol, que o Brasil de Luiz Inácio Lula da Silva decole. Daí, o
país seria a vitrine para o mundo, prova de que é possível se
desenvolver na democracia de
mercado, com políticas responsáveis e sustentáveis.
Para Santiso, a parte da América Latina que escolheu essa
vertente -nela estão também
Chile, Peru e México- é a que
apresenta os melhores resultados. Ele explicitou a tese em
seu livro " La economía política
de lo posible" (a economia política do possível).
FOLHA - Recente reportagem da
revista "Economist" ecoou a sua tese sobre o avanço da classe média
na América Latina, mas também sugere que há um limite para esse processo. A região decolará, mas não há
mais vagas na primeira classe?
JAVIER SANTISO- Não vejo assim.
Li a reportagem, que me pareceu muito interessante por falar do auge do desenvolvimento da classe média na região.
Uma dificuldade, claro, é o ritmo da saída da pobreza, que
não se dá na velocidade que as
pessoas desejariam. Mas não
vejo esse problema de teto, de
limite. Depende do horizonte
onde nos situamos.
Por exemplo, tomemos a Espanha nos anos 70. Era um
emergente, tecnicamente falando. Vinte anos depois, de
1975 a 1995, é que começa o
processo de ascendência acelerado, principalmente nos anos
90. Aumenta o PIB, o tamanho
das empresas. Claro, a Espanha
teve a sorte que nenhum país
da América Latina teve, que é
fazer parte da União Européia.
Mas também importam a qualidade da gestão macroeconômica e a qualidade do gasto público, porque Portugal e Grécia
também estão na UE e não tiveram o mesmo êxito que Irlanda
e Espanha. Portanto não há
maldição latina. E também não
há maldição latina na América
Latina. É só olhar o Chile.
FOLHA - Lula, na sua tese, é um
"embaixador do possibilismo", defensor desse modelo de desenvolvimento e antípoda de Chávez, "o
bom revolucionário" com dinheiro.
Quem está ganhando a disputa?
SANTISO - Há uma competição
entre Lula e Chávez efetivamente, e há uma guerra dupla,
em nível regional e internacional. Mas ainda não sei quem ganhou ou vai ganhar. É verdade
que a imprensa internacional
falava muito de Chávez quando
ele chegou e continua falando,
mas do outro lado está essa vertente do "possibilismo" encarnado por Lula. No exterior, é a
que mais se aprecia, porque desenha políticas mais sustentáveis. Afinal, o que ocorre na Venezuela só é possível porque
tem por trás o petróleo, e por isso não é reproduzível -já veremos o que vai ocorrer no Equador, na Bolívia...
Por isso, é muito importante
também que em nível regional
essa trajetória possibilista tenha sucesso. É o que está em jogo: o êxito ou o fracasso dos países que apostaram na democracia de mercado, como o Brasil e
muitos da região. Se a OCDE é
uma organização que valoriza a
economia de mercado e a democracia, os países que a adotaram devem ser modelo para outros países do mundo, por isso
vamos fazer um relatório sobre
a América Latina no final do
ano. É que nem todos escolheram esse modelo. Pode-se imaginar em quais eu estou pensando, olhando mais para o
Oriente... É importante para a
América Latina, é importante
para a OCDE, é importante internacionalmente que as grandes democracias emergentes
como Brasil e Índia tenham
êxito.
FOLHA - Os discursos de Chávez e a
generosidade dele com aliados causam ruído nessa campanha de expor o êxito dos "possibilistas"?
SANTISO - Chávez é um grande
comunicador. E desse ponto de
vista consegue dar golpes midiáticos. E, além disso, tem capacidade financeira, que permite comprar bônus na Argentina, fazer programas de recuperação na Bolívia e até em
Londres -quando ainda tem
pobres em casa. Em 2006 eu fiz
uma estimativa do gasto da Venezuela, de maneira ampla,
não pelos critérios da OCDE,
em cooperação internacional:
eram US$ 6 bilhões. E, se
olharmos a cooperação dos países da OCDE na América Latina, não é muito elevada. A dos
EUA não alcança nem sequer a
metade disso. A da Espanha, a
mais importante entre os europeus, é de quase US$ 2 bilhões
-um terço da venezuelana. Por
isso é importante que a OCDE
olhe mais para a região.
FOLHA - O sr. propõe que a OCDE
faça um contrapeso a Chávez?
SANTISO- O que estou comentando é que há um doador
emergente na América Latina
que é a Venezuela. Se fala muito
dos "emerging donours", e todo
mundo está obcecado pela China como "emerging donour" na
Ásia e na África. Então, da mesma maneira que a China como
doador emergente na África
preocupa a OCDE, também teria de haver preocupação com a
Venezuela, e então adotar medidas para ajudar mais a América Latina com programas de
cooperação. Só para dar um
exemplo, por que não ter grandes fundos de infra-estrutura
para apoiar a região?
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