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ÁSIA
Ator que passou 25 anos como guerreiro implacável vira febre com show de "samba"
Samurai machão se revela
dançarino e choca o Japão
NORIMITSU ONISHI
DO ""NEW YORK TIMES", EM OSAKA
Seria como se os americanos
acordassem um belo dia e descobrissem John Wayne transformado no caubói do Village People.
Durante 25 anos, Ken Matsudaira atuou num seriado de TV
japonês intitulado ""O Xogum
Violento", no papel de um samurai do século 18 que encarnava o
ideal japonês de masculinidade:
forte, abnegado, indiferente às
mulheres e ao dinheiro, sempre
pronto para fazer justiça com sua
espada e a ordem ""punir!".
O ator acabou sendo tão estreitamente identificado com esse herói da cultura popular que foi um
choque para os japoneses quando, há pouco tempo, veio à tona
que, há dez anos, e quase às escondidas, Matsudaira vem dançando samba num palco, usando
quimonos brilhantes, dourados e
roxos, lançando gritos animalescos e rebolando. Cercado de dançarinas e ao lado de uma bola de
discoteca, ele dizia aos fãs que,
nos tempos sombrios em que o
país vivia, a única saída era sambar, e cantava: ""Samba! Viva!
Samba! Matsuken Samba! Olé!"
A metamorfose de Matsudaira,
51, no samurai cantante de seu
show, ""Matsuken Samba 1", que
lembra teatro de revista, fez sucesso enorme num país em que a
imagem idealizada da masculinidade japonesa vem se modificando drasticamente nos últimos
anos, tanto na cultura popular
quanto no mundo real, passando
de dura para algo mais brando.
Depois de roubar a cena num
show de véspera de Ano Novo
que foi exibido em todo país e de
ver sua canção-tema subindo para o terceiro lugar nas paradas de
sucesso, Matsudaira recentemente fez em Osaka a primeira de 30
apresentações programadas para
este ano de seu novo espetáculo,
""Matsuken Samba 2".
Além das características do espetáculo, parte de seu apelo consiste na transformação radical pela qual passa Matsudaira, fato que
o próprio ator reconheceu. ""As
pessoas talvez se interessem pelo
show porque pensam: "Aqui também há um tipo de samurai -um
samurai que canta e dança"."
Em seu seriado de TV, que ficou
no ar entre 1978 e 2003, Matsudaira representou o oitavo xogum do
xogunato Tokugawa, Yoshimune
Tokugawa. Yoshimune era conhecido como reformista, alguém
que, fiel ao espírito do código
guerreiro japonês, rejeitava a vida
extravagante. Interessado em conhecer os problemas do povo,
Yoshimune recebia queixas e sugestões deixadas numa caixa de
correio colocada em um dos portões do castelo Edo, em Tóquio.
Na TV, o xogum representado
por Matsudaira lê as cartas e, em
cada episódio, assume uma identidade diferente para poder se
misturar às pessoas. Ele ajuda os
cidadãos comuns a combater autoridades corruptas. Cada episódio chega ao clímax quando o xogum revela sua identidade real às
autoridades malvadas e, sozinho,
dizima toda uma falange de guarda-costas com sua espada.
O mundo mostrado em ""O Xogum Violento" é preto-e-branco,
um lugar onde as pessoas são
boas ou más, onde homens e mulheres têm características claramente definidas. O samurai de
Matsudaira é forte e gentil com os
fracos. As mulheres se apaixonam
por ele, mas ele, guerreiro estóico,
não demonstra interesse por elas.
Os episódios começam com a
imagem que passou a definir Matsudaira: de vestes simples e o topete dos samurais, com a espada
pendurada a seu lado, sentado sobre um cavalo branco.
De acordo com o sociólogo Kimio Ito, a imagem condizia com a
idéia japonesa de virilidade do
pós-guerra. Mas, nas últimas duas
décadas, esse ideal começou a
mudar, acompanhando a popularidade dos tipos masculinos mais
sensíveis ou engraçados.
No mundo real, à medida que a
geração de homens de negócios
usando ternos foi dando espaço a
homens japoneses que se preocupam com suas roupas, usam cosméticos e, de modo geral, são vistos como femininos, a popularidade do ""Matsuken Samba" talvez não surpreenda.
Como serviço para seus fãs,
Matsudaira começou a apresentar os espetáculos ""Matsuken
Samba" em teatros de todo o país,
em sessões vespertinas vistas sobretudo por donas-de-casa. A primeira metade do show era composta por dramas de samurais,
mas a segunda trazia números de
canto e dança. Às vezes Matsudaira vestia smoking e dançava sapateado. Mas os números mais bem
cotados o traziam em quimonos
coloridos, dançando ritmos latinos como ""Matsuken Mambo".
Os shows acabaram conquistando adeptos entre a subcultura
gay japonesa, disse o escritor e
professor de sociologia Noriaki
Fushimi, da Universidade Meiji
Gakuin, ele próprio gay. A imagem de ""Matsuken" (como Matsudaira é apelidado) teve destaque em festivais gays realizados
no ano passado em Sapporo, no
norte do país, e Shinjuku 2-chome, o distrito gay de Tóquio.
""A imagem original de Matsuken era de samurai, uma imagem
viril", disse Fushimi. ""Houve um
impacto enorme quando alguém
com uma imagem desse tipo absorveu uma espécie de feminilidade."
Tradução de Clara Allain
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