São Paulo, domingo, 27 de junho de 2004

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ELEIÇÕES NOS EUA

Virtual candidato democrata promete estreitar relações com América Latina e critica negociações da Alca

Kerry diz que será "bom amigo" para o Brasil

FERNANDO CANZIAN
DE WASHINGTON

O senador John Kerry, virtual candidato democrata à eleição dos EUA, afirmou ontem que o Brasil terá "um bom amigo" na Casa Branca caso ele seja eleito presidente em novembro.
Kerry detalhou ontem pela primeira vez sua plataforma de campanha para a América Latina e afirmou que, se eleito, este será o "século das Américas".
"Serei um presidente dos EUA que sabe onde fica a América Latina", disse Kerry, ironizando a falta de atenção que seu adversário, o presidente George W. Bush, dispensou à região durante todo o seu mandato.
O senador anunciou planos para criar a "Comunidade das Américas" e mais verbas para ações voltadas à região, mas condenou o atual formato das negociações para a formação da Alca (Área de Livre Comércio das Américas).
Após discurso em Washington para cerca de 400 lideranças políticas e empresariais latino-americanas, Kerry foi questionado pela Folha sobre como será a relação Brasil-EUA caso consiga derrotar o republicado Bush.
"Ainda não posso dizer isso, porque não fui eleito presidente. Mas assim que eu estiver na Presidência, fique certo de que vocês terão um bom amigo", respondeu.
Em seu discurso, o democrata criticou a forma como Bush está negociando a Alca e afirmou que os EUA não podem ter "um sistema de acordos comerciais baseado em um mesmo modelo que sirva para todos".
"Esse tipo de atitude eliminou o respeito e a parceria que marcaram os anos Clinton", afirmou Kerry, referindo-se ao ex-presidente democrata Bill Clinton (1993-2001). Kerry disse que os anos 90 foram "particularmente bons" para as relações entre EUA e América Latina.
Nas negociações da Alca, o governo Bush vem pressionando todos os 33 outros países envolvidos a acatar um único tratado com regras iguais para todos. Kerry repetiu duas vezes ser contra o "modelo único" e afirmou que os acordos comerciais deverão estabelecer "regras claras" para as áreas trabalhista e ambiental.
A exigência de regras nas duas áreas pode trazer dificuldades para países como o Brasil, que registram elevada informalidade no trabalho e dificuldades na aplicação de leis e políticas ambientais.
Kerry acusou Bush de "ignorar" a América Latina e afirmou que adotará um política de "proteção aos governos democráticos da região". "Enquanto a democracia avançou em países como Brasil, México e Chile, não podemos ficar sentados assistindo quando uma turba violenta depõe um presidente, como aconteceu na Bolívia [com Gonzalo Sanchez de Lozada] e na Argentina [com Fernando de La Rua]."
"Também não vamos dar as boas-vindas a um governo indicado por uma junta militar, como aconteceu na Venezuela [em abril de 2002, quando o presidente Hugo Chávez foi deposto por quase 48 horas]", afirmou.
Kerry prometeu criar o "Conselho para a Democracia" e triplicar a verba do NED (National Endowment for Democracy), fundo que obtém verbas do Congresso dos EUA para ações e projetos em vários países. Recentemente, documentos revelaram que o NED ajudou a financiar grupos que fazem oposição ao presidente Chávez, que foi eleito democraticamente duas vezes, em 1998 e 2000.
O candidato democrata prometeu também triplicar os vistos de estudante hoje concedidos a estudantes latino-americanos como forma de estimular "corações e mentes" na região. Disse que criará também "um caminho para a cidadania na América" para que trabalhadores ilegais possam pleitear sua legalização.
Tanto Kerry quanto Bush, hoje virtualmente empatados segundo várias pesquisas eleitorais, vêm cortejando os votos do público latino nos EUA.
Atualmente, há cerca de 22 milhões de latinos aptos a votar em novembro. O peso deles será fundamental em Estados importantes como Califórnia e Flórida.
No início do ano, a primeira plataforma de campanha de Bush foi um plano para legalizar trabalhadores ilegais nos EUA.
Como seu adversário fez em outras ocasiões, Kerry também "arriscou um espanhol" no final de seu discurso: "Que América sea América. Para todos".


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