|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
EUA adiam lei sobre genocídio armênio
Ação enfurece armênios da diáspora; "política americana é hipócrita", diz cineasta Carla Garapedian
ANDREA MURTA
DA REDAÇÃO
Com a ameaça de retirar o
apoio à Casa Branca na Guerra
do Iraque, a Turquia venceu, ao
menos por enquanto, a queda-de-braço com o Congresso
americano: a Câmara dos Representantes dos EUA cedeu e
adiou na última quinta-feira a
votação de uma lei para o reconhecimento do genocídio armênio, cometido por turcos
otomanos na Primeira Guerra.
A ação enfureceu ativistas armênios espalhados pelo mundo, que encabeçam, muito à
frente do governo da Armênia,
a luta pelo reconhecimento.
"A questão não é só sobre a
Turquia. É sobre a política externa americana. Os EUA são
hipócritas com o genocídio armênio, e o não-reconhecimento permite que atos semelhantes continuem a ocorrer", afirmou à Folha a jornalista e cineasta Carla Garapedian. Descendente de armênios em fuga
da fúria turco-otomana do começo do século passado, a armênio-americana Garapedian
trouxe à 31ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo
"Screamers", que define como
"um filme político sobre a negação" [do genocídio].
Há 2,9 milhões de pessoas na
Armênia e cerca de 8 milhões
de armênios vivendo em outros países -a maioria emigrou
na diáspora, em fuga da matança generalizada do Império
Otomano. É esta maioria no
exterior a maior responsável
por divulgar o extermínio intencional de 1,5 milhão de armênios entre 1915 e 1923.
A versão turca diz que houve
cerca de 300 mil mortes como
conseqüência de doenças e
guerras à época da desintegração do Império Otomano. A
Turquia nem discute o tema
-pelo artigo 301 da Constituição, quem citar o genocídio e
"ofender a nação" pode ser processado, como ocorreu com o
vencedor do Nobel de Literatura de 2006, Orhan Pamuk.
Sem prioridade
A revolta dos armênios da
diáspora, porém, é pouco refletida no governo de seu Estado-nação. Segundo o historiador
armênio-libanês Ara Sanjian,
que dirige o Centro de Estudos
Armênios (CARP, na sigla em
inglês) na Universidade de Michigan (EUA), não há, historicamente, envolvimento da Armênia com a questão do reconhecimento. "Os governos armênios desde a independência
(1991) não impõem o reconhecimento como precondição para a regularização das relações
com a Turquia [que fechou a
fronteira e não tem relações bilaterais com Ierevan]", afirma.
O fundador do CARP, Dennis
Papazian, vai além: Ierevan
"está mais interessado em temas atuais de desenvolvimento. Só usam o genocídio para
atrair atenção para as disputas
com Turquia e Azerbaijão."
Tanto Sanjian quanto Papazian ressalvam, porém, que "individualmente os líderes vêem
como positivas ações pelo reconhecimento".
Assim como no governo, o reconhecimento também não parece ser precondição para a população local quando estão em xeque as relações com a Turquia. Em 2006, um levantamento do Centro de Pesquisa
do Cáucaso apontou que 58,9%
dos armênios apóiam atitudes
de cooperação política com a
Turquia, e 52,7% apóiam a cooperação econômica.
E há na Armênia quem questione o foco dos armênios da
diáspora no reconhecimento.
"As estruturas organizacionais
da diáspora colocam a questão
acima até dos problemas atuais
de segurança da Armênia", afirma Armen Ayvazyan, diretor
do Centro de Pesquisas Estratégicas Ararat, em Ierevan.
Ainda assim, Ayvazyan, que foi
assistente da Presidência da
Armênia entre 1992 e 1994, não
diminui a importância do reconhecimento para o povo do
país. "Quando se vive ao lado da
Turquia, que bloqueia e chantageia a Armênia diariamente,
não se pode ser menos atento
ao genocídio do que a terceira e
quarta geração de armênios da
diáspora que vivem em Londres, Paris e Nova York."
DOCUMENTÁRIO - "Screamers"
Direção e roteiro: Carla Garapedian; música: System of a Down;
exibições: hoje às 19h10 na Cinemateca e amanhã às 13h30 no Espaço Unibanco de Cinema 3
Texto Anterior: Risco de invasão turca é iminente, afirma premiê Próximo Texto: Frases Índice
|