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Cresce anti-semitismo nos países muçulmanos
SUSAN SACHS
DO "THE NEW YORK TIMES"
Hospede-se num hotel cinco estrelas em qualquer lugar entre a
Jordânia e o Irã e você poderá
comprar a infame falsificação
"Protocolos dos Sábios do Sião",
livro que "descreve" uma inexistente conspiração judaica para
dominar o mundo.
Compre um jornal em qualquer
país árabe e verá uma suástica sobreposta à bandeira de Israel.
Essas imagens anti-semitas já
fazem parte do discurso cotidiano
envolvendo judeus em boa parte
do mundo islâmico, na imprensa
popular e nos periódicos acadêmicos. O fenômeno não se limita
a países que estejam em guerra
com Israel: podem ser encontrados em publicações de interesse
geral vendidas no Egito e na Jordânia, que assinaram acordos de
paz com Israel, e também em escolas religiosas independentes no
Paquistão e no sudeste da Ásia.
Os governantes árabes, por sua
parte rejeitam a acusação de que
sua imprensa, suas universidades
e suas TVs divulgam pontos de
vista anti-semitas. Dizem que a
história islâmica não contém nada que chegue perto dos horrores
anti-semitas da Europa cristã.
O uso de imagens nazistas, as
caricaturas de judeus com narizes
aduncos, até mesmo os livros didáticos árabes em que os judeus
são descritos como perversos
conspiradores mundiais -tudo
isso, afirmam os governantes, reflete a rejeição ao sionismo e aos
israelenses, mas não aos judeus.
No entanto, em muitos países
muçulmanos o ódio aos judeus é
alimentado há gerações através
da cultura popular. Um exemplo
é um livro didático publicado pelo
governo jordaniano para o ensino
fundamental. Nele, os judeus são
descritos como corruptos e mentirosos inatos. "Até agora", afirma
o livro, "eles são os mestres da
agiotagem e líderes do exibicionismo sexual e da prostituição."
Para estudiosos do islamismo,
textos como esses são sinais de
que o conflito árabe-israelense já
foi transformado -de embate
político, nacionalista e territorial- em guerra entre religiões,
ou mesmo entre o bem e o mal.
Um fator que contribui para essa percepções é a longa duração
do conflito no Oriente Médio.
"Você vê um certo nível de anti-semitismo e pensa "como podem
pessoas inteligentes acreditarem
nisso?'", disse John Esposito, professor de religião e assuntos internacionais na Universidade Georgetown. "Parte da explicação é
que elas cresceram com isso desde crianças, mas parte, também, é
que cresceram numa situação de
confronto. O mundo é reduzido a
"nós" e "eles"."
Tanto judeus quanto muçulmanos disseminam o ódio baseado
em leituras equivocadas de suas
escrituras, disse Esposito.
Os fundamentalistas islâmicos
frequentemente se referem a judeus como filhos ou netos de macacos. A afirmação é feita em mesquitas nos territórios palestinos, e
também entre religiosos sauditas.
A referência é tirada de um verso no Alcorão que, visto em seu
devido contexto, faz referência a
judeus e cristãos que desrespeitam o sábado e que zombam dos
primeiros muçulmanos, devido a
suas crenças. O Alcorão diz que
Deus fez essas pessoas tão desprezíveis quanto macacos, porcos e
adoradores de ídolos.
A doutrina islâmica relativa aos
cristãos também vem sendo reinterpretada, nas últimas décadas,
na tentativa de forjar um vínculo
antijudaico entre muçulmanos e
cristãos. O islã literal reconhece
Jesus como profeta, mas não acredita que ele tenha sido crucificado. O Alcorão diz que os judeus
tentaram crucificá-lo, mas que
Deus salvou Jesus e que, em lugar
dele, os judeus mataram apenas
uma imagem de Jesus.
No entanto uma acusação hoje
feita por muçulmanos hoje é que
os judeus de fato mataram Jesus.
Quando João Paulo 2º visitou Damasco, no ano passado, o presidente Bashar al Assad o saudou
com um discurso em que acusou
os judeus justamente disso.
Que os judeus sejam demonizados por alguns árabes e que árabes sejam demonizados por alguns judeus pode não surpreender. E, como Israel foi fundado
como país judeu, a religião sempre foi um fator em suas relações
com seus vizinhos árabes.
Para Bernard Lewis, historiador
do islã e do Oriente Médio, há
uma "islamização do anti-semitismo", cuja literatura inclui textos clássicos do anti-semitismo
europeu, como os "Protocolos
dos Sábios do Sião". Nas últimas
décadas, esse material vem sendo
complementado por textos sobre
a perversidade inata dos judeus.
Durante séculos, entretanto, os
judeus tiveram presença pequena
nos escritos teológicos islâmicos,
disse Lewis. Eles figuram no Alcorão como obstinados opositores
dos esforços do profeta Muhammad para levar o islã aos povos da
península Arábica. Das tribos que
ele encontrou, os judeus foram os
mais hostis a sua mensagem. Mas
as tribos judaicas acabaram derrotadas, e o Alcorão se refere a
elas como um povo cuja rebeldia
sempre foi castigada por Deus.
Nos ensinamentos islâmicos
mais modernos, nos livros didáticos árabes e em artigos publicados pela grande imprensa, a descrição feita no Alcorão da oposição dos judeus a Muhammad assume importância monumental.
De acordo com interpretações, os
judeus corromperam a palavra de
Deus desde o início, e seu conspirar contra o profeta foi uma expressão de sua maldade.
"Algumas pessoas confundem
determinados versos do Alcorão
que atacavam os judeus daquela
época com um ataque ao próprio
judaísmo", disse Seyyed Hossein
Nasr, professor de estudos islâmicos na Universidade George Washington. "Não é um mal-entendido inocente. É uma confusão proposital, e acontece de ambos os lados." Segundo ele, esse é um fenômeno moderno e que, em sua esteira, derruba toda uma longa tradição de amizade entre o islã e o
judaísmo. "Se as autoridades de
ambas as religiões priorizarem as
exigências de Deus acima dos
sentimentos nacionalistas e étnicos", disse Nasr, "então talvez seja
possível resolver algo."
Tradução de Clara Allain
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