São Paulo, quarta-feira, 28 de maio de 2008

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Redes privadas terão de pagar por imagens de TV de Chávez

Hora de retransmissão passará a custar R$ 335 mil; uso só será permitido em noticiários

Ministro da Comunicação se demite; para TV opositora, decisão é freio à campanha que apontava contradição em discursos de presidente


FABIANO MAISONNAVE
DE CARACAS

O canal estatal VTV, que detém o monopólio na cobertura da maioria dos eventos do presidente venezuelano, Hugo Chávez, informou anteontem às emissoras privadas que passará a cobrar pela retransmissão de suas imagens, a um preço de R$ 335 mil por hora. Segundo o canal oposicionista Globovisión, a medida inviabiliza a cobertura de atos oficiais.
Em carta dirigida às TVs privadas, a VTV afirma que, a partir de 1º de junho, cobrará o equivalente a R$ 93 por segundo de retransmissão de sua imagem. Ou seja, uma entrevista coletiva de meia hora com um ministro de Chávez, por exemplo, custará R$ 167.500.
A única exceção fica por conta de "discursos, declarações públicas, atos oficiais e similares" feitos por Chávez, desde que as imagens sejam usadas "única e exclusivamente" em programas de notícias "claramente identificados". Ou seja, se forem usadas numa propaganda institucional ou num documentário, por exemplo, é necessário pagar.
O comunicado da VTV afirma que o canal "se reserva o direito de proibir total ou parcialmente o uso e retransmissão de seu sinal a qualquer momento".
Até agora, as regras na Venezuela eram similares às do Brasil, onde os canais privados têm acesso gratuito e sem restrições às imagens de coberturas presidenciais da estatal TV Brasil.
Após o anúncio, o ministro da Comunicação, Andrés Izarra, pediu demissão porque disse ter tomado a decisão sobre a cobrança "sem consultar as demais instâncias do governo nacional", informou em breve fala a jornalistas.
A Folha procurou durante a tarde a direção da VTV, mas ninguém respondeu aos pedidos de entrevista.
Para o diretor-geral da Globovisión, Alberto Federico Ravell, a cobrança impedirá seu canal de cobrir o governo. "As informações do setor oficial não poderão mais sair em nossa tela", disse ontem à Folha. "Não somos convocados a eventos oficiais. Se vamos, não nos deixam entrar. Nos atos populares do partido do governo, agridem nossos repórteres. Por isso, usamos o sinal da VTV, para que os telespectadores tenham a outra face da moeda. Mas não podemos pagar essa tarifa."
Como exemplo, Ravell cita o "Alô, Presidente", programa dominical de Chávez, que pode durar até sete horas e não é tecnicamente um ato oficial. Caso seja retransmitido por cinco horas, por exemplo, o custo será de R$1,67 milhão.
Ravell diz que a medida tem como alvo a propaganda institucional "Usted lo Vió" (você viu). Transmitida durante os intervalos, mostra declarações constrangedoras para o chavismo, geralmente usando imagens da VTV.
É o caso de um discurso de Chávez feito em 2004 na Colômbia no qual ele jura "por Deus e pela minha santa mãe que, se eu apoiasse a guerrilha [Farc], não teria cara para vir aqui a Cartagena".
"Isso é o que mais incomoda o governo. Pegamos uma frase que alguém disse sem editá-la, sem modificá-la e a repetimos várias vezes. Os presidentes muitas vezes dizem coisas de que se arrependem. Então simplesmente colocamos "você viu pela Globovisión" e passamos várias vezes por dia. Parece que todos os tiros vão dirigidos a isso", disse Ravell.

Um ano sem RCTV
As mudanças nas regras de retransmissão coincidiram com o primeiro aniversário da não-renovação da concessão da emissora RCTV, sob a justificativa de que ela participou da tentativa de golpe de Estado contra Chávez em 2002.
Em entrevista coletiva, o presidente da emissora, Marcel Granier, disse ontem que, ao encerrar a concessão, "o presidente ficou nu em seu patético projeto totalitarista".


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