São Paulo, terça-feira, 28 de dezembro de 2004

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TRAGÉDIA NA ÁSIA

Sismólogo afirma que rede de detecção e aviso de tsunamis como a que existe no oceano Pacífico poderia ter salvo vidas no Índico

Para especialista, mortes eram evitáveis

ANDREW C. REVKIN
DO "NEW YORK TIMES"

O abalo sísmico que teve origem ao noroeste de Sumatra, Indonésia, ao raiar do dia no domingo, era uma máquina perfeita de criação de ondas, e a falta de um sistema de alerta contra tsunamis no oceano Índico garantiu a devastação que varreu comunidades costeiras em toda a região sul da Ásia, disseram especialistas.
Ainda que as ondas tenham encoberto parte da costa de Sumatra e de ilhas vizinhas em questão de minutos, teria havido tempo para alertar comunidades mais distantes caso o oceano Índico dispusesse de uma rede de alerta como a que existe no Pacífico, disse Tad Murty, especialista nos tsunamis da região, da Universidade de Manitoba, no Canadá. Na Índia, por exemplo, a onda só chegou à costa após três horas.
Apenas 15 minutos depois do abalo, de fato, os cientistas que operam o sistema de alerta sobre tsunamis existente no Pacífico enviaram um alerta, de sua central em Honolulu, a 26 países participantes, entre os quais Tailândia e Indonésia, no sentido de que ondas destrutivas poderiam ser geradas pelo tremor em Sumatra.
Mas não havia como transmitir essa informação rapidamente a países e comunidades localizados a um oceano de distância, disse Laura S. L. Kong, sismóloga do do Centro Internacional de Informações sobre Tsunamis, uma organização que funciona sob os auspícios das Nações Unidas.
Telefonemas a países na região ameaçada do Índico foram tentados com a máxima urgência, mas sem a velocidade que teria sido possível caso houvesse planos de emergência preestabelecidos.
"Fora do Pacífico, essas coisas não ocorrem com grande freqüência, de modo que o desafio é como conscientizar as pessoas e as autoridades", disse ela.
Os tsunamis, também conhecidos como maremotos, são gerados quando um abalo sísmico, erupção ou deslizamento de terra causa movimentos abruptos no leito do oceano, abalando as águas que o recobrem.
As ondas resultantes podem cruzar milhares de quilômetros de oceano a até 800 km/h, na forma de perturbações quase invisíveis, até que se empilham em regiões costeiras mais rasas e criam vagalhões de 10 metros ou mais.
Mas mesmo em velocidades como essas, alertas oportunos podem garantir tempo suficiente para a evacuação.
O Índico também já havia registrado tsunamis, disseram oceanógrafos ontem, mencionando um maremoto que matou centenas de pessoas perto de Bombaim (Índia), em 1945, e outro que devastou Bangladesh em 1762.
Com a imensa densidade populacional de muitas regiões na área costeira do sul da Ásia, a região deveria ter começado a instalar uma rede de alerta desse tipo há muito tempo, disse Murty.
Outros cientistas expressaram preocupações semelhantes. Em reunião da Comissão Oceanográfica Intergovernamental, uma agência das Nações Unidas, realizada em junho, especialistas concluíram que "o oceano Índico oferece ameaça significativa tanto no caso de tsunamis locais quanto no de tsunamis distantes".
Murty disse que Índia, Tailândia, Malásia e outros países da região "consideram que tsunamis sejam um problema do Pacífico".
O abalo de anteontem ocorreu em uma das muitas juntas na crosta sempre mutável do planeta, em que placas deslizam umas sob as outras em um processo incessante, mas espasmódico.
As falhas em que os terremotos tendem a causar abrupto movimento vertical, como as que existem ao longo da Indonésia ocidental, representam um risco maior de geração de tsunamis, porque agem como um grande pistão, deformando o mar. Em abalos submarinos como esses, a gravidade e a incompressibilidade da água forçam os mares acima a reagir imediatamente a mudanças milhares de metros abaixo.
A maior parte das pesquisas sobre essas ondas, e dos esforços para criar sistemas de advertência, se concentrou no Pacífico, onde o Cinturão de Fogo, uma grande junta de atividade vulcânica e tectônica, causa um tsunami significativo por década, em média.
Qualquer abalo submarino de magnitude superior a 6,5 dá início ao processo, segundo Murty, e se uma única onda indica aos detectores que o oceano está reagindo, um alerta é divulgado. "Não existe motivo para que uma única pessoa tenha de morrer vítima de um tsunami", disse Murty. "As ondas são completamente previsíveis."


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