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Igreja discute confissão on-line
Padres italianos defendem praticidade de se pedir perdão por e-mail, mas fiéis sentem desconforto
Religiosos cogitam banco de dados de pecadores; debate sobre figurinhas "satânicas" vira foco de congresso internacional de exorcistas
JANAÍNA LEITE
ENVIADA ESPECIAL A ROMA
Confissão pela internet vale?
Quem consentiu a própria eutanásia tem direito a um funeral cristão? Figurinha é assunto
para exorcista? Mais do que
exercícios de provocação ética
e teológica, tais perguntas refletem o espírito de inquietude
que tomou conta da Igreja Católica italiana no Natal de 2006
e prometem esquentar nos
próximos meses as discussões
sobre os rumos da Santa Sé.
Em Pavia, pequena cidade localizada na região da Lombardia, dois padres, Gianfranco
Poma e Francesco Tassone, decidiram que o relato dos pecados por e-mail é tão bom quanto aquele feito pelos que se
ajoelham no confessionário -
com a vantagem de que a mensagem pode ser digitada em
qualquer computador na hora
em que der na veneta do arrependido. Uma conexão direta
com o perdão, 24 horas por dia.
Mas nem todos pensam de
forma tão direta. Assim, a polêmica acabou instalada. O primeiro ponto de desacordo foi o
tamanho do texto: as pessoas,
aparentemente, ficam incomodadas ao ver o registro de seus
dribles às leis divinas e estão
acostumadas a medir a gravidade das faltas pelo tempo de conversa com o pároco, não pelo
número de toques no teclado.
Versão resumida
O resultado é que boa parte
das confissões chega curta e
grossa à caixa postal dos párocos, o que levou especialistas
italianos a discutir de maneira
inflamada a conveniência de
eles pedirem, por e-mail, mais
detalhes dos pecados antes de
cravar a absolvição.
Outra dúvida que embolou a
iniciativa dos padres de Pavia
foi se as confissões pela internet poderiam ser feitas a partir
de pseudônimos ou se era imprescindível que o pecador se
identificasse. Como? Sugeriram aos religiosos montar um
banco de dados. Dessa forma,
quem quisesse a conversa virtual só precisaria digitar nome
e senha para baixar o formulário da confissão. O cabeçalho,
disseram alguns, poderia ser
padronizado: "Perdoe-me, padre, porque pequei".
Em meio à chuva de pitacos,
houve ainda os que defendessem o acesso à ficha corrida de
desrespeito aos mandamentos
-à própria ficha, que fique bem
entendido.
As dificuldades de tornar a
confissão virtual realidade não
desestimularam os padres de
Pavia. Pelo contrário. Até que
ela esteja devidamente sistematizada, numa espécie de
"upload" 2007, eles continuarão recebendo os relatos tal e
qual enviados. O importante,
acreditam, é estimular os católicos a manterem-se em linha
com os sacramentos.
A tarefa é difícil. A Itália entrou em convulsão nas últimas
semanas por conta de Piergiorgio Welby, o homem que preferiu morrer ao som de Bob
Dylan a viver com a ajuda de
máquinas. Antes de receber a
injeção que o sedaria, impedindo-o de ver o desligamento dos
aparelhos, Welby invocou a
Deus e a Ele deu graças.
Não foi suficiente para convencer a cúpula da Igreja de
que era um bom cristão. Os 45
anos em que freqüentou com
sua mulher a paróquia de Dom
Bosco, em Roma, também não.
Para a Santa Sé, ao concordar
com a própria morte, Welby cometeu uma espécie de suicídio
-e seu funeral, portanto, jamais poderia acontecer sob as
bênçãos cristãs.
Demônios orientais
A esquerda italiana ficou enfurecida, parte da população
também. Outra parte deu de
ombros -achou mais interessante acompanhar o Congresso
Internacional de Exorcistas,
ocorrido neste mês em Colle
Valenza.
Especial atenção foi destinada às declarações do padre Gabriele Amorth, considerado o
maior decano do mundo na arte de expulsar demônios.
Para Amorth, os fiéis precisam banir incitações ao satanismo a partir de ilustrações
que contêm recados subliminares. Quais? As figurinhas do Yu-Gi-Oh, mania entre crianças e
adolescentes do mundo todo,
inclusive as brasileiras.
E ele não está sozinho. Vários
exorcistas que estiveram no
Congresso ponderaram que a
vontade de jogar e de trocar os
desenhos é, na verdade, uma
obsessão inflada por antigos
demônios orientais. Segundo
essa versão, as entidades se
apossam da mente dos jogadores e os obrigam a um duelo de
vontades com as criaturas do
mal. Em suma, um passatempo
perigoso, que merece toda a
atenção dos pais católicos.
A saída defendida pelos exorcistas é que, em vez de comprar
figurinhas para entreter a
criançada, os pais devem gastar
algum tempo conversando com
os filhos e orientá-los sobre a
importância de valores morais
imprescindíveis à fé, como o
respeito aos sacramentos tipo a
confissão, por exemplo.
Difícil resistir: e se o menino
quiser se confessar pela internet? Vale?
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