São Paulo, segunda-feira, 29 de março de 2010

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Papa diz não ser intimidado por "fofocas"

Em sermão pelo Domingo de Ramos, Bento 16 responde indiretamente às denúncias de pedofilia envolvendo a Igreja Católica

Sem citar escândalos, pontífice afirma que fé em Deus lhe dá coragem contra "opiniões dominantes"; milhares veem cerimônia

Alessandro Bianchi/Reuters
Bento 16 celebra missa de Domingo de Ramos, que dá início à Semana Santa; em sermão, ele insinuou que denúncias de pedofilia contra igreja são maledicências

DA REDAÇÃO

Alvo de críticas de acobertamento de casos de pedofilia envolvendo religiosos católicos nos EUA e na Europa, o papa Bento 16 disse ontem, em homilia da missa do Domingo de Ramos, na praça de São Pedro (Vaticano), que sua fé lhe dá coragem para não ser intimidado.
De Deus vem a "coragem que não se deixa intimidar pelas fofocas das opiniões dominantes", disse o papa.
Durante a missa, ele também falou de como o homem às vezes pode cair a níveis "vulgares e baixos" e "mergulhar num pântano de pecado e desonestidade". E rezou "pelos jovens e por aqueles que se empenham em educá-los e protegê-los".
Milhares de pessoas estavam presentes à celebração que abre a Semana Santa. Bento 16 não fez referências diretas às denúncias de escândalos sexuais envolvendo a Igreja Católica. Porém, trechos do seu sermão indicam uma resposta às críticas de encobrimento, pela igreja, de casos de abuso sexual de crianças por clérigos, gerando uma das mais graves crises do seu pontificado -que completa cinco anos em 20 de abril.
Os escândalos de pedofilia ganharam notoriedade após denúncias recentes de abusos sexuais contra crianças praticados por padres na Irlanda, entre os anos 1930 e 1990. Em maio de 2009, dossiês resultantes de nove anos de investigações apontaram a existência, no país, de uma prática disseminada de molestamentos e violações por parte da Igreja Católica irlandesa que atingiu mais de 15 mil crianças e adolescentes e resultou, até agora, na renúncia de quatro bispos.
Por isso, Bento 16 enviou, há nove dias, carta aos católicos irlandeses em que pede "perdão e renovação interior" a Deus pela igreja na Irlanda e qualifica os abusos como "atos pecaminosos e criminosos". Nela, Bento 16 ainda ressalta que os episódios não se restringem à Igreja Católica nem à Irlanda.
O escândalo trouxe à tona outras denúncias de pedofilia praticados por padres na Holanda, Áustria, Suíça, Alemanha e EUA. Porém, o papa não se manifestou publicamente sobre os episódios ocorridos nesses países.
Na Alemanha, onde nasceu o papa, a igreja admitiu "erros" na Arquidiocese de Munique na passagem das décadas de 1970 para 1980, quando era dirigida pelo então bispo Joseph Ratzinger. Além disso, ao menos 250 ex-alunos de instituições católicas alemãs sofreram abusos físicos e psicológicos.
Nos EUA, o jornal "The New York Times" revelou novo escândalo, que veio se somar à onda de denúncias, porém com um agravante que aponta para a suspeita de omissão por parte do próprio Ratzinger à época em que chefiava a Congregação para a Doutrina da Fé.
O caso envolve abusos praticados pelo padre Lawrence Murphy contra mais de 200 meninos surdos em Milwaukee, no Estado americano de Wisconsin, entre 1950 e 1974. Bispos americanos enviaram cartas ao Vaticano em 1996 relatando o caso ao então cardeal Ratzinger. As correspondências foram ignoradas e o padre Murphy foi poupado de um julgamento canônico depois de Ratzinger ter recebido uma carta do acusado.
Nela, o padre apelava para "viver o tempo que restava com a dignidade do sacerdócio". O padre morreu em 1998, aos 72 anos, sem nunca ter sido punido. O Vaticano nega o encobrimento do caso, mas admite os abusos de Murphy.
Em editorial publicado no jornal "Osservatore Romano" na semana passada, a Igreja Católica critica a mídia pela "tentativa ignóbil de atacar o papa Bento 16 e seus assessores mais próximos a qualquer custo".


Com agências internacionais


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