São Paulo, domingo, 29 de setembro de 2002

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Aos dois anos, Intifada caminha para resistência civil

PAULO DANIEL FARAH
DA REDAÇÃO

Dois anos após o início do levante contra a ocupação israelense, a Intifada de Al Aqsa começa a adquirir contornos de um movimento de desobediência civil em um momento em que Israel reocupa as principais cidades da Cisjordânia e mantém boa parte dos palestinos sob toque de recolher praticamente 24 horas por dia, há mais de três meses, sob a alegação de que a medida vai deter o terror.
"As manifestações pacíficas de desobediência civil contra a ocupação vão aumentar", disse à Folha, por telefone, o médico palestino Mustafa Barghuti, 48.
Um dos idealizadores da Iniciativa Nacional Palestina, em prol de reformas democráticas e de uma reestruturação das forças de segurança, Barghuti vem ganhando a adesão de importantes lideranças políticas e sociais para um movimento de resistência civil, sem atentados palestinos como os que mataram centenas de israelenses nos dois últimos anos.
"Retomaremos a resistência pacífica contra esta ocupação violenta, como ocorria na primeira Intifada [1987-1993]. Hoje, os palestinos vivem sob prisão domiciliar -sem a possibilidade de acesso a trabalho, assistência médica e educação", afirma.
O governo israelense afirma que o toque de recolher é necessário para impedir a realização de novos atentados palestinos.
Nos próximos dias, o secretário-geral (número 2) da Autoridade Nacional Palestina (ANP), Mahmud Abbas, deve apresentar um plano de paz elaborado com membros de alto escalão do Comitê Central do Fatah e do Conselho Legislativo Palestino, entre os quais Abdul Razzaq al Yahya, ministro do Interior, e Nabil Amru, deputado do Conselho Legislativo Palestino (CLP) e ex-ministro que recentemente pediu o fim da corrupção na ANP. Todos criticaram os atentados suicidas.
O plano propõe a criação do cargo de primeiro-ministro palestino, para o qual Abbas -conhecido como Abu Mazen- seria designado em troca da retirada israelense das cidades autônomas palestinas durante um período inicial de três meses e da reformulação das forças de segurança com a intenção declarada de desarmar todos os grupos que atuam nos territórios ocupados. Embora tenha descartado negociar com o líder da ANP, Iasser Arafat, seu arquiinimigo, Sharon rejeitou reunir-se com Abbas -e com outros representantes palestinos.
Israel enviou tanques e buldôzeres ao QG de Arafat, 73, no último dia 21, depois que dois atentados suicidas palestinos deixaram seis mortos em Israel, após seis semanas sem mortos israelenses -houve 71 palestinos mortos no período. Arafat condenou os atentados contra Israel, mas o governo Sharon o acusa de inação.
Na mesma reunião em que Israel decidiu promover a operação "Questão de Tempo" -com o objetivo de forçar Arafat ao exílio-, determinou-se o fechamento do escritório do professor Sari Nusseibeh em Jerusalém, líder palestino moderado.
A nova crise impediu que Abbas se tornasse o premiê palestino. Agora, uma nomeação poderia ser interpretada como traição.
Para o analista israelense Roni Shaked, "o cerco que põe Arafat como alvo central está desviando a atenção dos verdadeiros promotores do terror: Hamas e Jihad Islâmico [grupos extremistas]". De qualquer forma, a expectativa é que, se houver um novo atentado, Sharon aproveitará a oportunidade para expulsar Arafat, cuja situação, na opinião do cientista político palestino Ali Jerbawi, é igual à do QG em Ramallah: "Com um pouco de força, ele cai".
Dois anos de ações militares israelenses e de atentados palestinos levaram a uma situação que desestabiliza ambas as economias, ameaça a estrutura da ANP, a sociedade palestina e o futuro político de Israel.
A esperança de paz está cada dia mais distante. Para o sociólogo egípcio Muhammad Mussad, que critica os assentamentos judaicos, "os tanques israelenses estrangulam o pacifismo árabe, e os kamikazes palestinos fazem o mesmo com o pacifismo israelense".


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