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Brasil e EUA elevam o tom em debate na OEA
Washington chama volta de Zelaya de "irresponsável e tola"; Brasília diz que organização caminha para irrelevância
Devido à falta de consenso, entidade aprova texto sem assinatura dos dois países; EUA recuam ainda de apoio a moção antigolpe na ONU
SÉRGIO DÁVILA
DE WASHINGTON
Num dos momentos mais
tensos nas relações entre Brasil
e EUA desde que Barack Obama assumiu o poder, em janeiro, os representantes dos dois
países na OEA (Organização
dos Estados Americanos) elevaram o tom durante reunião
extraordinária convocada para
discutir a crise em Honduras,
ontem, em Washington.
Os diplomatas do Conselho
Permanente da OEA, o qual integram os dois países, discutiam termos da declaração que
seria divulgada no início da noite. No lugar, por falta de consenso, saiu texto assinado só
pelo presidente do Conselho,
Pedro Oyarce, e pelo secretário-geral, José Miguel Insulza.
Nele, os dois exigem respeito
à inviolabilidade da Embaixada
do Brasil em Honduras e às
imunidades e privilégios de
seus funcionários e ameaçam
com ação conjunta da comunidade internacional em caso
contrário. Além disso, deploram a expulsão no domingo de
grupo de diplomatas enviados
pela OEA àquele país.
Antes, durante a reunião, o
representante interino americano iniciou sua intervenção
chamando de "deplorável e tola" a decisão do regime golpista
de expulsar os diplomatas. "Essas ações constituem um insulto à comunidade internacional
e a essa organização", disse W.
Lewis Amselem. Então, ele se
dirigiu ao presidente deposto,
Manuel Zelaya, e aos que o ajudaram a voltar a Honduras.
"O retorno do presidente Zelaya a Honduras antes de um
acordo foi irresponsável e tolo",
disse. "Os que facilitaram sua
volta nas atuais condições têm
responsabilidade especial de
prevenir a violência e zelar pelo
bem-estar do povo hondurenho", continuou, sem citar nomes -há suspeita nos meios diplomáticos de que o Brasil sabia de antemão dos planos do
deposto, o que o governo nega.
Mais adiante, repetiu a crítica. "Em várias ocasiões, pedimos ao presidente Zelaya que
não voltasse a Honduras antes
de que um acordo político fosse
atingido", disse Amselem. "Estávamos preocupados precisamente com os distúrbios que
estão acontecendo agora. Tendo escolhido, com ajuda externa, retornar em seus próprios
termos, ele e aqueles que facilitaram seu retorno são particularmente responsáveis pelas
ações de seus seguidores."
Na sua vez de falar, Ruy Casaes, o representante brasileiro, disse: "As autoridades e os
representantes do regime "de
facto" atribuíram responsabilidade ao Brasil pelo regresso do
presidente Zelaya a Honduras.
Isso é uma mentira deslavada.
O presidente apresentou-se à
Embaixada do Brasil pedindo
para ali ser acolhido".
Na sequência, Casaes usou
palavras duras contra a OEA e
os que apresentavam entrave a
declaração mais forte sobre o
ocorrido. Referia-se sem citar
ao representante americano,
que liderava a movimentação
por texto mais ameno, que não
mencionasse, por exemplo, que
a OEA condenaria o resultado
das eleições presidenciais de
novembro caso ocorressem
sem a restituição de Zelaya.
"Sou forçado a confessar que
cada vez mais me vejo defrontado com um fato inequívoco: a
OEA está caminhando para um
absoluto estado de irrelevância", disse Casaes. Reclamou
então sobre o pouco efeito prático das ações tomadas até agora pela entidade. "Sem algo
concreto, que envie uma mensagem inequívoca, seja ao regime de facto, seja aos candidatos
à Presidência, não valem absolutamente nada e apenas desacreditam essa organização."
O porta-voz do Departamento de Estado dos EUA, PJ Crowley, foi mais contido. Disse
que o regime golpista "estava
cavando a própria cova". Indagado se concordava com a crítica do colega da OEA sobre a
volta de Zelaya, respondeu:
"Ele está lá. E, na medida em
que ele está lá e há uma oportunidade para o diálogo, nós esperamos que ambos os lados
aproveitem a oportunidade".
A Chancelaria americana
condenou ainda a decretação
de estado de exceção pelo governo Micheletti. "Exortamos
o governo de facto a revogá-lo
imediatamente", diz em nota.
Já em Genebra, os EUA recuaram do apoio tácito que haviam dado à resolução proposta
pelo Brasil que condena Honduras no Conselho de Direitos
Humanos da ONU. O texto deve ser lido em plenário nesta
semana, quando o Brasil espera
aprovação por consenso. Mas
representantes da Chancelaria
disseram à Folha que esperarão para "ver a versão final".
Diplomatas brasileiros estranharam a posição, já que os
EUA não apresentaram objeções, e a maioria de suas sugestões foi incorporada ao texto.
Colaborou LUCIANA COELHO , de Genebra
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