São Paulo, quarta-feira, 29 de novembro de 2006

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análise

Para estudiosos, situação não deixa dúvidas

EDWARD WONG
DO "NEW YORK TIMES", EM BAGDÁ

O Iraque está em guerra civil? Embora o governo Bush insista que não, cada vez mais estudiosos, analistas e políticos americanos e iraquianos acham que sim. A definição acadêmica comum de guerra civil tem dois critérios principais: 1) os grupos rivais precisam ser do mesmo país e lutar pelo controle de seu centro político, por um Estado independente ou por uma mudança drástica na estrutura política; 2) o saldo de mortos tem de chegar a mil, com pelo menos cem de cada lado.
Segundo professores americanos especializados em guerras civis, a maioria deles concorda que o conflito no Iraque cumpre esses critérios. "A essa altura, e já há algum tempo, a violência no Iraque atende à definição de guerra civil adotada por qualquer observador sensato", disse James Fearon, da Universidade Stanford.
Embora o termo seja amplo o bastante para incluir vários tipos de conflitos, um dos lados em uma guerra civil é quase sempre um governo soberano. Assim, para alguns estudiosos a guerra civil começou quando os EUA devolveram a soberania ao governo iraquiano, no meio de 2004. Outros dizem que ela começou em fevereiro último, com a reação a um atentado contra um importante templo xiita em Samarra.
Os estudiosos dizem ainda que a guerra do Iraque tem elementos tanto de insurgência quanto de conflito sectário. Se os expurgos sectários e ondas de assassinatos se tornaram marca distintiva dos combates, os ciclos de violência são deflagrados por líderes de milícias cujos objetivos são políticos.
Mas muitos políticos nos EUA temem que, se a Casa Branca reconhecer a guerra civil, isso seja tomado como admissão de fracasso. E se preocupam com a possibilidade de a população achar que suas tropas não devessem participar de uma guerra civil iraquiana, aumentando a pressão pela retirada.
O fato é que muitos estudiosos já estimam que o nível de violência coloca o Iraque no topo das guerras civis dos últimos 50 anos. Fearon e David Laitin, também de Stanford, dizem que o número de mortos no país -ao menos 50 mil desde 2003, segundo estimativas- coloca o conflito em posição comparável aos de Burundi e Bósnia. Para Nicholas Sambanis, analista político da Universidade Yale,"o nível de violência supera em muito o da maioria das guerras civis posteriores a 1945".
Comandantes americanos já reconhecem que o domínio político do país é o cerne do conflito. Em depoimento ao Congresso neste mês, o general Michael Maples, da Agência de Informações de Defesa, definiu a situação como "um conflito violento e constante pelo poder" e disse que o país se aproximava de "um colapso significativo de sua autoridade central".
Para os estudiosos, é importante que as autoridades e a mídia reconheçam o conflito iraquiano como guerra civil. "Há uma comunidade científica que estuda guerras civis, que compreende sua dinâmica e a maneira pela qual terminam", disse Laitin. "Essa pesquisa é valiosa para segurança de nosso país."


Tradução de PAULO MIGLIACCI


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