São Paulo, segunda-feira, 30 de março de 2009

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Ditador procurado constrange cúpulas

Líder sudanês Omar al Bashir, cuja prisão foi pedida por tribunal internacional, chega a Doha para encontros com árabes e sul-americanos

Presença preocupa Brasil e vizinhos da América do Sul, signatários do TPI; viagem é a quarta do ditador depois da emissão do mandado


MARCELO NINIO
ENVIADO ESPECIAL A DOHA

Quebrando um suspense que durou até o último momento, o ditador do Sudão, Omar al Bashir, desembarcou ontem em Doha para o encontro anual da Liga Árabe, onde foi recebido com tapete vermelho e todas as honras diplomáticas.
A presença de Bashir, em novo desafio à ordem de prisão emitida pelo Tribunal Penal Internacional (TPI), promete constranger os líderes sul-americanos que participarão de uma cúpula com países árabes amanhã na capital do Qatar. A chegada do presidente Lula está confirmada para hoje.
Acusado de crimes de guerra e contra a humanidade no conflito em Darfur, o líder sudanês busca apoio internacional. Desde a emissão do mandado, no último dia 4, Bashir viajou à Eritreia, ao Egito e à Líbia.
Sua chegada só foi possível após os participantes garantirem que não cumpririam a ordem de prisão, embora três - Jordânia, Comoros e Djibuti- sejam signatários do TPI.
Amanhã, na conclusão de seu encontro anual, a Liga Árabe emitirá um comunicado de apoio a Bashir, o que deve estender a pressão à reunião com os líderes sul-americanos, que começa logo em seguida.
Praticamente pronta desde fevereiro, a declaração final da segunda Cúpula América do Sul-Países Árabes tem uma menção vaga a Darfur. Num parágrafo breve, o texto defende uma solução diplomática e pacífica para o conflito étnico que já deixou cerca de 300 mil mortos e desabrigou 2 milhões, segundo estimativas da ONU.
Mas diplomatas sul-americanos que trabalhavam ontem nos últimos detalhes do texto admitiram que a chegada de Bashir criará "um momento" para que o trecho seja modificado, a fim de dar um tom de apoio ao ditador sudanês.
Um dos negociadores sul-americanos admitiu que será necessário um "malabarismo diplomático" para contornar o constrangimento, já que todos os países da América do Sul, com exceção do Chile, são signatários do Tratado de Roma, que instituiu o TPI.
Assim que soube da chegada de Bashir, o embaixador do Brasil no Qatar, Anuar Nahes, telefonou para o chanceler Celso Amorim, prestes a embarcar para Doha, para informá-lo sobre a nova dinâmica que o encontro provavelmente terá.
A esperança de diplomatas de que o constrangimento pudesse ser evitado foi frustrada quando Bashir surgiu na porta do avião presidencial sudanês.
Transmitida ao vivo em vários telões no hotel de Doha que será sede das duas cúpulas, a imagem do desembarque causou alvoroço entre jornalistas e diplomatas e logo virou o principal assunto de discussão.
O próprio emir do Qatar, Hamad bin Khalifa al Thani, recebeu Bashir na pista do aeroporto, ao lado do secretário-geral da Liga Árabe, Amr Moussa.
O Brasil não se pronunciou sobre o mandado de prisão contra Bashir, levando organizações humanitárias a criticar o país por se omitir sobre um caso grave de violação de direitos humanos. A crítica já havia sido feita depois que o país evitou apoiar resoluções condenando o Sudão no Conselho de Direitos Humanos da ONU.
Questionado ontem sobre o tema, o embaixador Anuar Nahes repetiu a posição do Itamaraty, de que um posicionamento político não é necessário. "O Brasil é signatário do TPI e respeita suas decisões", disse ele.


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