São Paulo, domingo, 30 de abril de 2006

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HISTÓRIA

Documentos secretos recém-revelados mostram as articulações de Washington para lidar com o projeto nuclear de Israel

Nixon soube de bomba israelense, mas evitou retaliar

DA REDAÇÃO

Documentos secretos do governo americano, revelados apenas anteontem, informam que em 1969 o então presidente Richard Nixon hesitou em reagir com represálias à informação de seus serviços de inteligência de que Israel já possuía a bomba atômica.
Sem ter sido previamente informada sobre o projeto israelense, a Casa Branca encaminhou a questão ao assessor de Segurança Nacional, Henry Kissinger. Ele e um grupo de conselheiros chegaram a propor, para explicitar seu mau humor, que o governo americano suspendesse a entrega de caças-bombardeiros F4 Phantom que Israel havia comprado.
Mas logo em seguida a primeira-ministra Golda Meir faria sua primeira viagem aos Estados Unidos. Não se sabe com precisão o que ela negociou com Nixon. O fato é que os aviões militares foram entregues, e Washington passou a conviver com a bomba israelense "não declarada", para usar um eufemismo da época.
O episódio está em documentos obtidos pelo National Security Archive (Arquivo de Segurança Nacional), uma entidade que funciona na Universidade George Washington e que consegue documentos com base na Freedom of Information Act (a lei americana sobre liberdade de expressão).
A forma pela qual os EUA tomaram conhecimento da bomba atômica israelense -aquele país até hoje nega possuí-la- é objeto de reportagem que o "Washington Post" está publicando hoje.
Os 30 documentos agora desclassificados também serviram para que o "Boletim dos Cientistas Atômicos", uma entidade pacifista americana, publicasse em sua revista do próximo bimestre "Israel Crosses the Threshold" (Israel atravessa o limite).
O episódio é em muitos sentidos saboroso. Ameaçado por vizinhos hostis, Israel decidiu em 1958 se dotar da bomba atômica. Construiu o centro de pesquisa nuclear de Dimona. Dois anos depois a CIA desconfiava quais seriam os objetivos da instalação. A tecnologia necessária para a bomba estava pronta em 1966. No ano seguinte foi produzida -mas não testada- a primeira ogiva.
Washington pressionou Israel a assinar o TNP (Tratado de Não-Proliferação), o que colocaria seus laboratórios sob inspeção internacional. E usou os caças F-4 como moeda. O então embaixador israelense em Washington, Yitzhak Rabin, que viria a ser primeiro-ministro, participou da operação destinada a neutralizar, por meio do Pentágono e do Departamento de Estado, as múltiplas objeções americanas.
Henry Kissinger foi encarregado de redigir um documento, conhecido como NSSM-40, em que abria um leque de opções para lidar com a bomba israelense.
Os secretários de Estado e da Defesa interpelaram oficialmente Rabin. Encaminharam-lhe três questões específicas, sobretudo quanto à necessidade de assinar o TNP. Mas Rabin, em lugar de dar respostas, agendou o programa nuclear israelense no encontro que Nixon teria com a primeira-ministra Golda Meir, em 26 de setembro de 1969.
A Casa Branca decidiu, então, "aliviar" as pressões contra Israel. Com a promessa, Rabin escreveu à burocracia diplomática e militar que seu país não planejava se tornar uma potência nuclear. Quanto ao TNP, as coisas só poderiam ser decididas depois das eleições israelenses. Também tranqüilizou os americanos quanto ao uso de mísseis. Eles não integrariam o arsenal de Israel, disse, até 1972.
Em fevereiro de 1970 Rabin disse a Kissinger que Nixon já havia sido informado por Golda de que Israel não assinaria o TNP. Diante disso, o governo americano cancelou a nova visita de inspeção que faria às instalações de Dimona. O segredo foi bem guardado. Tanto que, em 1975, o Departamento de Estado se recusou a informar o Congresso de que Israel já tinha a bomba atômica.
Alguns detalhes do episódio ainda são considerados pelo governo americano como segredos de segurança nacional. Tanto que o NSSM-40 não teve seu conteúdo integralmente revelado.


Veja o site http://www.nsarchive.org


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